É empresário do setor imobiliário, membro do Conselho Superior da Ademi-ES, mestre em Change pelo Insead (França), professor convidado pela Fundação Dom Cabral e 24º brasileiro a atingir o cume do Everest.

Favela 3D: "O contrário de pobreza é dignidade"

Quando o terceiro setor, a iniciativa privada e o poder público se unem em um bom projeto, grandes transformações são possíveis, até mesmo, quem sabe, sonhar em acabar com a pobreza no nosso país

Vitória
Publicado em 08/03/2023 às 01h59
O Brasil possui 14 mil favelas. Destas, 80% possuem até 700 habitações
O Brasil possui 14 mil favelas. Destas, 80% possuem até 700 habitações. Crédito: Shutterstock

Recentemente, o Insead Alumini Association Brazil, associação de ex-alunos brasileiros do Insead, uma das principais escolas de negócios do mundo, teve como convidado em um de seus eventos Edu Lyra, fundador da ONG social Gerando Falcões.

Em determinado momento, Lyra perguntou quantos ali presentes já haviam visitado uma favela e, em um público majoritariamente composto de empresários e executivos, poucos levantaram a mão. Surgiu, assim, o convite para conhecer “in loco” o projeto Favela 3D. Ciceroneados por Lyra, um grupo de aproximadamente 30 pessoas passou toda uma manhã e tarde em uma favela na zona leste de São Paulo, um dos lugares mais pobres da capital paulista, onde este projeto está sendo implementado.

Lyra e seu time são ousados nos seus objetivos de dar uma resposta definitiva à pobreza: ”se o Elon Musk chegar a Marte antes da gente acabar com a pobreza no Brasil, está tudo errado”, diz ele com um entusiasmo contagiante. Todavia, ele tem plena consciência de que isto somente é possível através da escalabilidade de um modelo ao mesmo tempo simples e adaptável às diversas realidades: “assim como ocorre nas empresas de vocês, sair da pobreza não é força, é estratégia”.

Este é o Favela 3D: Digna – Digital – Desenvolvida, cujo projeto-piloto, hoje, está rodando em quatro favelas, duas em São Paulo, uma no Rio e uma em Maceió.

Digna

“O contrário de pobreza não é riqueza, é dignidade”, diz Edu Lyra. Resgatar a dignidade das pessoas é o objetivo fim do Favela 3D. Para isso, é feito um diagnóstico minucioso da situação de cada família, respeitando suas particularidades.

Foi desenvolvida uma ferramenta de diagnóstico em parceria com uma empresa israelense que classifica as famílias em cinco categorias:

  • 1. Pobreza extrema
  • 2. Pobreza
  • 3. Dignidade
  • 4. Prosperidade em desenvolvimento
  • 5. Quebra do ciclo de pobreza

Até a fase 3, ou seja, o estágio da dignidade, há a necessidade de intervenção mais direta. Uma vez atingindo-o, as fases 4 e 5 dependem especialmente da ação individual de cada família.

A partir do diagnóstico, são definidas as etapas da trilha a serem cumpridas. A trilha é o caminho que cada família percorrerá para avançar nas fases identificadas pelo diagnóstico. Composta de 8 passos, cada um deles é definido juntamente com a família: ouví-los e respeitá-los é a chave. Não há imposição e sim envolvimento e conscientização. Os 8 passos da trilha são:

  • 1. Moradia digna e urbanismo social
  • 2. Acesso à saúde
  • 3. Cidadania e cultura de paz
  • 4. Direito à educação
  • 5. Autonomia da mulher
  • 6. Cultura, lazer e esporte
  • 7. Geração de renda

Um primeiro passo no resgate da dignidade da favela visitada deu-se com uma ação simples, a mudança do seu nome. Antes conhecida por Boca de Sapo, foi rebatizada, após uma votação entre os seus moradores, de Favela dos Sonhos. Simples, mas bastante simbólico para a reconquista da autoestima das pessoas que lá vivem, afinal, você prefere morar na Boca do Sapo ou na Favela dos Sonhos?

Digital

A tecnologia social é a principal ferramenta do projeto, que já nasce digital, trazendo novas formas de resolver problemas antigos. Hoje, toda a favela possui wi-fi aberto e cada casa, inexistente no cadastro de código postal, possui agora um CEP digital, ação que foi desenvolvida em parceria com o Google. Cada morador pode, por exemplo, receber uma encomenda pelo correio e também ter um endereço de envio. Estas pessoas foram, finalmente, inseridas no comércio digital.

Desenvolvida

O Brasil possui 14 mil favelas. Destas, 80% possuem até 700 habitações. Este é o foco do projeto, mudar a vida dos moradores das favelas médias e pequenas. Para se ter uma ideia, quando o Favela 3D foi implementado na Favela dos Sonhos, há quase dois anos, a taxa de desemprego chegava a 70%. Hoje, 98% dos seus moradores estão inseridos no mercado de trabalho e 80% passaram por algum processo de qualificação. Mais: 80% dos espaços foram revitalizados e 87% das moradias foram transformadas. Todas as iniciativas que levaram a este resultado envolvem parcerias com empresas privadas.

Já com a prefeitura, foi realizada a regularização fundiária. O que antes era ocupação irregular virou patrimônio familiar.

Caminhando por suas vielas, a favela continua sendo uma favela, mas os sinais de mudança são visíveis. Da porta para fora há mais cor, há mais jardins, há mais cuidado em todos os detalhes. Mas a maior transformação está nas pessoas. Uma delas, a Poliana, deu um depoimento marcante: “Quando eu cheguei aqui, há alguns anos, achei que era o meu fim, mas era o meu começo. No dia que eu fui entrevistada para o Programa Decolar do Favela 3D, me perguntaram o que eu almejava para minha vida. Minha resposta foi: nada não. Eu não sei sonhar. Hoje eu voltei a estudar, meu marido também e meus filhos estão na escola. Além disso, trabalho como voluntária no Projeto. Estou subindo degrau a degrau”.

Como disse Lyra, não existe fast food social. É passo a passo. O que nós vimos e ouvimos impactou-nos profundamente e reacendeu em nós uma fagulha de esperança. Quando o terceiro setor, a iniciativa privada e o poder público se unem em um bom projeto, grandes transformações são possíveis, até mesmo, quem sabe, sonhar em acabar com a pobreza no nosso país.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

A Gazeta integra o

Saiba mais

Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.

Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.

A Gazeta deseja enviar alertas sobre as principais notícias do Espirito Santo.