A radicalização do discurso adotada pelo presidente Jair Bolsonaro em pronunciamento em cadeia nacional de rádio e TV nesta terça-feira (24) foi uma sugestão do grupo ideológico do Palácio do Planalto, formado pelo chamado "gabinete do ódio".
Entre as pessoas com quem Bolsonaro se reuniu nesta terça antes de gravar o pronunciamento está o vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), um de seus filhos e o principal defensor de que o presidente mantenha um discurso mais ideológico e anti-imprensa. Carlos tem forte influência no gabinete do ódio.
O encontro não estava previsto inicialmente, mas foi inserido na agenda ao fim do dia. Além de Carlos, participaram do encontro os ministros Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo), Onyx Lorenzoni (Cidadania), Ricardo Salles (Meio Ambiente) e Walter Braga Netto (Casa Civil). O senador Flavio Bolsonaro (sem partido-RJ) e o ex-jogador de futebol Paulo César Tinga também estavam presentes.
Nos últimos dias, segundo relatos feitos à reportagem, o núcleo digital da Presidência da República constatou uma desmobilização de perfis de direita nas redes sociais, que passaram a defender menos o presidente de ataques da esquerda.
A avaliação é a de que, diante do clima de animosidade, era hora de orientar a militância digital apontando inimigos, no caso os veículos de imprensa e os governos estaduais, mobilizando os eleitores fiéis a responderem às críticas contra a gestão federal.
Além disso, ao criticar o desaquecimento da atividade econômica, o presidente, segundo deputados aliados, tentou criar uma vacina: a de que um eventual aumento do desemprego no futuro não é responsabilidade sua, mas dos governos estaduais que adotaram medidas de contenção.
A estratégia adotada pelo presidente, no entanto, não é consenso no governo. O texto foi feito sem a participação de seus ministros.
Antes da gravação do discurso, de acordo com auxiliares palacianos, alguns integrantes do núcleo militar, cientes de que ele pretendia radicalizar o tom, tentaram dissuadir Bolsonaro.
Para eles, aumentar o clima de conflagração pode ter o resultado oposto ao pretendido: o de fortalecer o discurso dos governos estaduais e o de levar eleitores do presidente a abrirem mão do apoio.?
Desde o início da semana, a cúpula militar vinha tentando moderar o discurso do presidente. Foram eles, por exemplo, que convenceram Bolsonaro a promover videoconferências com governadores em busca de um consenso nacional.
O presidente deixou para esta quarta-feira (25) o último encontro, com os governadores da região Sudeste, com as presenças de João Doria (São Paulo) e Wilson Witzel (Rio de Janeiro).
Ele conversou na segunda (23) com os gestores de estados de Norte e Nordeste e, nesta terça (24), com governos do Sul e Centro-Oeste.
Nas palavras de um auxiliar presidencial, ao criticá-los de maneira indireta no pronunciamento, Bolsonaro se antecipou a eventuais críticas que possa sofrer de ambos na reunião por conferência.
Em seu terceiro pronunciamento sobre a crise de saúde, o presidente criticou o fechamento de escolas e comércio para combater a epidemia, atacou governadores e culpou a imprensa pelo que considera clima de histeria instalado no país.
Ele afirmou que desde o início da crise o governo se preocupou em conter o "pânico e a histeria" e voltou a minimizar a gravidade da covid-19 ao compará-la a uma "gripezinha" ou "resfriadinho".
A reação ao discurso foi de perplexidade entre deputados e senadores. O presidente do Senado Federal, Davi Alcolumbre (DEM-AP), disse que "o país precisa de uma liderança séria", responsável e comprometida com a vida e a saúde da sua população".
A senadora Kátia Abreu (PDT-TO) classificou o pronunciamento de "atrocidade". "Hoje na sessão on-line do Senado o sen. Flavio Bolsonaro convidou a todos p/ assistirem o pronunciamento do pai. Francamente senador. Não é possível que um jovem como vc pode concordar c/ essa atrocidade. Eu ainda tive esperanças no seu convite. Decepção total", escreveu a senadora em rede social.
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