Filhos são nossos projetos de futuro. Aqueles em quem depositamos sonhos de um mundo que queremos acreditar possível. Quando os temos, nossas preocupações e prioridades são redirecionadas. Passamos a olhar para cada criança como o filho de alguém, que pode precisar de cuidados também.
Todavia, para além de mães e pais embevecidos de amor, enquanto sociedade pactuamos compromissos de cuidado a todas as crianças e adolescentes. Todas, não apenas as nossas crianças. A Constituição Federal estabeleceu em seu art. 227 como princípios para a infância a absoluta prioridade e a proteção integral.
Notem, não se trata de prioridade e proteção dada pela família, apenas. Mas do compromisso coletivo para o estabelecimento de limites à exploração, violação, crueldade e opressão.
Na realização desses princípios veda-se o trabalho infantil (art. 7º, XXXIII c/c art. 227, §3º da CF), a fim de que se preserve e promova-se o direito a educação, saúde e convivência familiar. Nossa Constituição projeta bons tempos, nos quais crianças possam desfrutar a infância preparando-se para futuros sonhados, como somente podemos sonhar na infância.
As pesquisas do IBGE revelam que quanto menores os níveis de instrução e de renda dos pais, maiores as taxas de ocupação das crianças, crescendo, também, a evasão escolar, situação que reproduz o ciclo da miséria e da pobreza.
Descabem projetos destrutivos de programas e políticas públicas de proteção social por opiniões pessoais em dissonância com a Carta Política de nosso país, que deve ser a baliza e a medida do bom governar.
Experiências particulares de trabalho que se afirmam não lesivas não justificam a permissividade com a presença de crianças no âmbito laboral, ocasionando mutilações, exposição a trabalhos superiores a suas forças, exposição a riscos e danos psicológicos.
Após anos de luta para retirar crianças do ambiente fabril e colocá-las devidamente na escola, somos levados a acreditar, ainda uma vez, que só há uma escolha trágica a fazer: trabalho ou criminalidade.
Entretanto, o espaço da política não deve ser o lugar do medo e da ausência de projetos, jogando no mercado, já sobrecarregado pelo desemprego, milhares de pequenas mãos sub-remuneradas.
Afinal, trabalhar na infância é antecipar um modo de vida para o qual a criança ainda não está preparada. É cobrir-lhe de realidade e dureza, quando sua constituição como sujeito se faz na imaginação e na fantasia.
Se tantas vezes a pobreza impõe o labor, não é sem custo que o faz. Criança que trabalha paga muito mais do que ganha e, nesta conta, perdemos todos.
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A autora é mestre em Direito pela PUC-MG, doutoranda em Direito da FDV, advogada.
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