Quando a Covid-19 atingiu o Brasil em março de 2020, muita gente previu que o varejo online logo superaria o varejo físico no Brasil e se consolidaria como o principal canal de vendas dos mais variados tipos de produtos. Pessoalmente, nunca acreditei nisso.
Afinal, mesmo na China, onde o e-commerce ocupa um espaço bem maior do que no Brasil, as lojas físicas ainda são o principal canal de vendas da vasta maioria das categorias, e o maior gigante das vendas online, o Alibaba, continua expandindo sua rede de supermercados FreshHippo.
É claro que, no auge da pandemia, o varejo online teve uma alta significativa. Até por falta de alternativa.
Porém, com a normalização da situação sanitária, nós, consumidores, voltamos a ser o que sempre fomos: seres gregários, sociais, analógicos, que precisamos do contato cara a cara com outras pessoas e de tocar com as mãos a maioria das mercadorias que estamos adquirindo. E, assim, voltamos a dar preferência a consumir em lojas físicas.
Tanto é assim que cada vez mais fabricantes vêm se rendendo à constatação de que não apenas faz sentido voltar a focar nas vendas físicas, mas também vale a pena implantar lojas exclusivas (monomarca), de cimento e tijolo, para comercializar seus produtos. Basta olhar à sua volta para constatar quantas indústrias já fizeram isso: Bauducco, Havaianas, Hope Underwear, Nike, Samsung, Swift, Ambev, Dengo...
Vejamos quais os principais motivos que levam à adoção dessa estratégia:
- Busca por maior controle da experiência do consumidor
- Nas lojas monomarca, sejam próprias ou operadas por franqueados, a empresa dona da marca tem controle total sobre a experiência do consumidor, indo do ambiente físico da loja (arquitetura, layout, iluminação, visual merchandising, temperatura, aroma etc.) a atendimento, precificação, promoções, uniformização dos atendentes, scripts de vendas que estes deverão observar, argumentos de venda, formas de controlar objeções e toda uma série de outros detalhes que, sem dúvida, contribuem para estabelecer uma forte conexão emocional entre o cliente e a marca, já que a indústria pode assegurar que aquele vivenciará a marca e cada um dos seus produtos da maneira como foram concebidos.
- Branding e posicionamento
- Lojas monomarca são também ferramentas poderosas de branding. De forma geral, elas são planejadas, desenhadas, implantadas, operadas e geridas de modo a corporificar os atributos da marca de forma mais efetiva e tangível do que qualquer outro canal de vendas permite.
- Feedback de melhor qualidade
- Uma loja monomarca, mesmo nos casos em que é operada por um franqueado, permite à empresa dona da marca obter dados e informações do consumidor final, incluindo seus hábitos de consumo, seu comportamento dentro do ponto de venda, seus anseios e aspirações, a maneira como percebe e usa os produtos e mais uma série de facetas suas que acabam por gerar insights altamente valiosos, inclusive para o desenvolvimento de novos produtos ou melhorias nos atuais e também para o desenho de novas embalagens, a adoção de novas formas de vender e muito mais, sem falar na possibilidade de implementar programas de lealdade e outras estratégias de CRM capazes de fomentar um relacionamento mais profundo e duradouro da marca com os consumidores.
- Aumento das vendas em outros canais
- Minha equipe e eu já nos envolvemos na criação de mais de 20 conceitos de pontos de venda monomarca, trabalhando com empresas dos mais diversos ramos e portes e com os objetivos mais variados. Uma coisa que sabemos por experiência própria é que, seja pela melhoria na forma como a marca é percebida, seja por outro motivo qualquer, a implantação de lojas monomarca, de forma geral, leva a um aumento das vendas dos produtos da marca em outros canais, incluindo lojas multimarcas e até mesmo no varejo online. Isso sem que os pontos de venda exclusivos sejam prejudicados pelos demais canais. Ou seja: as vendas de uma marca, como um todo, crescem, quando ela adota a estratégia de criar pontos de venda monomarca.
Evidentemente, auferir todos esses benefícios depende muito de como são estruturadas e geridas essas lojas. Como ocorre com qualquer outra iniciativa empresarial, não dá para fazer as coisas de qualquer jeito e esperar que os resultados caiam no colo. Milagres até acontecem... mas não todos os dias.
A empresa que pretender implantar uma rede de lojas exclusivas precisará desenvolver - ou contratar - expertise em varejo e na gestão desse tipo de estabelecimento e também em logística para o varejo, além de uma série de outras competências que, de forma geral, não fazem parte do repertório de uma organização industrial. Portanto, é crucial que um fabricante pondere cuidadosamente os prós e contras e planeje cuidadosamente seus movimentos, antes de partir para uma empreitada dessas.
Um ponto importante: minha crença no futuro positivo para o varejo físico não significa que eu veja o varejo online como algo irrelevante. Muito ao contrário. Creio no crescente fortalecimento daquilo que os americanos chamam de “varejo phygital”, aquele no qual físico e digital se combinam e se potencializam reciprocamente.
Ou seja: as lojas físicas contarão com cada vez mais tecnologia embarcada, e o e-commerce fará cada vez mais uso desses pontos de venda como hubs de logística e ambientes de experimentação e fortalecimento da marca.
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