Com o surgimento da democracia moderna, consêquencia dos movimentos constitucionalistas dos séculos XVII e XVIII, o voto pasou a ser o instrumento que viabilizou o processo de escolha de representantes para os cargos eletivos. Nesse primeiro momento, nem todos podiam exercer o direito de sufrágio. Apenas aqueles que comprovassem certa renda ou qualificação escolar.
A maioria ficava fora desse processo, em razão das elites, que controlavam todo o processo de escolhas eleitorais. No Brasil, o voto censitário esteve em vigor em todo período monárquico, e a participação das mulheres só se deu em 1932. Mesmo assim, uma parcela ínfima da sociedade participava efetivamente, sem contar com a lástima do “voto de cabresto” nos famigerados “currais eleitorais”. Não havia um ambiente de liberdade para todos, visto que os “donos do poder” dominavam sobre as camadas populares.
Após vários períodos autoritários, a constituição brasileira de 1988 consagrou em seu Art. 14 que “a soberania popular é exercitada pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor para todos”; ou seja, o voto como essência do Estado Democrático. Assim, podemos concluir que o exercício do voto é uma expressão do direito fundamental à liberdade! Ser livre é poder decidir e fazer escolhas sem nenhum tipo de dominação. Nessa perspectiva, o cidadão deve ser considerado o senhor absoluto sobre a sua escolha por intermédio do voto.
Conforme a legislação vigente no Brasil, atualmente o eleitor é livre para votar em qualquer candidato de sua preferência, digitando o respectivo número na urna eletrônica. Do mesmo modo, o sistema permite que o eleitor anule seu voto ou simplesmente vote em branco. Votos nulos e em branco são descartados e não são somados para efeitos de quociente eleitoral. Votos nulos e brancos são formas legítimas de manifestação do eleitor, no exercício da sua liberdade. Resta então a questão do dito “voto útil”.
Para muitos, deve ser evitado pelo eleitor, pois o voto útil seria um voto influenciado por pesquisas de opinião ou por ondas que se formam na proximidade do dia das eleições. Geralmente essa modalidade de voto é mais comum em eleições polarizadas. Todavia, é uma ilusão que o voto atomístico e fiel a determinados valores seja a quintessência da democracia. A liberdade inclui estratégias e o voto útil, legitimamente, pode ser um instrumento das estratégias de cada indivíduo em escolher, entre o leque de opções, a melhor opção naquele momento histórico, em sua percepção.
Nessa equação, entre vários fatores, tais como a realidade econômica e social e as reais possibilidades de permanência ou mudanças em razão das forças políticas que estão disputando o poder, naquele momento. Em uma eleição julga-se não apenas os candidatos de acordo com seus atributos pessoais, pois toda candidatura necessariamente deve estar vinculada a um partido político que luta pelos espaços de poder com outros partidos.
Nesse sentido, julga-se, também, a conjuntura histórica. O cálculo, portanto, do eleitor, pode levar em consideração que, naquele momento do pleito, seja mais proveitosa para o país uma escolha que se apresente como mais racional, para além dos seus afetos e desafetos. Ao final, uma única andorinha não faz o verão.
Em conclusão, em um ambiente democrático, nenhuma decisão pode ser definitiva e cristalizada. Não há nenhum demérito para o cidadão-eleitor que naquele momento extraordinário, em que esteja frente a frente com a urna, decida conforme a sua consciência. Sendo o voto exercido com liberdade, sem nenhum tipo de dominação, qualquer que seja o seu voto, ele deve ser democraticamente respeitado.
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