Tenho aqui comigo o álbum da violonista Ana de Oliveira. A moça tem bom lastro musical. Experiente como integrante em algumas orquestras importantes no Brasil e na Europa, Oliveira vem a público com seu primeiro álbum solo. Com um álbum no formato físico, a violinista traça sua trajetória, inspirada em momentos de sua própria vida.
O CD é de uma imprevisão impressionante. Com a habilidade adquirida nas orquestras, o que se ouve são improvisos de clareza orgânica, consistindo no fogo inesperado de suas composições. Com sonoridade expressa em intrínseca sabedoria, o que brota é um som pleno e extrovertido, um fiel tradutor da vida de Ana de Oliveira.
Criações inesperadas que vêm à tona nos compassos em que o violino se revela parte insaciável de braços e mãos da violonista.
O álbum "Dragão dos Olhos Amarelos – Improvisos Autobiográficos" é um imenso livro aberto ao mundo da criação. Diante de tudo isso, ponho-me a matutar com os botões: a música não para de me surpreender. Braços abertos à sua grandeza, ajoelho-me à sua sabedoria. Enquanto a vilania nos destrói, a música os destrói, corrompendo os maus presságios e permitindo que a vida flua aos trancos e barrancos. Ah, música, humildemente, estarei para sempre a seus pés, louvando-a e cantando-a.
Deixo a pensata para trás e vou ao violino, aconchegado que está nos braços de Ana de Oliveira – relação quase marital entre a mulher e o violino. Um violino pop, regado a virtuosismo, que não trata a erudição de “Sra.”, mas de brother.
Gravado, mixado e masterizado no superestúdio Monteverdi pelo multi-instrumentista André Mehmari, tudo fluiu em direção a dignidade e a excelência musical.
De igual para igual, cada faixa mistura vigor com intensidade e vivacidade do pop amigo do erudito. Tanto violonista como compositora, Ana desfaz laços e amplifica a beleza recém-descoberta no tocar. Desde o arco que bate nas cordas, numa poderosa percussão; nas delicadas narrativas de pianíssimo, ao sabor intenso do fortíssimo; do tema improvisado na levada clássica, ao rigor de alguns compassos mais ariscos – afinal, o pop está presente firme e forte.
Das quinze faixas registradas, onze são de Ana, nelas ela brinca de buscar o novo... o recém-descoberto. Nas outras, como as duas composições de Sérgio Ferraz, “Dodecafoniana I para violino solo” e “Dodecafoniana II para violino solo", o coro come bonito nas estripulias de Ana e seu instrumento.
Na faixa bônus, uma composição de Hermeto Pascoal. Homenagem à Ana de Oliveira, o solo coube a André Mehmari. Reconhecendo nele o gigante para fechar o disco.
Ao final, resta a música. A música que a todos (ou a quase todos) encanta, mas não cabe em uma só definição. A música é múltipla: preenche as almas sedentas por aconchego e renova as esperanças num mundo mais igualitário.
A todos a música, qualquer música, embala e fortalece. A música, seja ela popular ou erudita, é a trilha sonora de todas as vidas planetárias.
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