Um álbum uniu Mônica Salmaso ao cantor português José Pedro Gil, a partir de um projeto criado pelos dois e mais Emanuel de Andrade, Teco Cardoso, Nelson Ayres e Carlos Tê. Foi com base num show realizado em terras portuguesas que brotou a ideia de juntar as composições de Vinícius de Moraes e José Afonso num show Brasil/Portugal. Unidos por uma intensa e preciosa dramaturgia criada pelo escritor português Carlos Tê, tudo se deu.
José Afonso é um reverenciado compositor português; Vinícius é o nosso querido poetinha. Mas só agora, cantados ora por Salmaso, ora por José Pedro, ora pelos dois juntos, é que se percebe a acepção das músicas dos dois grandes compositores, o que as torna universalmente univitelinas. Meu Deus do céu!
Intercalando músicas de José Afonso com composições de Vinícius, Estrada Branca (Biscoito Fino) foi gravado ao vivo no Mosteiro de São Bento da Vitória, na cidade do Porto, em Portugal. O roteiro é deslumbrante.
A sonoridade dos arranjos, criados a partir da direção musical dividida entre Nelson Ayres, Teco Cardoso e Emanuel de Andrade, é visceral – soam concisos e opulentos. Variações de duos vocais e/ou instrumentais propagam a beleza do que tocam.
O canto de Salmaso e de José Pedro demonstra o apuro com que ensaiaram para cantar no projeto. Os corresponsáveis por tal deslumbre são instrumentistas brasileiros e portugueses igualmente afiados para a missão. Exemplo de responsabilidade profissional que comprova que, na música, no mundo e na vida, solidariedade é o sentimento mais próximo do amor.
“Chora Coração” (Tom e Vinícius) começa com o piano numa pegada sinfônica. A flauta segue no jeito. Aí vem Salmaso. Alguns compassos a levam até onde José Pedro a aguarda. As cordas conduzem as vozes e preparam o fim.
A seguir, “As Pombas” (José Afonso e Luis Oliveira de Andrade). O piano é exuberante. A ele se junta o cello. Com acordes, o piano abre espaço para José Pedro cantar acompanhado pelas cordas. A flauta indica o caminho por onde vão cantor e cantora, e os arranjos seguem compondo a moldura que protege as músicas.
Repertório apaixonante. Os aplausos vêm caudalosos. Impossível não se emocionar – afinal, chorar é ter os olhos secos e aguá-los com lágrimas. A sequência de músicas belas e comovedoras é absoluta: “Valsinha” (Chico Buarque e Vinícius), “Canção de Embalar” (José Afonso). Meu Deus!
E daí, Salmaso canta... “A Casa” (Vinícius). Brejeira e faceira, vai de “Odeon” (Ernesto Nazareth e Vinícius), arrematando com “Pau de Arara” (Carlos Lyra e Vinícius).
O cantar luso-brasileiro nos leva a quebrar barreiras sentimentais: a chorar baixinho, cuidando para que não nos ouçam prantear a música solidária e bela.
Ouvir Vinícius e José Afonso é tê-los enredados às nossas veias. Ouvir Mônica Salmaso e José Pedro Gil, filhos de duas terras irmãs que, vez por outra, sofrem sob o jugo da iniquidade, é erguer o punho e saudar a vida com uma música tão libertária quanto o canto da cotovia.
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