Garis que trabalham para a Prefeitura de Vila Velha, uniformizados, concentraram-se, ou foram concentrados, em uma área particular, um galpão, no início da manhã desta quinta-feira (29).
Lá, estavam o ex-secretário de Serviços Urbanos do município, o vereador Anadelso Pereira, que é candidato a deputado estadual; o vice-prefeito, Victor Linhalis, que disputa uma vaga na Câmara dos Deputados, e o prefeito Arnaldinho Borgo. Todos são filiados ao Podemos.
Arnaldinho apoia a eleição dos correligionários.
Um dos garis gravou, discretamente, um vídeo que mostra parte do discurso de Anadelso:
"Se vocês não tiver (sic) compromisso, esse prefeito aqui, ó, precisa desses dois homens. A aliança que deu certo no município foi essa aliança aqui: Anadelso, Doutor Victor e Arnaldinho", diz o vereador.
"Prefeito que desenvolveu a cidade, vocês vê (sic) as cinco regiões da nossa cidade têm obras e eles (Victor Linhalis e Arnaldinho) vão falar aqui um pouco. Domingo (dia 2, data da eleição) é um dia muito importante para nós", concluiu Anadelso.
Outro vídeo mostra os trabalhadores, muitos deles, caminhando em direção ao galpão. E há o relato de que foram levados até próximo ao local por um ônibus.
Nesta sexta (30), Anadelso confirmou à coluna que participou do ato, realizado, segundo ele, por volta das 6h da manhã em uma área particular.
"Pessoas, por maldade, fizeram o vídeo", avaliou o candidato.
"Levei meus projetos, falei por sete minutos. Os próprios trabalhadores me convidaram", alegou.
A coluna quis saber quem organizou o evento, afinal o galpão deve ter sido disponibilizado por alguém. Ele disse que "deve ter sido a empresa" que presta serviços de limpeza urbana à cidade.
O serviço de limpeza pública de Vila Velha é terceirizado. No uniforme dos trabalhadores é possível ler o nome Localix, que é a empresa detentora do contrato.
A Secretaria de Serviços Urbanos, outrora comandada por Anadelso, cuida, justamente, da limpeza pública.
Victor Linhalis, "o federal do Arnaldinho", como é apresentado na campanha eleitoral, falou com a coluna nesta sexta.
Ele também disse que foi convidado a ir ao local.
"Foi às 6h da manhã, fora do horário de trabalho, num galpão, não foi dentro da empresa. Pedi voto para quem não tinha candidato. Tiraram uma foto maldosa, como se a gente tivesse feito dentro da empresa, como se fosse um voto de cabresto, mas não tem nada disso", afirmou o vice-prefeito.
Questionado sobre de quem partiu o convite, ele disse não saber: "Marcaram na minha agenda, não sei quem, de fato, organizou isso".
A coluna tentou, por diversas vezes, contato com a Localix. É uma empresa que tem sede em Contagem (MG), com filial em Vila Velha. O telefone informado no site atribuído à filial não existe. Ao menos é o que se ouve ao telefonar.
Já o telefone da sede ninguém atendeu.
De acordo com Anadelso, o galpão onde ocorreu o encontro fica na região da Rodovia Darly Santos.
Arnaldinho Borgo
Prefeito de Vila Velha
"Quem convidou foram os próprios garis. Alguns apoiam o Anadelso, não foi coisa da empresa. Fomos lá pedir voto fora do horário de trabalho e em uma área particular"
A coluna falou também com a presidente do Sindicato das Trabalhadoras e Trabalhadores em empresas prestadoras de serviços de asseio, conservação, limpeza pública urbana e privada, conservação de áreas verdes, aterros sanitários e transbordo e de prestação de serviços em portarias e recepções no Estado do Espírito Santo (Sindilimpe – ES), Evani dos Santos Reis.
Ela, que trabalha em Vila Velha, disse que não foi convidada para o ato em que houve pedido de voto e, assim, não tem informações a respeito.
ABUSO DE PODER POLÍTICO
Um advogado eleitoralista consultado pela coluna, que preferiu não ser identificado, uma vez que pode vir a ser procurado pelos próprios candidatos aqui mencionados, avaliou que, em tese, o episódio pode configurar abuso de poder político, mas apenas se confirmados alguns requisitos.
"Eu entendo, embora alguns possam discordar de mim, que um candidato pode ser levado a uma empresa e o patrão deixar que os empregados ouçam as propostas dele, desde que isso não seja uma imposição aos funcionários", ponderou.
"Neste caso, como a empresa tem contrato com o beneficiário, a licitude é muito duvidosa", ressaltou o advogado.
"Se colocaram eles dentro de ônibus e eles chegaram lá sem saber do que se tratava, ou sem ter a opção de não ir, algo que poderia ser lícito passa a ser ilícito. Uma coisa é convite, outra é a compulsoriedade com que esses trabalhadores foram lá."
Uma notícia de ilícito eleitoral, uma denúncia anônima, já foi registrada na Procuradoria Regional Eleitoral apontando conduta vedada e abuso de poder político pelo uso da máquina pública em proveito da campanha de Victor Linhalis.
A denúncia sustenta que os trabalhadores foram levados ao local do ato em ônibus da prefeitura. Arnaldinho nega veementemente que isso tenha ocorrido.
"Isso é coisa de adversário político. Algo já normal nas eleições, em que adversários fazem calúnia e fake news. É desespero eleitoral do adversário", alfinetou o prefeito.
Se a Justiça Eleitoral entender que houve mesmo irregularidades, isso pode levar à inelegibilidade dos políticos envolvidos.
O Ministério Público Estadual também pode abrir um inquérito civil público para apurar se houve ato de improbidade administrativa, por utilização da máquina pública.
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