Foi preciso que Brasília ficasse encoberta pela fumaça das queimadas e São Paulo fosse declarada como a metrópole com pior qualidade do ar do mundo para que o governo federal começasse a despertar para a realidade de que algo deveria ser feito para conter as consequências da seca, da estiagem e das queimadas que castigam 60% do território nacional.
É bem verdade que o governo ainda não sabe o que fazer, já que não detalhou as medidas concretas que poderiam conter a escalada da catástrofe, mas pelo menos o presidente da República levou ministros e auxiliares ao Amazonas e chamou a situação de “crise”. É pouco, mas já é alguma coisa.
Melhor seria, entretanto, se aceitasse o conselho da pesquisadora Luciana Gatti, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), e decretasse estado de emergência climática no Brasil inteiro, proibisse qualquer desmatamento e implementasse, com urgência, grandes projetos de reflorestamento, ou seja, adotasse um plano emergencial para a sobrevivência da população nessa situação de crise.
Afinal de contas, até 9 de setembro o país já contabilizava 159 mil focos de incêndio, mais do que o dobro das ocorrências de 2023, com a fumaça das queimadas alcançando a maior parte do país e a seca ameaçando a sobrevivência dos maiores rios, como o Madeira e o Paraguai.
Embora o Espírito Santo não esteja no epicentro das queimadas – que se situa na Amazônia e no cerrado – o governo do Estado foi mais rápido nas providências. Diante dos 425 focos de incêndio registrados até 9 de setembro (122% mais numerosos que os do ano passado) e 90 dias sem o registro de chuva significativa, decretou “situação de emergência” no Estado e cogita instituir um cronograma de restrição ao uso da água nos chamados grandes setores já na próxima semana.
O Estado também vem sofrendo com a grande quantidade de fumaça dos incêndios da Amazônia e com as consequências do longo período de estiagem retratada na redução do volume das águas dos rios Doce e São Mateus e nas queimadas de grandes proporções como a que destrói, há três semanas, o Parque Estadual Mata das Flores, em Castelo.
A situação ambiental brasileira é dramática. A IQAir, plataforma suíça de monitoramento do ar, identificou que a Amazônia Ocidental se tornou a região mais poluída do mundo. Os incêndios florestais das últimas semanas intensificaram a emissão de poluentes, fazendo com que a concentração de material particulado no Brasil ultrapassasse a de países historicamente campeões da poluição como Índia, Paquistão e China.
Porto Velho, em Rondônia, registrou em agosto poluição 4 vezes maior que no mesmo mês em 2023 e, no dia 5, níveis de poluentes 36 vezes maiores que os recomendados pela Organização Mundial de Saúde. Rio Branco, no Acre, foi classificada, no dia 4, como a cidade mais poluída do Brasil. Na Chapada dos Guimarães, Mato Grosso, um encontro de ministros da agricultura do G20 sobre agronegócio sustentável foi realizado sob densa fumaça. Os habitantes do Rio Grande do Sul ficaram horrorizados com a chuva escura que caiu sobre o Estado na terça-feira.
Quando se sabe que o Brasil enfrenta a maior seca das últimas sete décadas, que 1/3 dos municípios brasileiros está em regime de “seca severa” (segundo o Cemaden, Centro Nacional de Monitoramento de Desastres Naturais) e 1.080 cidades já decretaram que estão em “situação de emergência”, a conclusão a que se chega é que não é admissível que o governo federal fique inerte no combate aos incêndios que dizimam a maior reserva florestal do planeta.
Espera-se que, pelo menos, o presidente da República anuncie medidas emergenciais concretas de combate aos efeitos das queimadas e que dê partida a um plano de curto prazo que contemple minimamente o reforço da fiscalização, o incentivo à agricultura sustentável e, se for preciso, busque a cooperação internacional para minimizar os efeitos da catástrofe ambiental que incendeia o país.
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