Em nós, há uma síntese de referências do bem e do mal. Sim, ambos, cada um com seu novo par já abundantemente forjados de pretérito - se leem, se creem, se traduzem. Quer dizer... o novo marido e a nova mulher se predispõem a se verem a partir das suas próprias raízes, sejam boas ou de amarguras e agonias cristalizadas; todas herdadas dos vínculos anteriores.
O xis da questão não é o hoje e nem o amanhã, mas exatamente o passado. No atual relacionamento, se reerguem os traumas das outras relações, as inseguranças, os pensamentos de desconfiança e perseguição, os temores, os desencaixes, distrofias sentimentais, machucaduras, projeções e as confusões de percepções do real, como herdeiras das des-ilusões... Conjunções das relações dormentes antes vividas, resultando em separações advindas do pouco e furtados acordos, incapazes concertos, inábeis diálogos...
Pode acontecer de se ter que separar do cônjuge anterior por não suportar mais alguns ‘modus operandis’ do cotidiano, dado na simples inafetividade. Não se aguentou mais a indiferença, a frieza, a hostilidade, a dureza de coração, as infantilidades, as brutalidades revestidas de gestual sutil, as ricas malvadezas narcísicas, as mostras de desamor, mas apego na instituição do estar junto.
Todavia, ainda assim, muitos não percebem o quão impactados foram pela “forma relacional” que repudiavam e em razão da qual deixaram o vínculo anterior. Viver meia vida ou anos com alguém, mesmo que não se goste ou mesmo que seja com o inimigo, como é o caso de muitos pares, indiscutivelmente nos mancha.
Assim, as sombras do que se viveu no passado chegam como assombrações e tormentos dissimulados da necessidade moral e até do dever de: “dessa vez tenho que ser feliz”. Logo, como profecia proferida, tudo aquilo que tanto se temia acontece e se realiza.
Tudo que resulta de trauma e de dor - não tratados - cria sintoma, vira reação, se transforma em respostas e comportamentos e tem o poder de fazer “brotar” justamente e apenas o que mais temíamos!
Cônjuges que viveram - objetiva ou subjetivamente desfavorecidos ou infelizes - tendem a “messianizar a nova relação”, para sua própria desgraça. O novo amor como redentor da vida! Saibamos a partir do profundo da casuística mais crua: nenhuma nova relação é capaz de nos expiar, nos livrar e nos desatar do passado, a menos e tão somente se o que foi vivido anteriormente já esteja resolvido em nossa consciência! E entendendo o passado como parte operante da nossa alma, corpo e mente!
A consciência sarada faz cessar com comparações e medidas e expectativas equivocadas e translocadas do novo cônjuge, deste novo relacionamento que pode - caso não seja contaminado - se resumir no cessar da busca das almas que tanto almejaram ser vinculadas ao mais profundo dos sentimentos e sensações: o tocante pertencimento recíproco da alegria inexplicável e contagiante do encontro com o amor.
A solução, sem sonhos e idealizações, é ter claro que, mesmo em pleno amor, não será simples assimilar e conviver com uma nova pessoa, com sua personalidade, carga nos ombros, filhos, patrimônios fragmentados, marcações em páginas e aparições em fotos antigas.
Mas é importante estabelecer, com intenções esperançosas, uma nova jornada de experimentações, adaptações, conciliações e, sobretudo, na edificação de uma nova cultura conjugal. Uma nova relação que deve ser não a somatória das dores de ambos, mas uma proposta inovadora, que só será possível se ambos concordarem que o passado não pode mais servir de referência para os próximos passos. É hora do inaugurar de uma vereda que inclua estratégias de investimento e esquemas de desenvolvimento emocional que cultive a prontidão em saúde existencial, integridade, felicidade e onde se faça prosperar a nova aliança que na maturidade receberam como galardão por perdoarem a si e aos que por sua vida passaram.
Sim, só encontram o amor os que exercem de abnegação para com as próprias marcas do ser e se obstinam a reinventar o encontro, na aliança com fé, posto que os que amam creem no amor, num amor como semente do fruto do bem!
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