Será que a posição do pescoço, ao utilizar smartphones, pode aumentar a prevalência de dor na cervical? Com frequência recebo em meu consultório pacientes com as mais diversas queixas de dor musculoesquelética. E a dor na região do pescoço certamente é uma das que mais se destaca.
Muitos destes pacientes chegam com a crença de que a dor na coluna cervical é proveniente da postura do pescoço ao utilizar o celular para leitura e para enviar mensagens. Levando em consideração que o número de aparelhos é superior ao de pessoas, é uma hipótese a ser levantada. É foi o que foi feito em um estudo recente conduzido no Brasil em que se buscava observar se há associação (ou não) dessa postura do pescoço e o aumento de casos de dor na região.
Pessoas que experimentam dores na região do pescoço e acham que há relação com a posição da cabeça ao usar o celular, eventualmente acabam mudando a postura da cervical com uma curvatura que julgam ser a ideal, trazendo o celular para a altura dos olhos. Ou acabam ficando mais vigilantes. O problema é que todas essas formas de enfrentamento podem perpetuar a queixa de dor ao invés de ajudar a melhorar.
Existem vários componentes que podem causar dor na região da cervical, e colocar a culpa na somente na postura pode não ser a melhor decisão. Existem fatores sociais, psicológicos e de hábitos de vida que podem interferir diretamente na queixa. E o tratamento deve contemplar todas essas dimensões da dor.
O que foi observado neste estudo recente é que pessoas com dor na cervical (ou sem dor na cervical) adotaram ângulos de posição do pescoço muito parecidos ao usar o celular. Com isso, podemos dizer que não há associação entre a postura da cabeça e pescoço no uso do smartphone e a dor na região, nem com relação à frequência de dor, nem com relação à intensidade.
A crença de que uma posição ruim da cervical pode gerar um desgaste ou lesão na região acaba perpetuando informações nocivas oferecidas pelos próprios profissionais de saúde. E isso tende a gerar mais solicitações de exames de imagem desnecessários, além de um excesso de tratamentos que objetivam tratar as estruturas do pescoço ao invés de se analisar o sujeito como um todo. E mais: entender quais as melhores medidas de saúde podem ajudar num contexto biopsicossocial. O tratamento deve ocorrer em equipe a fim de oferecer apoio e facilitar a busca por saúde e mudanças de hábitos de vida para garantir a melhora da dor.
O que esta relevante pesquisa traz como reflexão é que não há postura incorreta e que a melhor postura é sempre a próxima, enfatizando sempre a manutenção do movimento ao visar a manutenção da saúde. O ângulo do pescoço não parece ser fator relevante na dor, mas a falta de atividade física relacionada ao excesso do uso de celular, sim! Se afastar das telas pode ser um bom passo para melhorar a dor cervical, não pela mudança na postura, mas pela possibilidade de eliminar o sedentarismo, grande fator de risco para dores crônicas.
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