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TSE obriga partidos a criar cota de fundo eleitoral para negros, mas só a partir de 2022

TSE obriga partidos a criar cota de fundo eleitoral para negros, mas só a partir de 2022

O tribunal analisou o assunto a partir de uma consulta apresentada pela deputada Benedita da Silva, que solicitou o mesmo entendimento que existe para candidaturas femininas

Publicado em 26 de agosto de 2020 às 09:40

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Sessão virtual no TSE que discutiu cota para negros nas eleições realizada em 25 de agosto de 2020. Medida valerá para 2022
Sessão virtual no TSE. (Flickr TSE)

Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu nesta terça-feira (25) obrigar os partidos a destinarem recursos do fundo eleitoral de maneira proporcional à quantidade de candidatos negros e brancos. A decisão, no entanto, não vale para as eleições municipais deste ano. A inovação nas regras eleitorais, entendeu a maioria dos ministros, ficará para o pleito de 2022. A Corte resolveu também aplicar regra similar à propaganda eleitoral gratuita na TV e no rádio.

Após o voto do presidente da Corte, Roberto Barroso, defensor da tese, votaram pela aprovação os ministros Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Og Fernandes, Luís Felipe Salomão e Sérgio Banhos.

Tarcísio Vieira de Carvalho foi o único a discordar da tese por entender que a matéria compete ao Congresso Nacional, onde projeto com esta finalidade já tramita.

"É um momento importante na vida do tribunal e do país. Há momentos da vida em que cada um precisa escolher de que lado da história precisa estar", disse Barroso.

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Hoje o TSE afirmou que estamos do lado dos que combatem o racismo, dos que querem escrever a história do Brasil com tintas de todas as cores

Luís Roberto Barroso
Presidente do TSE
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O julgamento havia sido interrompido na semana passada com um pedido de vista do ministro Og Fernandes e a análise foi retomada nesta terça.

"Negar à população negra iguais condições aos recursos do fundo partidário e ao direito de antena é inviabilizar a democracia participativa e plural em sua plenitude", afirmou Og.

Ao defender a atuação do tribunal, Og afirmou que o Legislativo se omite na discussão de medidas em defesa de populações vulneráveis, incluindo a seara eleitoral.

O ministro, no entanto, manifestou uma preocupação em se implementar mudanças às vésperas das eleições municipais deste ano, marcadas para novembro.

Concordando com a criação de cota financeira para candidaturas de pessoas negras, Luís Felipe Salomão compartilhou da preocupação de Og e defendeu a aplicação do novo dispositivo somente a partir das eleições de 2022 em nome da segurança jurídica.

"A alteração dos critérios no atual estágio tem o potencial de produzir ruídos indesejáveis na distribuição desses valores, causando insegurança jurídica", afirmou.

Ele, no entanto, reconheceu que o TSE toma uma decisão histórica.

"A distribuição igualitária dos recursos de campanha e do tempo de propaganda, na exata proporção de candidaturas lançadas, representa decisivo passo para amainar a histórica desigualdade de condições entre negros e brancos vivenciada em nosso país", afirmou Salomão.

No fim, por 4 votos a 3, prevaleceu o entendimento de que a nova regra deve valer apenas em 2022, o que frustrou Barroso, defensor da implementação imediata.

"Não deixa de ser uma frustração postergarmos uma situação que a maioria formada considera injusta. Esse adiamento dos efeitos da decisão não diminui a importância do que estamos fazendo aqui", afirmou o presidente do TSE.

O tribunal analisou o assunto a partir de uma consulta apresentada pela deputada Benedita da Silva (PT-RJ).

A congressista solicitou ao TSE a aplicação aos negros do mesmo entendimento segundo o qual o Supremo Tribunal Federal (STF) obrigou os partidos a investirem ao menos 30% do fundo público eleitoral em candidaturas femininas.

Quando votou na semana passada, o ministro Alexandre Moraes defendeu que fosse estabelecido um patamar mínimo de investimento para candidatos negros já em 2020.

Disse que a regra de transição é necessária para evitar que uma eventual fixação de cota financeira para concorrentes negros não tenha um efeito contrário.

A ideia é que as siglas usem um montante financeiro equivalente à quantidade de concorrentes negros no pleito municipal anterior.

Segundo Moraes, a proposta de Barroso poderia levar os partidos a não inscrever nenhum negro a fim de evitar a divisão do recurso eleitoral.

O ministro disse que a fixação de cota financeira assegura direitos fundamentais a grupos historicamente vulneráveis e não "se trata de atuação substitutiva ao Congresso Nacional com a fixação de uma política de ação afirmativa genérica".

Moraes sustentou que a regra imposta pelo TSE é adequada para a integração efetiva de negros em espaços de poder. Ele disse ainda que o cenário aponta para a perpetuação do quadro atual.

"Não tenho dúvidas de que a sub-representação das pessoas negras nos Poderes eleitos, ao mesmo tempo que é derivada do racismo estrutural existente no Brasil, acaba sendo um dos principais instrumentos de perpetuação da gravíssima desigualdade. Trata-se de um círculo extremamente vicioso."

Moraes ressaltou que os dados do TSE mostram que, em 2016, 49% dos candidatos homens eram negros, mas o grupo recebeu apenas 26% da verba eleitoral.

Sem uma regra de transição, destacou o ministro, os partidos poderiam reduzir a inscrição de negros ou mesmo registrar apenas concorrentes brancos.

AVANÇOS NAS CORTES SUPERIORES

Nesta segunda-feira (24), a reportagem ouviu especialistas em políticas de afirmação que defenderam a atuação do TSE na análise do tema.

Para o sociólogo Luiz Augusto Campos, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), as Cortes Superiores têm promovido avanços importantes.

De acordo com ele, a distribuição desigual de financiamento é um dos gargalos para a eleição de mais negros e pardos no país. "A decisão do TSE pode ser de grande impacto na sub-representação política de pretos e pardos."

O advogado Thiago Amparo, professor de políticas de diversidade na FGV Direito SP, afirmou que a análise do assunto pelo TSE é também um incentivo a que Congresso se mova, podendo tomar a dianteira em discussões como a paridade de assentos no Legislativo, a exemplo do que já fizeram países da América do Sul como Colômbia e Bolívia.

Embora representem pouco mais da metade da população do país, segundo o IBGE, os negros (pardos e pretos) seguem sub-representados nos mandatos eletivos.

Nas eleições municipais de 2016, levantamento feito pelo jornal Folha de S.Paulo mostrou que as candidaturas negras para vereador somavam 48% dentre os mais de 437 mil aptos na disputa. Entre os eleitos, esse percentual caiu para 42%. Entre os pretos, apenas 5%.

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