Em junho de 2022, um texto escrito nesta coluna relatou que a Federação de Futebol do Estado do Espírito Santo (FES) aguardava apenas um documento para iniciar investigação na partida entre Rio Branco e CTE, válida pela 6ª rodada da Copa Espírito Santo. Na ocasião, o jogo terminou com vitória capa-preta por 4 a 0 em um jogo marcado por lances bizarros (veja o vídeo acima), que levantaram a suspeita que jogadores do time colatinense pudessem estar envolvidos com apostas esportivas e por isso facilitaram a vida do Rio Branco no confronto.
Na noite desta terça-feira (4), dez meses depois, nove jogadores do CTE/Colatina serão julgados no Tribunal de Justiça Desportiva (TJD-ES) por suposto envolvimento em apostas esportivas. Esse é só mais um caso entre dezenas que pipocam diariamente pelo Brasil. Isso quando há elementos suficientes para levar a ocorrência à justiça, o que nem sempre é possível.
Trata-se de um efeito colateral da avassaladora entrada das casas de apostas esportivas no futebol. Na esteira do que acontece nos grandes campeonatos pelo mundo, o mercado da bola nacional abriu portas para receber o dinheiro dos grandes sites de apostas. Em 2022, todos os times que disputaram a Série A do Campeonato Brasileiro eram patrocinados por site de apostas. No Paulistão deste ano, 81% dos clubes firmaram ao menos alguma parceria com um site da categoria. A Copa do Brasil, competição com a maior premiação financeira do país, tem como patrocínio master uma casa de aposta, que inclusive dá nome ao torneio.
Mas na mesma medida em que campeonatos e clubes lucram com os patrocínios, o futebol brasileiro, recheado de competições de pequeno porte, se torna um terreno fértil para esquemas e manipulação de resultados. Com os olhos da maioria dos torcedores e da mídia especializada voltados para os grandes clubes e para as principais competições do Brasil e da América do Sul, é desenvolvida uma imagem que distorce a realidade do futebol nacional.
Nem todos os jogadores têm acesso à estrutura e salários oferecidos no padrão da Série A do Campeonato Brasileiro ou chegam perto de disputar as grandes competições. Um estudo realizado em 2021, que reuniu dados da CBF e da Statista e Ernst & Young revelou que dos mais de 7 mil jogadores de futebol profissional registrados no Brasil, 55% recebem salário de R$ 1.100,00 (mil e cem reais). Entre os atletas que ganham até R$ 5.000 o porcentual cai para 33%, e 12% têm remuneração superior a R$ 5.001.
Dentro deste cenário, não é difícil perceber que jogadores de centros menores são mais suscetíveis ao envolvimento em apostas. Em alguns clubes, os atletas ganham muito pouco, isso quando recebem. Se tornam alvos fáceis para grandes apostadores. Em 2022, além deste caso no Espírito Santo que será levado a julgamento, outros registros de esquemas foram apontados no Amazonas, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul.
Mas os casos de possíveis manipulações não são exclusividade das ligas menores. Em fevereiro deste ano, o Ministério Público de Goiás deflagrou a Operação Penalidade Máxima, que apontou manipulação de resultados na Série B do Campeonato Brasileiro 2022, o que prova que é um problema sintomático no Brasil.
Hoje o futebol brasileiro vive a encruzilhada de se beneficiar dos recursos de um mercado que movimenta e fatura bilhões, mas também ter que fechar os olhos para a falta de regularização e falta de carga tributária de um negócio que ainda oferece a chande de criação de esquemas e manipulação de resultados. Um problema gigante para o esporte no país.
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