Herdeiros sucedem aos falecidos em relação ao patrimônio herdado, de acordo com o artigo 1.784 do Código Civil. Porém, é importante expor que esse procedimento de transferência de bens não se materializa automaticamente. Na prática, deve-se instaurar um processo de inventário depois do falecimento do autor da herança.
Por meio desse processo, os bens, direitos e deveres deixados pela pessoa falecida são apurados para pagamento de dívidas eventualmente deixadas por ela e, existindo valor residual, partilha entre os herdeiros.
Isto é, caso o valor dos bens deixados não seja suficiente para saldar as dívidas da pessoa falecida, não haverá partilha, os eventuais credores não receberão os respectivos créditos, e os herdeiros não arcarão com os próprios recursos para quitar débito de quem faleceu endividado.
Com a leitura acima, uma pessoa leiga pode chegar à conclusão sobre processo de inventário deve ocorrer judicialmente, respeitando-se as etapas do devido processo legal, sujeito à demora das decisões judiciais quando comparadas ao tempo das resoluções fora do Judiciário.
No entanto, o legislador também previu situações para que o processo de inventário pudesse ser iniciado e finalizado extrajudicialmente no Cartório de Notas, ou seja, sem a necessidade de sentença judicial, desde que cumpridos os requisitos a seguir: presença de advogado compartilhado entre herdeiros ou próprio de cada um, consenso entre todos os herdeiros e ausência de herdeiros menores de idade e incapazes (artigo 610, parágrafos 1º e 2º, do Código de Processo Civil):
Na prática, restou ao entendimento dos Tribunais a flexibilização das exigências, como no recente julgamento do AgInt nos EDcl no AREsp 2.460.192/RN, em 20/05/2024, no qual o relator ministro Marco Aurélio Bellizze, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), entendeu cabível o inventário extrajudicial, “ainda que exista testamento, se os interessados forem capazes e concordes e estiverem assistidos por advogado, desde que o testamento tenha sido previamente registrado judicialmente ou haja a expressa autorização do juízo competente”.
Entretanto, esses requisitos não são mais indispensáveis, conforme a alteração promovida pela Resolução 571/2024 na Resolução 35/2007 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que prevê a possibilidade de inventário extrajudicial em casos que envolvam menores de idade e incapazes, desde que ele receba parte ideal em cada um dos bens inventariados e haja manifestação favorável do Ministério Público (artigo 12-A), e a existência de testamento, observando-se as ressalvas do artigo 12-B:
- Os interessados estejam todos representados por advogado devidamente habilitado;
- Exista expressa autorização do juízo sucessório competente em ação de abertura e cumprimento de testamento válido e eficaz, em sentença transitada em julgado;
- Todos os interessados sejam capazes e concordes;
- No caso de haver interessados menores ou incapazes, sejam também observadas as exigências do art. 12-A da Resolução;
- Nos casos de testamento invalidado, revogado, rompido ou caduco, a invalidade ou ineficácia tenha sido reconhecida por sentença judicial transitada em julgado na ação de abertura e cumprimento de testamento; e
- Deve ser apresentada, junto com o pedido, a certidão do testamento e, constatada a existência de disposição reconhecendo filho ou qualquer outra declaração irrevogável, a lavratura de escritura pública de inventário e partilha ficará vedada e o inventário deverá ser feito obrigatoriamente pela via judicial.
No dia a dia, o interessado possui a faculdade de optar pela via judicial ou extrajudicial, com qualquer tabelião de notas (artigo 1°), “podendo ser solicitada, a qualquer momento, a suspensão, pelo prazo de 30 dias, ou a desistência da via judicial, para promoção da via extrajudicial” (artigo 2°) e há dispensa da homologação judicial (artigo 3°).
Outra inovação que merece destaque é a autorização ao inventariante, através de escritura pública, para alienar móveis e imóveis de propriedade do espólio, independentemente de permissão judicial (artigo 11-A).
O artigo 26 ainda expõe que, “havendo um só herdeiro com direito à totalidade da herança, não haverá partilha, lavrando-se a escritura de inventário e adjudicação dos bens, respeitadas as disposições do art. 12-A quando se tratar de herdeiro menor ou incapaz”.
Diante da dúvida quanto ao cabimento da escritura de inventário e partilha consensual, porém, o tabelião deverá suscitá-la ao juízo competente em matéria de registros públicos, ou seja, o processo de inventário judicial será obrigatório quando, no cartório, não estiver tudo esclarecido em relação ao testamento, à capacidade do interessado ou à declaração de vontade com indício de fraude ou simulação, por exemplo (artigo 32, §2º).
Os principais pontos positivos do inventário extrajudicial são: (i) a rapidez para conclusão do processo; (ii) a economia no comparatio com os custos ao inventário judicial; (iii) a redução da burocracia pela simplificação das etapas; e (iv) a autonomia para os interessados estabelecerem a forma de divisão dos bens em conformidade com a própria vontade.
A partir de tudo que foi exposto, o inventário pode ser um procedimento mais rápido e menos doloroso se houver o estudo correto do caso com profissional especializado que possa direcionar a melhor solução possível.
Por fim, cabe ressaltar que o inventário por si só não transmite a propriedade. O inventário é o procedimento que precisa ser registrado no Cartório de Imóveis e demais órgãos responsáveis pela gestão do imóvel.
Não adianta apenas realizar o inventário e guardá-lo na gaveta (seja sentença, seja escritura). Também se deve realizar a finalização da regularização para que os herdeiros possam administrar o imóvel em sua totalidade e conseguir efetuar até mesmo a venda.
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