Foi aprovada pelo Senado Federal o PL 914/24, um projeto de lei que trata da adoção de incentivos fiscais para produção de veículos menos poluentes. No Brasil já estamos acostumados (indevidamente) a colocar um "mas, porém, e todavia" quando se trata de Brasília.
A controvérsia da vez foi utilizar o projeto para incluir a "taxa das blusinhas" (nome terrível e machista), que cria um imposto de importação de 20% para compras no exterior abaixo de U$ 50 (esse é o jabuti). Quando deveríamos estar falando sobre o potencial de redução da pegada de carbono do setor automotivo brasileiro, do potencial da economia verde e dos caminhos a seguir para buscar colocar o Brasil na vanguarda da sustentabilidade ambiental aliada ao desenvolvimento econômico, estamos novamente discutindo uma medida que onera a população brasileira para gerar receita para o governo e proteger determinado setor econômico.
Mas qual o impacto da medida para o bolso do trabalhador? Primeiro precisamos pensar como vai funcionar a taxação. Pensemos uma compra de U$ 50 com frete grátis. Em reais fica R$ 262,30 (utilizando a taxa de câmbio de R$ 5,246 no momento que escrevi o texto). Sobre esse valor, incide 20% de imposto sobre importação, totalizando R$ 314,76. Sobre esse novo valor incide 17% de ICMS, mas não vai ser R$ 368,27. O ICMS tem a característica de estar contido em sua própria base, então deve-se “incluir o ICMS” antes de calcular o ICMS. Bizarro, concordo.
Desse modo, o valor vai ser R$ 443,70. Sem a nova taxa o valor da importação fica em R$ 369,75. É um aumento de R$ 73,95. Se o cidadão precisar pagar frete sobre a sua compra, precisa incluir o valor do frete nos U$ 50,00 iniciais porque impostos sobre importações incidem sobre o chamado valor alfandegário (preço do produto + frete). Se as compras estiverem entre U$ 50,01 até U$ 3.000,00, a taxa é de 60%.
É compreensível a busca do ministro Haddad para conseguir cumprir a meta de déficit zero do arcabouço fiscal. Vai ser o primeiro ano da nova regra e tudo indica que ela vai ser descumprida, o que é um grande problema para a credibilidade já frágil da política econômica do governo federal.
Também existe o lado do produtor brasileiro que tem dificuldade em competir com os produtos internacionais. A questão é avaliar se o caminho que estamos seguindo é o melhor. O governo tem muito mais discricionariedade sobre a despesa e não vemos nenhum movimento para corte de gastos (e não estou falando de gastos sociais ou investimentos).
Também é muito mais valoroso para o país se a indústria brasileira conseguir competir com o resto do mundo por ganhos de eficiência e produtividade, mas não vemos muitos movimentos do governo federal buscando soluções para dar sustentabilidade para indústria local, além de protecionismo, subsídios e políticas cambiais.
Veja bem, esse ponto não é exclusividade desse governo. É algo entranhado na nossa sociedade e repetido governo após governo. No final, os cidadãos pagam a conta das benesses setoriais e políticas, comprando produtos mais caros, brasileiros ou estrangeiros.
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