Recebi um e-mail de um pai desesperado. Seu filho de 25 anos vive em jogos de computador, os amigos são virtuais e ele não sai de casa. Tem medo de resolver coisas simples do dia a dia, como fazer um depósito bancário, por exemplo, ou até mesmo um pagamento pela internet, não tem namorada... Formou-se em administração de empresa, via on line, e caiu em prantos por ter que ir à faculdade receber o diploma. Vendo o pranto do filho, ele resolveu me escrever.
Respondi um e-mail longo e, no final, pedi autorização para falar sobre seu caso sem identificação. Resolvi compartilhar com vocês, leitores, uma vez que a dor de um pode ser de vários. Algumas considerações:
O rapaz está com 25 anos e os pais nunca perceberam que as coisas não iam bem, nunca perceberam algo estranho? Somente quando ele desata a chorar na frente da família que percebem? Não é o comportamento dele que me assusta, e sim de uma família alheia aos seus membros. Acredito que a pandemia tem mostrado quem somos.
A impressão que passa é que se o filho passa de ano e chega ao final do curso superior, está tudo bem. Fico impressionado quando famílias preferem seus filhos trancados em casa, em seus quartos, do que vivendo uma vida real nas ruas. Assim como não entendo o discurso "do respeito ao espaço de meu filho". Sim, a privacidade dele tem que ser preservada. Mas ele não pode se isolar da vida, da relação com as pessoas.
Quando questionei sobre amigos, os pais relataram que eles ouvem risos, conversas vindas de dentro do quarto. Mas que ele nunca recebeu ninguém em casa. E desconhecem se ele vai à casa de algum amigo ou a algum encontro. Frequenta festas familiares, mas está sempre ligado na Internet.
Pedi autorização e liguei para o rapaz. Prontamente atendeu e pediu que conversássemos por WhatsApp, porque ele não gosta de falar pelo celular. Teclamos e ficou claro que ele tem uma vida sexual ativa pelo computador. Com homens, mulheres e em grupo. Relata não sentir falta de contato de pele. E, inclusive, acredita que se sentiria muito nervoso se houvesse algum encontro. Acredita que não sabe como fazer, como agradar no sexo. Para ele, se é homem ou mulher não importa, uma vez que a brincadeira, a estimulação erótica é o que interessa para a masturbação. Disse que já apaixonou-se pela internet, mas como a menina morava em outro país tudo ficou só no virtual.
Percebi que esse rapaz vive em um mundo de fantasia, virtual mesmo. Para ele, não há preocupação com dinheiro, sobrevivência, futuro. Vive só a emoção que o jogo ou as redes sociais promovem, e se diz satisfeito com a vida que tem. Questionei sobre a possibilidade dos pais falecerem. Você viverá de quê? perguntei. Respondeu que está procurando algo na Internet para ganhar "algum" e que não precisa de muito dinheiro para viver.
Não deixou claro nenhuma angustia em viver, somente o fato de ter que enfrentar o mundo social físico.Sente que não sabe falar, diz que aparece uma ansiedade muito grande que o incapacita de prosseguir. Que é feliz onde está e que acredita que goza de prazer sexual mais do que qualquer jovem de sua idade. Não tem preconceito, todo prazer é bem-vindo.
Um jovem que vive preso dentro do quarto, mas sentindo-se livre por estar em todos os lugares do mundo para satisfazer todos os seus prazeres. Há que se pensar.
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