O médico cirurgião Fabiano Pimentel Pereira assumiu o comando da Unimed Vitória em 27 de março de 2023. Dois meses depois, em 31 de maio, o jornal Valor Econômico publica a informação de que a Unimed Vitória era um dos maiores cotistas dos fundos da Infinity Asset, gestora que entrou em grave crise e que foi fechada para resgates. O curso do mandato foi alterado radicalmente logo na decolagem. De lá para cá, o presidente de uma das maiores cooperativas do Estado mergulhou no trabalho, ficou semanas sem conseguir dormir, montou (ao lado da diretoria e dos executivos) uma plano para tomar decisões com agilidade e não falou com a imprensa. Esta é a primeira entrevista que ele concede.
"O susto inicial foi grande, mas felizmente conseguimos organizar. Colocamos para rodar um plano focado em melhorar a operação e a gestão da Unimed. Em abril, primeiro mês da nossa gestão, o resultado já foi positivo, em setembro, apesar de tudo o que aconteceu de maior em diante, revertemos todo o acumulado negativo do ano".
O buraco causado pela Infinity ainda não foi completamente coberto, ainda faltam perto de R$ 140 milhões. Os próximos dias serão decisivos. Uma carta de crédito foi apresentada pelos administradores e a data marcada para o dinheiro pingar é 12 de fevereiro, segunda-feira de carnaval, que é um dia oficialmente útil. A carta é assinada pela ICP Ventures, empresa do próprio Grupo Infinity.
Sobram dúvidas sobre se o dinheiro virá ou não, mas o clima, por conta da melhora dos resultados operacionais, é grande. "Só para você ter uma ideia, lá atrás, quando assumimos, a previsão era ter de mandar um boleto para cada cooperado da ordem de R$ 150 mil para suprir a perda que estava sendo prevista para dezembro. Os 2,6 mil cooperados teriam de aportar esse recurso, na Unimed. Hoje, na pior situação, se o fundo não pagar o que ainda precisa pagar, fica na casa de R$ 15 mil por cooperado. Mas a nossa expectativa, alguns fatos ainda estão acontecendo, é levar um superávit entre R$ 30 milhões e R$ 40 milhões ao cooperado".
Ao lado de Fabiano Pimentel Pereira, na entrevista, estavam Gustavo Knupp, executivo da Unimed Vitória, e o médico ortopedista Dejair Cordeiro, diretor de Mercado.
O grande fato da Unimed Vitória no último ano foi o rombo causado pelo investimento feito no fundo Infinity. Foi logo no início da sua gestão e certamente te obrigou a mudar os planos de voo logo no começo do seu mandato. Como foi aquilo?
Aquilo ali foi uma surpresa. Quando nós ingressamos, no início do ano passado (27 de março), sabíamos que os desafios seriam grandes, mas nos deparamos com algo muito maior sob o ponto de vista operacional. O Infinity foi uma grande surpresa porque, na transição, os gestores antigos não comunicaram nada. Eles já tinham conhecimento, mas não nos passaram absolutamente nada. Este fundo teve mais de seis fatos relevantes (comunicados ao mercado) dizendo o seguinte: "tira o meu dinheiro daqui, ele não pode continuar aqui". Em fevereiro, antes de entrarmos, o fundo já tinha sido remarcado, o recurso já estava preso, não poderia ser sacado. Só que como ainda não tinha o default (calote) de fato, a contabilidade que nos foi apresentada pela equipe financeira da Unimed da época estava toda ok. Diante disso, partimos para tocar o nosso plano. Quando, por terceiros, descobrimos o que estava acontecendo, foi uma enorme surpresa. Com o fato consumado, fomos buscar entender qual era o impacto daquilo ali. Observamos que apenas 10% (R$ 18 milhões) deste fundo estavam como garantidor na ANS (Agência Nacional de Saúde), dinheiro que temos de deixar na agência para garantir o atendimento dos clientes em caso de problema da operadora. Chamamos imediatamente ANS para conversar, apresentamos o nosso plano para reverter a situação, eles entenderam, nos apoiaram e, em três meses, o dinheiro necessário já estava novamente no fundo garantidor da ANS.
Como estão as finanças da Unimed Vitória hoje?
Além do problema com o Infinity, eram R$ 186 milhões da Unimed Vitória ali, a antiga gestão (liderada por Fernando Ronchi) assumiu compromissos de caráter assistencial, cerca de R$ 140 milhões, que precisavam ser quitados, tomou empréstimos junto a instituições financeiras da ordem de R$ 140 milhões e tinha fechado, o primeiro trimestre de 2023, com R$ 16,3 milhões no negativo. Somando isso tudo dava um rombo de algo perto de meio bilhão de reais. Imediatamente colocamos para rodar um plano focado em melhorar a operação e a gestão. Em abril, primeiro mês da nossa gestão, o resultado já foi positivo. Em setembro, revertemos todo o acumulado negativo do ano. Hoje, o resultado da Unimed Vitória é positivo, estamos investindo com recursos próprios e vamos investir mais. A robustez está voltando. Ainda aguardamos o desfecho da situação do Infinity para termos uma resposta sobre sobras ou perdas referente ao ano passado. Importante dizer, novamente, que estamos com superávit nas provisões técnicas exigidas pelas ANS. Só para você ter uma ideia, lá atrás, quando assumimos, a previsão era ter de mandar um boleto para cada cooperado da ordem de R$ 150 mil para suprir a perda que estava sendo prevista para dezembro. Os 2,6 mil cooperados teriam de aportar esse recurso na Unimed. Hoje, na pior situação, se o fundo não pagar o que ainda precisa pagar, fica na casa de R$ 15 mil por cooperado. Mas a nossa expectativa, alguns fatos ainda estão acontecendo, é levar um superávit entre R$ 30 milhões e R$ 40 milhões ao cooperado. Não queremos o cooperado no prejuízo. Temos até o final de março para apresentar o balanço.
Fabiano Pimentel Pereira
Presidente Unimed Vitória
"A nossa expectativa, alguns fatos ainda estão acontecendo, é levar um superávit entre R$ 30 milhões e R$ 40 milhões ao cooperado. Não queremos o cooperado no prejuízo. Temos até o final de março para apresentar o balanço."
Um investidor secreto, pelo menos para o grande público, se comprometeu a aportar US$ 100 milhões no Infinity, ressarcindo a Unimed Vitória. Esse dinheiro deve ser depositado agora em fevereiro. Qual é a expectativa de vocês? Saindo o dinheiro, o que será feito?
Há um compromisso de pagamento no dia 12 de fevereiro. Este compromisso foi firmado em meados do ano passado, na assembleia dos cotistas do Infinity. Fomos à RJI, que é a administradora, buscar mais garantias. A RJI nos apresentou uma contraparte com uma carta de crédito de US$ 100 milhões. Fomos à contraparte e conseguimos com eles uma carta de crédito exclusiva para a Unimed Vitória. Se comprometeram a honrar tudo. Estamos, agora, formalizando um contrato com eles e aguardando o retorno desses recursos. É isso que está acontecendo agora.
Quem é esta contraparte? Qual é a confiança que vocês têm de que esse dinheiro de fato irá voltar aos cofres da Unimed Vitória?
Nós trabalhamos com cenários. Com o cenário de que o dinheiro retornará e com o cenário da ausência deste recurso. Baseado nesses cenários, apresentamos as alternativas para o cooperado, tudo, aliás, apresentado em assembleia. Esta carta de crédito existe, mas só vamos saber se o dinheiro virá ou não em 12 de fevereiro.
Mas quem assina a carta?
Isso é um fato estranho que compartilho com você. Como uma administradora de fundo, no caso a RJI, apresenta uma contraparte e não remarca o fundo (atualizar o preço do ativo)? Numa condição normal não precisaria de carta creditória.
Fabiano Pimentel Pereira
Presidente Unimed Vitória
"Há um compromisso de pagamento no dia 12 de fevereiro. Este compromisso foi firmado em meados do ano passado, na assembleia dos cotistas do Infinity. Fomos à RJI, que é a administradora, buscar mais garantias"
Então vocês não sabem quem é a contraparte?
É a ICP Ventures.
Dejair Cordeiro: Não temos todos os detalhes da contraparte. Diante deste cenário, a Unimed Vitória tomou todas as medidas para minimizar os danos do fundo. Não temos a garantia de que o dinheiro irá retornar, o que temos é uma série de ações que tomamos para otimizar a possibilidade desse retorno, mas não sei se teremos sucesso, vamos esperar o dia 12 de fevereiro. Independente da volta do fundo, a Unimed Vitória está com a sua vida financeira equalizada e, mais importante, ninguém - fornecedor, cooperado, parceiro e cliente - tomou prejuízo por conta desse fundo. E não fomos ao mercado financeiro para resolver o problema, a solução foi interna, melhorando a gestão, potencializando as oportunidades e usando a força da marca. Quando saiu a informação do problema no fundo, tínhamos 406 mil clientes, chegamos aos 420 mil, mesmo retirando da carteira contratos deficitários. Claro que trabalhamos muito para que os recursos do fundo voltem, seria um balão de oxigênio gigantesco, mas, se não vier, a vida da Unimed está resolvida. Importante dizer que uma parte dos recursos foram remarcados, estamos falando do retorno de algo perto de R$ 140 milhões.
Tudo bem, mas, se o dinheiro não entrar, haverá desdobramentos...
Dejair Cordeiro: Sim, se não entrar, vamos fechar o exercício de 2023 no negativo, afinal, vamos perder esses ativos que estão lá, aí temos os desdobramentos que já estão sendo trabalhados dentro da cooperativa. O mais simples seria fazer um rateio entre os cooperados. Podemos também lançar mão de uma série de reservas e provisionamentos que nós temos para cobrir o rombo sem danos para o cooperado. O maior objetivo dessa gestão é que o cooperado não receba esse reflexo.
Vocês estão relatando um cenário financeiro que era muito ruim, no começo de 2023, e que acabou sendo contornado mesmo se a Unimed não receber os recursos do Infinity, que é o pior cenário. Como foi possível?
Importante dizer que não foi via reajuste de planos. A média do mercado ficou em 25%, a nossa ficou em 18,15%, para suprir a sinistralidade, que é uma obrigação nossa. O que de fato mudou foi a gestão: diminuição das despesas administrativas, das despesas operacionais, ampliação da carteira de clientes, combate às fraudes... Foram mais de 300 iniciativas no decorrer de 2023, é muito trabalho e busca por oportunidades.
E os investimentos? Vocês já anunciaram a intenção de ampliar o Hospital Unimed, em Vitória, de ter mais presença na Serra... Como está o planejamento?
Vamos manter os investimentos com os pés no chão. Temos aportes relevantes em unidades novas para o tratamento do autismo e de oncologia. Na Serra, vamos inaugurar, agora no primeiro semestre, uma unidade avançada, com atendimento 24h e parque de diagnóstico. Para o segundo semestre, a ideia é termos seis salas de cirurgia e 27 apartamentos. É um chamado hospital-dia, com assistência intermediária. O investimento total fica na casa dos R$ 150 milhões. No Hospital Unimed, em Vitória, temos um projeto grande, que envolve todos aqueles terrenos no entorno, mas, no curtíssimo prazo, vamos reformar toda a área do estacionamento, ampliando o espaço e o número de vagas. Até o final do ano, esperamos iniciar a primeira das três torres que faremos ali, trazendo grande parte de nossos serviços para aquele local. O cliente vai chegar e se resolver ali dentro.
Depois de dez meses à frente da Unimed, com crise e tudo, o que o senhor tem a dizer aos cooperados e aos clientes da Unimed Vitória?
Baseado no que fizemos em 2023, teremos um bom 2024 para os cooperados e para os usuários. Estamos canalizando esforços para aumentar os honorários médicos. Com o médico satisfeito, o cliente fica satisfeito. Aumentar o valor da consulta é um desafio nosso para 2024. Também queremos corrigir os plantões a um patamar superior ao ofertado por qualquer outra operadora. Queremos estar cada vez mais robustos, vamos seguir crescendo a carteira, ofertando cada vez mais oportunidades de atendimento para a clientela e, claro, para dar conta disso tudo, investindo. Importante dizer aos nossos clientes que vamos intensificar a busca por um melhor atendimento, mais acolhimento e mais entregas. Estamos comprometidos com tudo isso.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.