Seis anos se passaram desde o rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG), que causou o pior desastre ambiental da história brasileira. Foram toneladas de rejeitos de mineração despejadas no Rio Doce, atravessando toda sua extensão até atingir a foz na vila de Regência, em Linhares (ES).
Desde então, milhares de processos judiciais tiveram início, envolvendo dois dos maiores grupos de mineração do mundo - a Vale S.A. e a BHP Brasil – que controlam o capital acionário da Samarco S.A., proprietária da barragem rompida. Nenhum deles, no entanto, conseguiu que os responsáveis sofressem as devidas consequências nos âmbitos civil e criminal.
O tempo excessivo concedido pela justiça permitiu que as mineradoras evitassem utilizar todos os recursos disponíveis para reparação dos prejuízos. Em lugar disso, o que observamos é um descaso social gigantesco, resultado da complexidade da disputa e da sobreposição de interesses, levando à fuga em massa de populações tradicionais em direção às cidades, ao aumento de violência doméstica, da criminalidade e miséria dos ribeirinhos.
Os vários acordos manejados pelas instituições de justiça foram incapazes de envolver plenamente as comunidades afetadas e se mostraram inflexíveis para articular a complexa gama de interesses e prejuízos em modos adequados de reparação.
Um exemplo disso é o sistema indenizatório simplificado que foi desenvolvido pela 12ª Vara Federal de Belo Horizonte com o intuito de facilitar o pagamento de indenizações pela Fundação Renova. Por meio de uma plataforma on-line, alimentada por escritórios de advocacia, em uma complexa disputa de “clientes”, com ampla e irrestrita quitação de direitos, provocando o efeito oposto ao pretendido, deixando a população ribeirinha desnorteada, sem ciência inequívoca da disponibilidade dos direitos que abrem mão em troca de parcos recursos.
Além disso, ainda hoje se discute quem seriam os atingidos e quais os meios adequados para atingir reparação justa. Em relação aos danos ambientais, a situação é ainda mais devastadora, pois não há uma definição sobre como revitalizar o Rio Doce, ou quando isso começaria. São muitas discussões e poucas conclusões, o que mina a confiança na capacidade das instituições de justiça solucionarem o caso.
Por isso, em novembro de 2018, o conflito foi elevado a uma disputa internacional perante o Poder Judiciário da Inglaterra e do País de Gales. O impacto e a repercussão internacional, assim como a expectativa de que o julgamento por meio do processo civil inglês promova justiça integral, têm sido alvo de debate em jornais do mundo e sites jurídicos especializados.
Os atos ocorridos na justiça inglesa parecem impactar também as decisões mais recentes no Brasil. O próprio sistema simplificado acrescentou como critério para acesso à plataforma de indenização que o demandante tenha ingressado na ação inglesa como autor até 30 de abril de 2020, e ainda prevê cláusula de quitação e renúncia da ação estrangeira como condição para homologação do acordo.
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Fica evidente a necessidade de seguir na busca de soluções, visto que o Caso de Mariana na Inglaterra e no País de Gales leva àquelas cortes mais de 201 mil atingidos, que buscam demonstrar que a reparação brasileira não tem sido suficiente. A esperança agora é que os conflitos de interesse possam dar lugar à reparação adequada dos prejuízos, para que cada uma das pessoas afetadas pela tragédia conquiste por meio da justiça as condições de seguir em frente e avistar um horizonte melhor de vida.
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