Há três anos, o país se mobilizou e dois milhões de eleitores assinaram o projeto que ficou conhecido como as “dez medidas contra a corrupção”. Na época, todas as pesquisas apontavam a corrupção como o maior problema do país.
> Associações criticam projeto que cria crime de abuso de autoridade
Após conferir as assinaturas, a Câmara dos Deputados modificou profundamente o projeto ao incluir a punição de abuso de autoridade de magistrados e integrantes do MP. Ou seja, ao invés de endurecer a legislação contra os corruptos, o projeto passou a prever punição para os investigadores e julgadores.
O projeto chegou ao Senado em abril de 2017 e lá ficou dormindo até agora. Mas de repente ele ressurgiu na pauta e foi aprovado quase que de surpresa no plenário no último dia 26. Em decorrência das mudanças feitas no Senado, o projeto agora retorna à Câmara. A punição para o abuso de autoridade foi mantida mesmo sabendo-se que ela desvirtua o propósito original da mobilização popular.
A pena para juízes e procuradores é de seis meses a dois anos de detenção. Há restrições também para juízes que façam comentários públicos sobre processos em andamento.
Ficou evidente, na decisão dos parlamentares, o propósito de enfraquecer a Lava Jato. Como disse um procurador, o investigado poderá investigar e acusar o próprio investigador. Em outras palavras, ao invés de avançar na luta contra a corrupção, as “dez medidas” viraram um retrocesso. Um senador resumiu bem a questão: o que era a prioridade da população – o endurecimento da legislação contra o crime – acabou se transformando em uma limitação à capacidade de agir de investigadores e julgadores.
Junte-se a decisão do Senado com outras medidas já tomadas pelo Congresso, Justiça e por grupos punidos ou investigados, é possível ver com nitidez o contra-ataque que se avoluma contra a Lava Jato: a insistência de alguns desembargadores do Supremo de impedir a prisão dos condenados em segunda instância, a decisão do mesmo Supremo de enviar para a Justiça Eleitoral os processos de corrupção de caixa 2, e a leniência com que o Congresso aprecia o pacote anticrime proposto pelo ministro Moro. Sem falar nos grupos – até hoje não revelados – que financiaram os hackers que invadiram os telefones e sistemas de trocas de mensagem de autoridades.
Na Itália, a Operação Mãos Limpas – que condenou 1,3 mil pessoas e recuperou centenas de bilhões de euros que haviam sido desviados dos cofres públicos entre 1992 e 1996 – terminou com o grupo de magistrados e investigadores que a promoveu sendo ameaçado de morte e vítima de complôs e dossiês. Espera-se que o mesmo não aconteça com os mentores da Lava Jato.
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