Nilton Molina, presidente do Conselho de Administração da Mongeral-Aegon, gigante do setor de seguros que opera no Brasil desde 1835, é um personagem diferente, que merece a nossa atenção. Aos 88 anos, segue trabalhando diariamente e viajando por todo o Brasil. Na última quarta-feira (06), ele esteve em Vitória, em evento organizado pela Preves (Fundação de Previdência Complementar do Estado do Espírito Santo). Molina, que ajudou a colocar de pé empresas do porte de Icatu e Bradesco Vida e Previdência, tornou-se especialista em usar toda a experiência adquirida ao longo da vida para tomar alguns bons atalhos diante das dificuldades e das oportunidades que sempre se apresentam.
"Em cada crise dessa você pode copiar e colar, as mesmas coisas acontecem, tudo absolutamente igual. Só que antes era em slow motion (câmera lenta) e hoje tudo é muito rápido. O momento atual, vamos chamar de crise, tem diversos verticais. Tecnologia. Inteligência Artificial. Teremos empregos amanhã? Digo que teremos, serão diferentes, mas teremos. Foi sempre assim, desde a Revolução Industrial. Então, um homem da minha idade, que já passou por muitas crises e leu sobre outras tantas, pode dizer o seguinte: vai passar, como as outras passaram".
Aos jovens, Molina orienta: "sejam previdentes e trabalhem". Quando ele fala isso está pensando em dois aspectos, o econômico, ele não enxerga viabilidade no modelo atual previdência, com uma geração mantendo a outra, e de saúde (mental principalmente). "Manter-se sempre ativo, sempre aprendendo. É o que vai te manter vivo. Estudar sempre, eu sou uma esponja, aprendo sempre. Você, nessa entrevista, me ensinou alguma coisa. É sempre assim, temos que estudar e melhorar a cabeça. Eu tenho sérias dúvidas se vou morrer (risos)!".
Estamos vivendo um momento de muita polarização política, em várias partes do mundo e também aqui no Brasil. Isso, claro, gera turbulência, inclusive econômica. O senhor, do alto de seus 88 anos, já passou por várias crises e turbulências, como está vendo o atual momento?
A única diferença do atual momento para todas as outras crises que vivi ao longo da minha vida é a rapidez com que as coisas acontecem, se desenvolvem e desaparecem. É um produto da digitalização, do avanço da tecnologia. Eu assisti os pracinhas (soldados brasileiros que foram para a Segunda Guerra Mundial) voltando da Itália. Já era adulto, em agosto de 1954, quando se deu o suicídio de Getúlio Vargas e a crise que decorreu disso. A renúncia de Jânio Quadros (em 1961). Tudo com reflexos na vida e na economia, os fenômenos são os mesmos: a bolsa cai, o dólar avança, o desemprego aumenta... É sempre igual, com as diferenças da época. Depois vieram os militares (1964), o fim da era militar (1985), a morte de Tancredo Neves (1985)... Em cada crise dessa você pode copiar e colar, as mesmas coisas acontecem, tudo absolutamente igual. Só que antes era em slow motion (câmera lenta) e hoje tudo é muito rápido. O momento atual, vamos chamar de crise, tem diversos verticais. Tecnologia. Inteligência Artificial. Teremos empregos amanhã? Digo que teremos, serão diferentes, mas teremos. Foi sempre assim, desde a Revolução Industrial. Então, um homem da minha idade, que já passou por muitas crises e leu sobre outras tantas, pode dizer o seguinte: vai passar, como as outras passaram. Vejo que, neste momento, vivemos uma revolução da identidade política dos países. "O Trump vai fazer isso", "o Bolsonaro fez aquilo", o Lula está fazendo aquilo lá"... É tudo meia-verdade. Lula passa, Trump passa, Bolsonaro passa e o que vai continuar é você, a sua família, a sua empresa, a sua cidade e é isso que manda. É ter a convicção de que, no meio de tudo isso, você está fazendo o melhor para toda esta unidade. Se todos agirem assim, a crise passa mais fácil.
E como fazer isso em um momento em que você está com medo de, por exemplo, não ter mais trabalho, seja por causa da crise ou pela revolução tecnológica, e, para piorar, em meio a uma quantidade enorme de informações, nem sempre verdadeiras, o que acaba deixando as pessoas ainda mais ansiosas? Como organizar as ideias?
Se por um lado essas crises são alimentadas pela tecnologia, que colocou muita velocidade nas coisas, por outro nós temos muito mais informações hoje do que tínhamos lá atrás. Quando eu nasci não tinha TV e muito menos internet. A crise traz insegurança, também havia isso no passado, mas o ponto é buscar informações de qualidade, as pessoas precisam desenvolver isso. Fica mais fácil o processo de solução e, muitas vezes, nem percebemos. Veja o que aconteceu agora, nas eleições municipais, com Lula de um lado e Bolsonaro de outro. Os dois perderam. Isso mostra que as pessoas vão entendendo o processo e as coisas vão se resolvendo. Não podemos ser catastróficos.
Como o senhor está vendo a economia do Brasil?
Temos um problema fiscal que vem de muito tempo. Se você, na sua casa, ganha 100 unidades monetárias por mês, não pode gastar 120. Vai ficar endividado. Se fizer isso por um longo espaço de tempo, corre o risco de perder a casa. Se isso acontecer na sua empresa, vai à falência. No Estado, apesar de a contabilidade pública se mostrar muito complexa, é a mesma coisa. O que vivemos, e não é de hoje, é uma fase de irresponsabilidade fiscal. A origem disso está lá na Constituição de 1988, quando ela começa a carimbar o orçamento. Vai tantos por cento para a saúde, vai tantos por cento para a educação e por aí vai. Hoje, mais de 90% do orçamento está carimbado, como que corta? É para enfrentar o problema? Então é preciso revisitar e redimensionar tudo isso. Só que politicamente isso não elege ninguém, é aí que temos o conflito. Conflito do político que não é estadista, que está preocupado com a eleição seguinte e, por isso, não quer tomar medidas que podem ser impopulares, pelo menos em um primeiro momento...
Mas aí temos uma situação em que o desajuste das contas afeta a economia. Isso também não elege ninguém...
Tem razão. Mas, quando se faz um ajuste, normalmente a colheita se dá mais para frente, no mandato seguinte... É igual a time de futebol sem dono. O presidente monta time, contrata bons jogadores, faz dívida, ganha alguns títulos e, quando a conta chega, o mandato dele acaba e ele vai embora. Isso tem limite. Eu sou corintiano, o Corinthians tem uma dívida enorme, R$ 2,3 bilhões, tem que vender, não tem solução, não com aquele tipo de governança que está lá. Sem acertar as finanças não vai. Mesma coisa com as contas do país. Sem uma correção, não teremos avanços sustentáveis, a conta não fecha. É um conflito, sem dúvida. Veja que o dólar está lá no alto, inflação subindo, juros também e tudo deságua na economia real.
Falando em fiscal, temos que falar em Previdência Social. Já precisamos de uma nova reforma?
Vamos separar a população em três grandes massas: crianças e jovens que nunca contribuíram, trabalhadores que estão na ativa e os idosos já aposentados. No grupo dos idosos, direitos garantidos. No grupo dos que trabalham, temos a promessa de benefícios. E temos os que não trabalham, para estes podemos propor qualquer sistema. A massa de ativos está, hoje, sustentando quem está aposentado, não há acúmulo de recursos para eles, por isso falo em promessa de benefícios. Acho que o Brasil ainda tem uma pequena chance de não mexer naqueles que já estão recebendo. Tira gordura, tira as coisas erradas, mas não rompe o contrato. Mas esses 120 milhões que estão na ativa hoje, terão, em um futuro muito próximo, apenas um benefício de renda mínima garantido pelo Estado. Os que estão trabalhando podem ser divididos em três grupos também: jovens, intermediários e quase velhos. Para quem está quase se aposentando ainda é possível não jogar no mínimo, para os demais é o seguinte: você ainda tem tempo de fazer a sua poupança, faça isso ou terá de viver com uma renda mínima, que é o que o Estado terá condições de bancar. Portanto, faça a sua previdência e poupe, o pacto intergeracional foi quebrado. Quando os institutos de previdência do Brasil começaram, eram 40 contribuindo para um aposentado. Hoje, está em 1,8.
O senhor está com 88 anos e trabalhando...
... E feliz. A aposentadoria acabou. O que significa a palavra 'aposentadoria'? Ir para o aposento. Aposento da vida? Vou descansar no meu aposento, mas não desejo para ninguém ir para o aposento.
Qual o segredo?
Tive a sorte de não ter tido uma doença que me deixasse fisicamente inviabilizado. Ao longo da minha vida sempre cuidei da minha saúde, isso é muito importante. Mas vai além, passa por ter objetivos, manter-se sempre ativo, sempre aprendendo. É o que vai te manter vivo. Estudar sempre, eu sou uma esponja, aprendo sempre. Você, nessa entrevista, me ensinou alguma coisa. É sempre assim, temos que estudar e melhorar a cabeça. Eu tenho sérias dúvidas se vou morrer (risos)!
Uma dica para quem está começando.
Seja previdente e trabalhe. É difícil falar isso para um jovem, mas é isso.
Este vídeo pode te interessar
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.