Muito antes de ter o formato atual e sofrer com a interferência humana que mudou a geografia da região com os aterros, a Baía de Vitória já tinha o próprio "guardião". Ainda hoje, o Penedo segue oferecendo guarda para Vitória e Vila Velha, no importante canal marítimo capixaba. Posicionado na foz do Rio Aribiri, no lado canela-verde, a imponente rocha é predominantemente contemplada por quem está do lado oposto, ou seja, na Capital.
O Penedo acompanhou a transformação da ilha com os aterramentos sobre onde antes era mar, a construção do Porto de Vitória e dos terminais portuários de Peiú e Vila Velha. O rochedo, entretanto, não passou à margem das transformações. Há milhares de anos, a rocha também sofreu as próprias mudanças, a principal delas permanecendo até a atualidade.
Em uma simples caminhada pela Beira-Mar, em Vitória, nota-se uma contínua faixa branca um pouco acima da linha d'água e que se prolonga não apenas por toda a extensão do Penedo, como também prossegue em outras rochas que formam o cenário da região.
JÁ FOI MAR...
Em 2008, quando o mais completo estudo sobre o Penedo foi concluído e publicado, o geógrafo Aziz Ab'Saber contou brevemente o que ocorreu no passado para que a base da rocha fosse "pintada". Ele recorreu às marcas das variações das marés existentes para explicar que, há mais de 20 mil anos, existia ali um rio batizado com o nome de “Rio Palio de Vitória”, onde hoje se encontra a baía, em frente ao Penedo.
Neste período, o mar estava a cem metros da posição atual. Quando as temperaturas do planeta aumentaram, cerca de dez mil anos depois, o mar avançou e fez desaparecer o rio, chegando a 3,5 metros dos níveis atuais. As marcas brancas na face oeste do Penedo são referentes a este período.
O que não é citado no estudo, entretanto, são as ações sofridas pela rocha na época, sendo que elas fizeram com que a marca surgisse de fora a fora. O mestre em Oceanografia, João Koppe, detalhou que o intemperismo químico e físico sofrido pelo Penedo criou a extensa linha branca na face da pedra.
CHUMBADA NA MARCA
Onde atualmente os gigantescos navios acessam a Baía de Vitória, no passado existiu uma pesada corrente de ferro passada da pedra até o Forte São João, onde hoje é a Avenida Beira-Mar, para evitar que embarcações piratas entrassem pelo canal (veja a ilustração no vídeo acima). Os desgastados argolões onde ela era fixada ainda encontram-se presos na rocha, posicionados justamente na faixa branca do Penedo.
Uma das passagens mais marcantes neste sentido ocorreu em meados de 1590. Nesta época, o Penedo foi imprescindível para a vitória dos nativos sobre o invasor inglês Thomas Cavendish.
Antecipando-se à investida, foi organizada uma resistência, com o acúmulo de pedras próximas ao Penedo, que também dava suporte para a corrente de ferro que se estendia à margem, desde o Forte São João, na época chamado de Morro do Vigia, fechando o canal para a passagem de navios corsários (piratas).
BATALHA DE CAVENDISH
Cavendish, inesperadamente barrado, se viu prisioneiro e perdeu dezenas de homens. Os corsários ingleses pensavam que iriam surpreender, mas acabaram surpreendidos.
Quando os ingleses, comandados por Morgan, braço direito de Cavendish, tentaram desembarcar na ilha, foram atingidos por pedras e flechas.
Ao final da batalha, corpos dos ingleses ficaram espalhados pela região, sem contar os afogados levados pela correnteza. Além dos mortos, oito ingleses da tripulação de Cavendish foram feitos prisioneiros. Coube ao almirante recolher os feridos e incendiar a outra nau, pois não tinha marinheiros suficientes para prosseguir com a invasão.
LENDAS NO PENEDO
Esta passagem está contada na cartilha do Monumento Natural Morro do Penedo. Peça crucial para a elaboração do documento, Agnaldo de Moura fala com propriedade sobre a batalha e de outras lendas que pairam sobre a região.
Morando há mais de 50 anos aos pés da rocha, o colatinense é o "guardião do Penedo". Ele também guarda boas histórias de um passado nem tão distante.
"Trabalhava como catraieiro, atravessando as pessoas de Paul para Vitória, e todos os marinheiros que chegavam ouviam muitas lendas. Não só do Penedo, como também da Pedra do Ovo, que fica ao lado. Ela se chama assim porque diz a lenda que, se o marinheiro atingisse a pedra com um ovo ou uma moeda, conseguiria arrumar uma namorada ou uma grande paixão aqui no Estado. Isso era contado de muito antes, então a gente incentivava os marinheiros a perguntarem. Trazíamos até aqui, eles jogavam uma moeda na pedra do ovo, com a esperança de arrumar um grande amor", conta Agnaldo.
Outra lenda que cerca o Penedo é a de que marinheiros que chegavam à região arremessavam batatas do convés em direção à marca branca da pedra. Essa oferenda era feita para evitar que os navios não fossem engolidos.
Penedo: marca, histórias, lendas do Guardião da Baía de Vitória
Estas histórias e a própria marca podem ser conferidas bem de pertinho. É possível, inclusive, chegar ao local de barco e subir a plataforma que fica logo abaixo dos argolões. Sem a presença da corrente, atualmente a base é utilizada por praticantes de rapel que exploram o Penedo.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.