Enquanto o café atinge preços históricos e a safra capixaba promete recorde, produtores enfrentam um problema inesperado: falta quem queira trabalhar.
O Brasil vive um paradoxo inquietante. Ao mesmo tempo em que comemora o menor índice de desemprego da história recente — 7,4% em janeiro de 2025, segundo o IBGE —, convive com uma realidade que não fecha na ponta do lápis: mais de 40 milhões de brasileiros estão na informalidade, sem acesso a direitos trabalhistas básicos e, muitas vezes, preferindo os benefícios sociais ao vínculo formal de trabalho.
O que deveria ser ponto de partida — a proteção social — tornou-se, para muitos, ponto de chegada. A concessão cada vez mais ampla e desregulada de auxílios, sem contrapartidas claras ou incentivo à qualificação profissional, tem gerado uma dependência perigosa. Assistimos a uma transição silenciosa de uma cultura do trabalho para uma cultura do recebimento.
E os efeitos já são visíveis em setores essenciais da nossa economia. Um exemplo emblemático está no coração agrícola do Espírito Santo, onde a colheita do café — que nunca esteve tão valorizada no mercado internacional — começa a preocupar produtores não pelo clima, nem pela qualidade da safra, mas pela ausência de mão de obra disposta a trabalhar no campo.
Segundo dados, o café conilon ultrapassou em 2025 a marca de R$ 1.750,00 por saca, atingindo o maior valor nominal já registrado. E o Espírito Santo, maior produtor nacional do grão, está prestes a colher uma das melhores safras dos últimos anos, tanto em volume quanto em qualidade. Temos o produto, o mercado, a demanda e até a remuneração. Só falta quem queira fazer.
Produtores rurais estão oferecendo salários justos, transporte, alimentação, moradia e benefícios adicionais, mas encontram resistência. A matemática da ausência é cruelmente simples: se posso receber sem trabalhar, por que trabalhar?
Segundo o Ministério do Desenvolvimento Social, mais de 21 milhões de brasileiros recebem o Bolsa Família em 2025. Parte expressiva desse contingente, especialmente nas zonas rurais, opta por não buscar oportunidades de trabalho, pois os rendimentos oriundos de programas como o Bolsa Família e o Benefício de Prestação Continuada (BPC) podem superar ou igualar o que ganhariam em atividades sazonais como a colheita.
É preciso coragem para dizer: os trabalhadores sumiram, mas os benefícios continuam chegando.

Essa lógica é perversa. Mina a produtividade, enfraquece o espírito empreendedor e sabota o desenvolvimento econômico. A ausência de políticas públicas que promovam a transição entre o assistencialismo e a inclusão produtiva está gerando um vácuo que prejudica os empresários, desestimula os trabalhadores e compromete o futuro do país.
Não se trata de demonizar os programas sociais — que são fundamentais para proteger os mais vulneráveis —, mas de ressaltar a urgência de uma virada de chave. O assistencialismo deve ser um apoio temporário, não um projeto de vida. O Brasil precisa com urgência de políticas que incentivem a qualificação, a reinserção no mercado de trabalho e a valorização do trabalho digno.
Enquanto isso, o café amadurece nos pés, pronto para ser colhido. E os produtores seguem à espera de quem queira trabalhar. Até quando vamos colher essa dependência em vez de colher progresso?
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