As contas públicas - União, Estados e municípios - estão num bom momento. Mas será que o céu é de brigadeiro no médio e longo prazos? Será que é o momento de abrir mão de receitas e de ampliar o gasto? Para Alberto Borges, ex-secretário da Fazenda de Vitória e um estudioso das contas públicas, a resposta é "não". Na avaliação dele, estamos numa trilha perigosa.
"A sociedade precisa prestar atenção no que está acontecendo, é um perigo. Com base em eventos extraordinários estão sendo tomadas decisões que elevam o gasto público e abrem mão de receitas importantes. Onde isso vai dar? Como sairemos desse festival?", alerta o economista, um dos responsáveis pelo Anuário Finanças dos Municípios Capixabas.
Borges se mostra preocupado com a desoneração generalizada do ICMS cobrado em cima dos combustíveis. Aqui no Espírito Santo o governo ainda anunciou redução nas alíquotas em cima de energia elétrica e telecomunicação. Na outra ponta, a pressão por aumento de gastos só cresce - com servidores pressionando por reajustes (que estavam travados desde 2020) e os próprios governos concedendo benesses (vide os últimos movimentos do governo federal).
"Estão, por motivações diversas e em todo o país, tomando decisões em cima de eventos extraordinários que não se repetirão. É um falso positivo o que temos hoje. O gestor responsável tem que colocar uma data para isso acabar, caso contrário, teremos problemas graves logo ali na frente".
Para Borges, os eventos extraordinários que fizeram as receitas subirem e sobrar caixa são:
- Energia elétrica e combustíveis são grandes recolhedores de impostos. Como tiveram forte alta em 2021 e começo de 2022, turbinaram os tesouros. Nos dois casos os preços começaram a retroceder;
- A inflação, que disparou no final de 2020 e só agora começa a dar sinais de queda, também contribui muito para a elevação da arrecadação, afinal, os tributos incidem em cima de valores. É o famoso imposto inflacionário;
- 2021 foi o primeiro ano dos novos prefeitos, como de costume, os investimentos foram lá para baixo, ajudando no caixa. A tendência é de uma aceleração nos investimentos municipais em 2023 e 2024, elevando as despesas. Os municípios capixabas fecharam o ano passado com R$ 1,8 bi em caixa, depois de muitos anos nenhuma das 78 prefeituras enfrenta a chamada insuficiência financeira;
- O funcionalismo, por conta da lei do socorro financeiro do auge da pandemia, em 2020, ficou com os reajustes travados até o final do ano passado, tirando a pressão sobre as despesas. Os reajustes voltaram este ano e, por conta da inflação, o servidores querem mais.
"São vários os eventos extraordinários e muitas as incertezas pela frente. Com a inflação caindo, precisamos de crescimento econômico para a arrecadação dar conta. Teremos crescimento? O cenário externo, com recessões em Estados Unidos e Europa, também parece não ajudar. O gestor precisa de um olhar estratégico, o cenário de agora, com toda essa suficiência de caixa, não é consistente", finalizou Alberto Borges.
Em coletiva à imprensa realizada no último dia 28 de junho, quando anunciou redução de ICMS para combustível, telecomunicações e energia elétrica, o governador Renato Casagrande deixou escapar que ainda não há um plano pronto no governo do Estado para tapar o buraco que será aberto no orçamento de 2023. "Projetamos que nos próximos seis meses, o Estado e os 78 municípios vão deixar de arrecadar R$ 1,14 bilhão. Teremos que compensar isso de alguma maneira. Este ano utilizaremos os superávits dos exercícios anteriores e o excesso de arrecadação, que está um pouco melhor do que o previsto. Para o ano que vem, nossa equipe terá que pensar em novas medidas”.
A conta não é baixa e a cabeceira da mesa, ao que parece, ainda não está ocupada.
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