A vacinação de jovens, obstáculo na campanha de imunização dos Estados Unidos e da Inglaterra, é mais rápida e mais eficiente no Brasil, mostram dados oficiais analisados pelo jornal Folha de S.Paulo.
No último dia 18, o país tinha vacinado com ao menos uma dose 70% da população com 18 a 24 anos.
Já é mais que a cobertura nessa faixa etária de EUA (63%) e Inglaterra (66%), dois países pioneiros na vacinação. Enquanto o Brasil lidava com falta de doses para idosos, grupo de risco para a Covid, ambos já iniciavam a administração dos imunizantes em pessoas jovens.
Os dois países enfrentam resistência de parte da população em se vacinar. É justamente entre os mais jovens que está a menor cobertura. Nos EUA, campanhas já chegaram a oferecer cerveja e prêmios para quem fosse tomar os imunizantes.
No Brasil não há brindes, mas a adesão do público tem permitido que a imunização alcance grande parcela da população em menos tempo, mesmo que interrupções na campanha em algumas cidades e estados sejam razoavelmente frequentes, em razão do desabastecimento de doses.
No dia 18 de junho, o Brasil tinha vacinado 10% dos jovens de 18 a 24 anos. Em 28 de agosto, 71 dias depois, a cobertura tinha chegado a 60%.
Em comparação, os Estados Unidos precisaram de 165 dias para alcançar o mesmo patamar de imunização, mais do que o dobro do tempo brasileiro. Para a Inglaterra, foram necessários 135 dias.
Especialistas apontam que o sucesso da campanha aqui está relacionado ao histórico do PNI (Programa Nacional de Imunização). Movimentos antivacina são raros e pouco expressivos no Brasil, diferentemente do que ocorre nos EUA. Ligia Kerr, epidemiologista, membro da câmara técnica do PNI e vice-presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva, afirma que o PNI e o SUS construíram, ao longo dos anos, a confiança do brasileiro na vacinação.
Também deram ao sistema de saúde a capacidade de organizar e realizar uma campanha de vacinação em todos os municípios do país, embora ela ressalte que falta coordenação nacional na campanha contra a Covid.
A abrangência colabora para a adesão grande e rápida dos jovens à vacina contra o coronavírus no Brasil, de uma forma que não acontece nos EUA, por exemplo.
"O brasileiro confia na vacina, quer ser vacinado. Tanto é que gente com muito dinheiro foi para fora para se vacinar logo quando ainda não havia vacinas suficientes no Brasil", afirma.
Ainda assim, os jovens levaram mais tempo para alcançar os 60% de cobertura do que a população com mais idade. No caso dos idosos com 70 a 79 anos, por exemplo, a proporção de vacinados saiu de 10% para 60% em menos de 20 dias.
Há várias possíveis explicações para isso, e uma delas perpassa a organização do programa de imunização. Não foi adotado um padrão nacional para a aplicação das vacinas, e coube às prefeituras decidirem o cronograma. Assim, a vacinação de jovens começou em momentos diferentes pelo país.
Enquanto São Luís vacinava pessoas de 24 anos, Palmas ainda estava na faixa dos 60 anos, por exemplo.
Isso aconteceu menos com os idosos porque o início da campanha foi razoavelmente semelhante para todos. Havia poucas doses, e foram priorizados os mais velhos. À medida que a campanha foi avançando, a desigualdade entre as faixas etárias atendidas pelas cidades cresceu.
Além disso, idosos são uma parcela menor da população, o que demanda um esquema menos robusto de organização da campanha. São 4,6 milhões os brasileiros com mais de 80 anos, ante 23,6 milhões com 18 a 24 anos.
É mais fácil, portanto, vacinar os mais velhos de forma rápida.
Flávia Bravo, diretora da Sociedade Brasileira de Imunizações, diz que, em qualquer campanha vacinal, é esperado que haja menor adesão de jovens. É um grupo saudável, que procura pouco os serviços de saúde e precisa conciliar os horários em que os postos funcionam com trabalho e estudo.
No caso da Covid, isso se soma a uma menor sensação de risco por parte dos jovens, que são minoria entre casos graves e mortes pela doença. Entre os internados, os que têm 18 a 24 anos não chegam a 3%.
Flávia diz também que pesquisas nos EUA apontam que, quando se fala na população mais jovem, há uma grande quantidade de pessoas que adiam a vacinação por desinteresse, não por serem convictamente antivacina.
"A maior parcela é de jovens hesitantes, não radicalmente contra. A realidade é que eles estão levando a vida, não estão se preocupando com isso. Há sobretudo um desconhecimento do papel na vacinação, não conseguem se mobilizar enquanto cidadãos fazendo parte de uma campanha coletiva. Mas você consegue convencê-los com boa comunicação sobre vacina", diz.
Ligia Kerr, por sua vez, lembra que, ainda que os jovens sejam minoria entre os hospitalizados, não estão a salvo de ter complicações da Covid. Além disso, existe um papel coletivo na imunização.
"A Covid pode matar qualquer pessoa, mesmo sem fatores de risco. Também precisamos pensar que, quando a gente se vacina, não protege só a nós mesmos, protege também quem está ao redor", diz.
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