Tomo emprestado o título de um livro de Carlos Nelson Coutinho, "A democracia como valor universal e outros ensaios" (Salamandra, 1984) para apontar um caminho de resposta para a questão em torno da constitucionalidade da prisão do deputado federal Daniel Silveira, considerando os muitos aspectos que fazem parte do desenho complexo em torno do fato.
Nos limites desta breve análise quero apontar alguns aspectos que me informam para apontar como correta a prisão, em flagrante, determinada pelo STF, agora, à unanimidade do seu plenário.
Desde logo, como constitucionalista, devo iniciar dizendo que um tema recorrente na literatura atual tem apontada a crise da democracia – se não a morte – em larga escala por conta da entrada em cena, exatamente, de um sem número de atores políticos cuja atuação vai de encontro às pré-condições deste regime político. As democracias constitucionais estariam à mercê de sua própria estrutura de garantias, entre outros fatores. Não teria, muitas vezes, como se proteger de si mesma.
Estes neopopulistas atacam-na a toda hora e escudando-se nela mesma. Querem sobreviver, transformando-a em letra morta.
Por isso, desde logo, a responsabilidade das instituições de garantia está em assegurar a sua sobrevivência para, apenas assim, poder-se continuar tendo protegidos os demais pressupostos da mesma democracia constitucional. Fora da democracia, não há que se falar em garantias e demais elementos peculiares ao Estado de Direito, sua precedência para a própria sobrevivência e dos elementos que, mesmo nunca completamente realizados, constituem a história do constitucionalismo liberal desde o século XVIII, quando se inaugura.
A decisão do STF pode ser lida como medida urgente (cautelar) para fazer cessar os ataques às instituições democráticas e aos seus membros, já que a pessoa arrestada usava a internet para difundir seu desprezo à Constituição que, como deputado, deve respeitar, até para salvaguardar a imunidade parlamentar que lhe é atribuída pela própria Constituição que ataca.
E, aqui, mais um elemento se apresenta. Tratando-se de uma ação, já reiterada, desenvolvida no âmbito das novas mídias sociais, é preciso considerar que não se pode enfrentá-la com respostas concebidas para antes da “era digital”. As novas mídias sociais, da Revolução da Internet, não serão entendidas se tentarmos submetê-las ao regime da “era analógica”. Como dizia S. Rodotà, problemas jurídicos novos devem ter respostas novas.
Isso, por óbvio, não significa arredar qualquer limite protetivo à cidadania e ingressarmos em uma nova era de ativismo e protagonismo judiciais incompatível com o papel dos Sistemas de Justiça, em especial por suas Cortes Constitucionais, nos Estados de Direito.
O autor é procurador do Estado do Estado do Rio Grande do Sul, pós-doutor e professor do Programa de Pós-Graduação da FDV
* Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta
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