A pandemia ocasionada pelo vírus SARS-CoV-2 no final de 2019 reforçou a importância do debate sobre a qualidade do ar dentro das nossas edificações, trazendo à tona uma antiga preocupação: a Síndrome do Edifício Doente (SED).
A Síndrome do Edifício Doente, do inglês Sick Building Syndrome, consiste na ocorrência de sintomas não específicos, que são comuns à população em geral, mas que numa situação temporal podem ser relacionados a um edifício em particular. As principais ocorrências são: irritação dos olhos, nariz e garganta; pele seca, dor de cabeça, cansaço, falta de concentração, náuseas, entre outros.
Diz-se que um edifício está “doente” quando uma parcela, em torno de 20% dos seus ocupantes, apresenta sintomas transitórios associados ao tempo de permanência em seu interior, que tendem a sumir após curtos períodos de afastamento. Em alguns casos, a simples saída do local já é suficiente para que essas manifestações desapareçam. As reclamações podem estar localizadas em uma determinada área, ou podem estar disseminadas por todo o edifício.
Com a crise do petróleo, na década de 70 do século passado, houve a necessidade do racionamento de energia, e para manter a eficiência na climatização interna, a solução foi a chamada construção “hermeticamente” fechada. Nesse processo, ocorre a diminuição da taxa de ventilação, gerando uma maior concentração de poluentes provenientes de fontes internas.
Em 1982, a Organização Mundial da Saúde reconhece a SED após um surto de infecção respiratória pela bactéria Legionella pneumophila, presente na poeira do ar-condicionado central em um hotel na Filadélfia. No Brasil, o ex-ministro da Comunicação Sergio Motta morreu de insuficiência respiratória pela mesma bactéria, em 1998, o que levou o Ministério da Saúde a regulamentar os ambientes climatizados no país.
A Portaria 3.523/98 foi o primeiro conjunto de regras no Brasil, voltado para garantir a qualidade do ar em ambientes climatizados, seguido da Resolução n° 9 da ANVISA e a norma técnica NBR 16401 da ABNT, que definem o que é um ar de boa qualidade. Além disso, a própria OMS trata do tema e traça recomendações adaptadas a diferentes tipologias de edifícios.
Entretanto, nas últimas décadas, houve um grande aumento na diversidade dos materiais construtivos de acabamento e mobiliário, com substâncias passíveis de serem dispersas no ar. Alguns tipos de roupas, carpetes, móveis, revestimentos de parede e pisos, colas, tintas e outros não somente podem liberar fibras e compostos químicos, como também podem fornecer um ambiente propício à proliferação de agentes microbiológicos.
E nós, o que respiramos? Todas essas substâncias. Gases poluentes, poeira, fungos, bactérias, vírus e outros contaminantes, quando associados a um ambiente sem renovação do ar adequado, podem impactar o nosso bem-estar e a nossa saúde.
Sendo assim, o ar dentro das edificações é contaminado por uma variedade de substâncias que podem chegar a níveis de concentração cinco vezes maiores do que ao ar livre. Mesmo em países tropicais, onde poderíamos desenvolver a maior parte das atividades em áreas abertas, as exposições humanas em interiores variam de 8 horas diárias em edifícios comerciais e institucionais para 16 a 24 horas diárias em residências.
O diagnóstico da SED pode ser ainda bastante controverso, devido à ausência de biomarcadores objetivos relacionando os sintomas observados com a população exposta à poluição do ambiente. O que se sabe é que importantes fatores construtivos, tais como a escolha de materiais com zero ou baixa emissão de poluentes, a localização eficiente das aberturas das edificações e os sistemas de ventilação utilizados, exercem influência direta sobre a qualidade do ar interno.
Recentemente, protocolos de combate ao Covid-19 representados pelo distanciamento social, a assepsia das mãos e o uso de máscaras faciais foram incentivados juntamente com a ventilação natural dos espaços, sendo essa última uma das principais estratégias de disseminação do vírus através da renovação do ar.
Em tempos incertos, enquanto ainda não temos regulamentações suficientes para o assunto, seja em situações pandêmicas ou não pandêmicas, o que se tem é que lições aprendidas com o passado não devem ser esquecidas e se preocupar com a saúde das nossas edificações é prezar pela nossa saúde também. Quer uma dica? Sempre que puder, abra as janelas!
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