A Itália é o exemplo mais próximo de como os grupos que se organizam para saquear os cofres públicos reagem às iniciativas que visam combatê-los. Lá, a “Operação Mãos Limpas”, entre 1992 e 1994, expediu 3 mil mandados de prisão e investigou mais de 6 mil pessoas, entre empresários, parlamentares e administradores locais. Investigou e condenou o mais alto escalão da política e do empresariado envolvido em corrupção.
O “establishment” italiano reagiu com o parlamento gestando leis para proteger a classe política e criar obstáculos às investigações, enquanto campanhas eram movidas tentando desmoralizar os procuradores que estavam à frente da operação. Eram acusações de corrupção passiva, nunca comprovadas, divulgação de dossiês anônimos e falsos, denúncias de desrespeito à Constituição e ameaças de morte.
No final de 1994 a “Operação Mãos Limpas” chegou ao fim tendo sido escolhido como primeiro ministro um dos empresários mais investigados por ela, Silvio Berlusconi. A Transparência Internacional, em 2019, colocou a Itália em 59º lugar no ranking dos países menos corruptos, uma posição um pouco melhor – mas, mesmo assim, muito ruim – que a de 2014 (70ª), sendo que quanto mais perto do 1º lugar, menos corrupto é o país.
Qualquer semelhança da “Mãos Limpas” com a nossa “Lava Jato” não é uma simples coincidência. Só que, no Brasil, o ponta de lança da reação, além do parlamento – onde o pacote anticrime do ministro Sergio Moro está sendo devidamente transfigurado – é o Supremo Tribunal Federal.
O STF, que já havia retirado as investigações sobre caixa 2 da Justiça Federal passando-as para a Justiça Eleitoral – onde as punições geralmente se restringem a questões ligadas a elegibilidade –, agora caminha para suspender os inquéritos em que houve compartilhamento de dados do antigo Coaf, o Conselho de Controle de Atividades Financeiras.
Esta nova decisão – se de fato for concretizada no final da votação no plenário iniciada quarta-feira, 20 – atinge o coração do sistema de prevenção de crimes financeiros porque condiciona o compartilhamento de dados das movimentações financeiras ao Ministério Público à prévia autorização judicial. Isto contraria as convenções internacionais assinadas pelo Brasil e adotadas pelos países que se situam na linha de frente do combate aos crimes financeiros.
Este vídeo pode te interessar
O STF é, hoje, a vanguarda da reação contra a Lava Jato. Como se não bastasse ter aberto a porta das prisões para os criminosos condenados em segunda instância e que agora podem recorrer de suas penas aguardando que a prescrição os livre da cadeia.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.