No artigo anterior, alertamos que a discussão sobre política industrial dava muito pano para manga. Coincidentemente, no mesmo dia o governo federal apresentou aos brasileiros o texto da Nova Indústria Brasil (NIB). Um desenvolvimento conjunto entre o governo e o setor produtivo de uma nova política industrial.
Na sequência, além de uma momentânea turbulência no mercado financeiro, tivemos uma profusão de matérias, artigos e entrevistas com especialistas, executivos de grandes empresas e gestores públicos, levantando os prós e contras da iniciativa.
As linhas gerais da NIB já foram bem detalhadas na imprensa. Ela é definida como uma política de neoindustrialização, a ser implementada pelo governo federal nos próximos dez anos, até 2033. Em síntese, ela parte da identificação de grandes problemas nacionais e estabelece missões para enfrentá-los.
São ao todo seis missões, envolvendo questões como: 1) Agroindústria e segurança alimentar; 2) Descarbonização e transição energética; 3) Complexo industrial da saúde; 4) Transformação digital da indústria; 5) Saneamento, moradia e mobilidade; 6) Tecnologias de interesse para a soberania e defesa nacionais.
Além dos princípios e missões, a NIB apresenta um conjunto de instrumentos de política, entre os quais, o Plano Mais Produção, com previsão de R$ 300 bilhões até 2026. A maioria de linhas de crédito operadas através de fundos do BNDES e da FINEP.
A NIB se insere num duplo movimento. No âmbito nacional, incorpora a visão de que o Brasil enfrentou um processo de desindustrialização precoce e acelerado. E de que a indústria é chave para o desenvolvimento sustentável do país. Somado a isso, temos a visão de que a concentração das exportações em produtos de baixa complexidade tecnológica é um problema em si.
E se insere também num movimento mundial de resgate e ressurgimento de políticas indústrias. Muito recentemente, o FMI divulgou um trabalho intitulado “O Retorno da Política Industrial em Dados”, no qual são apresentados os resultados de um amplo levantamento sobre o que os autores denominam “Novas Políticas Industriais” (NIPs).
Segundo o texto, esse ressurgimento das políticas industriais é consequência de múltiplas crises agravadas, tais como o crescimento lento pós-crise financeira de 2008, a pandemia da Covid-19 e de tensões e conflitos geopolíticos. Ou seja, a proposta brasileira acompanha uma tendência global. E o mais interessante, coincide na escolha das missões com as principais políticas mundo afora.
A questão, portanto, não é se devemos ter uma política industrial ou não. Mas da qualidade de tal política, do controle que a sociedade tem sobre a aplicação dos subsídios oferecidos e sobre os resultados alcançados.
Em artigo recente, Marcos Mendes (pesquisador associado do Insper) finaliza afirmando que “o sucesso de políticas de apoio ao desenvolvimento tem como condições mínimas necessárias: a) governança que evite a captura por interesses privados, b) metas claras, c) avaliação de impacto, d) interrupção do que fracassar, e) exposição dos beneficiários à concorrência externa”.
Aparentemente, as dúvidas em relação a NIB advêm menos das críticas à proposta em si, e mais da desconfiança sobre a postura do governo federal. A memória da política dos “campeões nacionais”, as falas do presidente Lula sobre a retomada das obras da Refinaria Abreu Lima e tentativas de intervenção na gestão da Vale e da Eletrobrás, acenderam o farol vermelho.
O Brasil conta com um robusto e bem-sucedido programa de apoio ao desenvolvimento no setor agropecuário. É uma política que vem de longe e que resultou em enormes ganhos de produtividade e de incorporação contínua de inovações. A partir de 2003 ele se consolidou no Plano Safra, em suas diferentes linhas de atuação.
Esse caso de sucesso deveria nortear as ações e discussões do desenvolvimento e ajuste da NIB. Na verdade, o Brasil deveria se inspirar no exemplo do Agro e estabelecer um Plano Safra para a economia como um todo, uma vez que, além do setor industrial, é cada vez mais relevante estar atento ao aumento de produtividade e das inovações no setor de serviços.
Por fim, cabe ressaltar que o Plano Mais Produção e outros instrumentos descritos na NIB abrem inúmeras oportunidades para impulsionar o desenvolvimento do Espírito Santo. O Bandes, que aumentou consideravelmente sua carteira de crédito em 2023, está atento para as oportunidades. Essa é uma ótima discussão a ser travada entre o governo, o setor produtivo e a sociedade capixaba.
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