Padre Matias Hahn, alemão que viveu na Colônia de Itanhenga, em Cariacica, foi referência em acolhimento no local 
Padre Matias Hahn, alemão que viveu na Colônia de Itanhenga, em Cariacica, foi referência em acolhimento no local . Crédito: Arquivo

O padre alemão que escolheu ser enterrado no cemitério de hansenianos no ES

Padre Matias celebrou missas, casamentos entre internos e batizados na Colônia de Itanhenga, em Cariacica, criada para isolar pacientes com hanseníase

Tempo de leitura: 3min
Vitória
Publicado em 28/01/2023 às 12h51

Em 1951, um padre alemão, recém-ordenado na Igreja Católica, chegava ao Espírito Santo com a missão de servir uma comunidade de pessoas diagnosticadas com hanseníase. No local, ele administraria, até o dia da sua morte, os sacramentos na Colônia de Itanhenga, em Cariacica, inaugurada em 1937 para isolar pacientes com a doença.

Matias Hahn ou padre Matias, como era chamado, celebrou missas, casamentos entre internos e batizados na colônia. Atuou também como fotógrafo, levando fotos que tirava das crianças que viviam no Educandário Alzira Bley — espécie de "orfanato" para abrigar filhos de hansenianos — para as mães que ficavam no Hospital Pedro Fontes. 

Em um local erguido sob a perspectiva da segregação, padre Matias se tornou uma referência em acolhimento. “Era ele quem explicava para as pessoas dali como era a vida, o que podia e o que não podia, dava sugestões, aconselhamento”, relata a médica e pesquisadora Patrícia Deps, que dedicou ao padre um capítulo do livro “O dia em que mudei meu nome”, em que conta a história dos hansenianos.

“Padre Matias foi uma figura de extrema importância para a convivência das pessoas dentro da colônia, para a organização delas, para que elas continuassem a vida religiosa.”

Padre Matias, padre alemão que viveu na Colônia de Itanhenga, em Cariacica, criada para pacientes com hanseníase
Padre Matias chegou na colônia em 1951 . Crédito: Arquivo

Quem conviveu com o sacerdote, conta que ele morava em uma casa simples, na zona reservada aos doentes. Diferentemente dos outros funcionários que trabalhavam no hospital, ele não tinha medo de se misturar. “Comia a mesma comida dos internos, ia na casa dos doentes”, lembra o deputado estadual Doutor Hércules, que trabalhou como diretor administrativo do hospital Pedro Fontes.

Há relatos, contudo, de que padre Matias se recusou a celebrar o casamento de um ex-interno. “Não queria me casar não, por eu ser preto e minha mulher loira”, relata José Fernandes Pereira, 70 anos, mais conhecido como Zé Pretinho, que chegou à colônia aos 13 anos.

De acordo com ele, o casamento acabou saindo depois da pressão de um dos internos, que era advogado: “Ele fez, mas a contragosto”.

Apesar do relato de Zé Pretinho, a maioria dos internos lembra do padre como uma pessoa que tentava amenizar as dores não físicas de quem vivia na colônia. Parte do dinheiro que o sacerdote recebia da Alemanha, por exemplo, era usada para comprar comida para os pacientes.

“Ele passava nos pavilhões todo dia de manhã para saber se a gente precisava de alguma coisa. Era uma pessoa muito boa”, lembra Anadir Scalzer.

Padre Matias também se preocupava com o lazer das crianças no educandário, como lembra Heraldo Pereira, que cresceu no local e atualmente é presidente da Associação dos Ex-Internos do Preventório Alzira Bley.

Heraldo Pereira

Ex-interno do educandário

"Chegava domingo, ele ia para o educandário celebrar a missa e trazia uma bola para a gente. Falava com aquele sotaque forte: “meninos, meninos” e balançava o sino. Era uma alegria"

Celebrações na Colônia de Itanhenga, em Cariacica

Celebração de casamento na Colônia de Itanhenga, em Cariacica
Celebração de casamento na Colônia de Itanhenga, em Cariacica. Arquivo
Casamento na Colônia de Itanhenga, em Cariacica
Casamento na na Colônia de Itanhenga, em Cariacica. Arquivo
Celebração na Colônia de Itanhenga, em Cariacica
Celebração Casamento na na Colônia de Itanhenga, em Cariacica. Arquivo
Capela na Colônia de Itanhenga, em Cariacica
Capela da Celebração na Colônia de Itanhenga, em Cariacica. Arquivo
Celebração na Colônia de Itanhenga, em Cariacica
Celebração na Colônia de Itanhenga, em Cariacica. Arquivo
Residência dos casados na Colônia de Itanhenga, em Cariacica
Casa dos casados Colônia de Itanhenga, em Cariacica. Arquivo
Casa dos casados Colônia de Itanhenga, em Cariacica
Casa dos casados Colônia de Itanhenga, em Cariacica
Casa dos casados Colônia de Itanhenga, em Cariacica
Casa dos casados Colônia de Itanhenga, em Cariacica
Casa dos casados Colônia de Itanhenga, em Cariacica
Casa dos casados Colônia de Itanhenga, em Cariacica

Umberto Galazzi, que também cresceu na colônia, é outro que guarda boas lembranças. Para ele, o padre era como um membro da família. “Ele dava aquela atenção para a gente, sabe. Uma atenção que a gente não tinha ali”, conta.

Padre Matias Hahn faleceu em 28 de abril de 1979, aos 76 anos. A pedido dele, foi sepultado no cemitério da Colônia de Itanhenga.

“O túmulo dele está lá, entre os pacientes. Ele nunca aceitou aquela segregação, achava que o lugar dele era junto com os doentes. Com certeza, está no céu, era um santo”, afirma Doutor Hércules.

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