É empresário do setor imobiliário, membro do Conselho Superior da Ademi-ES, mestre em Change pelo Insead (França), professor convidado pela Fundação Dom Cabral e 24º brasileiro a atingir o cume do Everest.

Um ano do Cidade Matarazzo: as lições do empreendedor

Em pleno coração de São Paulo, este é o projeto de requalificação urbana privado mais relevante do país, integrando Mata Atlântica a torres ultramodernas e construções centenárias

Vitória
Publicado em 25/01/2023 às 01h58
Atualizado em 25/01/2023 às 01h58
Cidade Matarazzo
Projeto está localizado em um terreno com mais de 30 mil metros quadrados, a poucos metros da avenida Paulista. Crédito: Cidade Matarazzo/Divulgação

Neste mês de janeiro completa um ano da inauguração da primeira etapa do projeto urbano-imobiliário Cidade Matarazzo, em São Paulo. Plantado em um terreno de mais de 30 mil m², em pleno coração da cidade, a poucos metros da avenida Paulista, o Cidade Matarazzo é o mais relevante projeto de requalificação urbana privado do país, integrando um dos últimos resquícios de Mata Atlântica da região central a torres ultra-modernas e construções centenárias, como o Hospital Matarazzo, a Maternidade Condessa Filomena Matarazzo, onde nasceram mais de 500 mil paulistanos e a Capela Santa Luzia.

Embora tombadas pelo município devido ao seu valor histórico e cultural, estas edificações encontravam-se abandonadas e degradadas desde 1993 até serem adquiridas pelo Groupe Allard, em 2008. O arrojado projeto contemplou novos usos para estes prédios: a maternidade foi convertida em um hotel seis estrelas da rede Rosewood, a capela voltou a receber missas e casamentos e os pavilhões do antigo hospital abrigarão um centro comercial com lojas de mais de 300 marcas de luxo, incluindo diversas internacionais exclusivas.

Quando em funcionamento integral, o Complexo ainda contará com um campus de escritórios, boulevares, 34 restaurantes, espaço cultural para exposições artísticas, cinema, casa de espetáculos para 1500 pessoas e vagas para 2200 veículos. Toda esta cidade-dentro-da-cidade gerou 15.000 empregos diretos e indiretos e demandou investimentos da ordem de R$ 2 bilhões.

É um empreendimento superlativo em todos os aspectos, o tamanho, a ousadia do projeto, o investimento, mas, especialmente, a ambição e a coragem do seu idealizador, o francês Alexandre Allard.

Considerando que foi o espírito empreendedor na sua mais pura essência de Allard que fez com que o Cidade Matarazzo se tornasse realidade, destacamos quatro lições que podemos nos inspirar, aprender ou resgatar:

1 - Pratique um “olhar estrangeiro” para enxergar oportunidades

Quando Allard adquiriu o Complexo Matarazzo, este já estava à venda há quase uma década. Além da degradação dos prédios e da obrigatoriedade de mantê-los de pé, devido ao tombamento, sua própria localização, no bairro Bela Vista, era tida como decadente. Os áureos tempos da avenida Paulista haviam ficado para trás.

Considerando que dinheiro, seja ele brasileiro, francês ou nepalês, não aceita desaforo, o que Allard viu que outros não viram?

Tive a oportunidade de conversar com ele alguns anos atrás, quando perguntei por que, podendo investir em qualquer lugar do mundo, ele escolheu o Brasil, país complexo, com uma burocracia gigantesca, uma legislação tributária caótica e com grandes problemas sociais. Esperava uma resposta baseada em argumentos econômicos, mas sua argumentação foi muito além, analisando o Brasil segundo um contexto geopolítico mundial.

Allard acredita que os principais problemas da humanidade são, e serão cada vez mais, a escassez de água, os recursos energéticos insuficientes e as questões de fronteira e raça. Para ele, o Brasil não tem problemas vitais em nenhuma destas áreas, ao menos se comparado com a realidade de outros países.

Seus olhos não estavam apenas no bairro ou na cidade, estavam voltados para um Brasil futuro e, o que ele enxergava, com este olhar estrangeiro, era uma terra de oportunidades. Às vezes, as lutas que enfrentamos para empreender no Brasil nos deixam com a visão turva diante das oportunidades.

Allard enxergou todas as dificuldades que os outros empreendedores enxergaram, mas, por seu “olhar estrangeiro” não estar contaminado, permitiu-se ir um pouco além.

2 - Junte os melhores, compartilhe sua visão e deixe-os trabalhar

O time que Allard trouxe para o Cidade Matarazzo contemplava nada menos que os melhores profissionais em suas áreas. Os arquitetos Jean Nouvel e Rudy Riccioty, o designer de interiores Philippe Starck e os artistas irmãos Campana foram alguns.

Todos eles destacam como foram seduzidos pela visão de Allard: promover a revitalização da cidade através de um projeto sustentável em todas as dimensões, social, ambiental, cultural e urbana. A valorização de elementos e materiais de origem brasileira e uma inédita transferência de competências são exemplos de como esta ideia se deu na prática.

Compartilhando da visão de Allard, todos tiveram total liberdade de criação.

3 - Integre as expectativas de curto e longo prazos

Nós, empresários, sabemos das agruras que é empreender no Brasil, onde, como bem disse Pedro Malan, até o passado é incerto. Todos os desafios econômicos, técnicos e jurídicos do Cidade Matarazzo foram estruturados no sentido de tornar o empreendimento viável no curto prazo e sustentável no longo prazo.

4 - Resgate a coragem de sonhar

A coragem de sonhar, matéria-prima do empreendedor, anda escassa nas nossas lideranças. É fato que a linha que separa a coragem da insensatez nos negócios é tênue, mas, para grandes realizações, é necessário navegá-la.

Philippe Starck se refere assim a Alexandre Allard: “Ele é uma personalidade de outro tempo, de outro mundo, de um universo com outras regras. Ele é da época dos grandes exploradores.”

Há ainda um caminho para Alexandre Allard mostrar-se o empreendedor visionário que destacamos aqui, afinal, a operação do Complexo está apenas no início. Mas um feito ele já conquistou, provocar em nós este “olhar estrangeiro”, que nos permite enxergar beleza e oportunidade no ordinário e fazer aquela pergunta essencial quando sonhamos grande: por que não?

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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