Nos últimos dias temos presenciado um forte debate em torno do dilema econômico entre ampliar despesas com programas sociais, notadamente transferências de renda, ou preservar a chamada regra do “teto de gastos”, tida como vital pelo mercado financeiro para reversão do quadro de desequilíbrio fiscal brasileiro.
O Brasil está há 40 anos em um processo de semi-estagnação econômica, tendo experimentado, nesse período, um breve intervalo de crescimento contínuo, observado entre 2004 e 2011, quando o país cresceu a uma taxa média de 4,45% ao ano. Na última década, contudo, houve uma reversão nesse comportamento, e a taxa média de crescimento do PIB foi reduzida para 0,30% ao ano.
O país entrou em recessão a partir do último trimestre de 2014, tendo uma retração acumulada de quase 7% do seu PIB, entre 2015 e 2016. Coincidência ou não, foi justamente nessa quadra da história que houve uma “virada fiscal”, com a experiência malsucedida de ajuste nas contas públicas promovida por Joaquim Levy e, depois, em dezembro de 2016, com a instituição do Novo Regime Fiscal, conhecido como teto de gastos, que limitou a despesa pública primária dos três Poderes da União por um período de 20 anos.
À época em que se discutia a criação do teto de gastos, defendi que havia um erro de diagnóstico com relação à raiz do problema fiscal brasileiro. Naquela ocasião, escrevi um artigo de opinião demonstrando que o problema fiscal deveria ser analisado pela ótica da receita e não da despesa.
Isso porque uma mudança na política fiscal entre os anos de 2010 e 2011, quando houve uma substituição significativa dos investimentos públicos, gastos com maior efeito multiplicador da renda, por desonerações fiscais, de menor efeito multiplicador, segundo estudo elaborado pelo IPEA, impactou na queda da arrecadação e, por consequência, contribuiu para uma piora na trajetória da dívida púbica.
O teto de gastos, ademais, possui um desenho institucional inadequado, conquanto despreza variáveis que são indispensáveis para se avaliar o comportamento das despesas públicas no tempo, como o crescimento populacional e da renda, limitando-se a aplicar, como fator de reajuste das despesas públicas, a inflação apurada no período anterior. Somado a isso, dificulta a promoção de ações contracíclicas pelo Estado, o que é fundamental para mitigação das flutuações nos ciclos econômicos.
As políticas fiscais contracionistas, que vêm sendo adotadas desde 2015, revelam, segundo os economistas José Luis Oreiro e Luiz Fernando de Paula, um “overkill” (exagero) na política econômica responsável pela produção de um crescimento médio negativo de 1,06% ao ano do PIB, desde então. Esse resultado, por si só, já é um indicador de que o ajuste fiscal deve ser implementado com o gradualismo que a realidade social do país exige e não orientado por um fiscalismo radical que faz da busca pelo equilíbrio das contas públicas um fim em si mesmo, como parece impor a regra do teto de gastos.
Este vídeo pode te interessar
Controvérsias à parte, certo é que o país está diante de uma encruzilhada, sendo incontornável a escolha sobre o caminho que deve trilhar com vistas a uma tentativa de retomada do desenvolvimento há muito tempo perdido.
Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.