O ex-governador Paulo Hartung (sem partido) foi o entrevistado de segunda-feira (1º) no programa Roda Viva, da TV Cultura.
Lá, ele discorreu sobre temas da política nacional, divergiu das propostas do ex-presidente Lula (PT) e endossou o nome da senadora Simone Tebet (MDB-MS) à Presidência da República, mostrando que, a cerca de dois meses das eleições, continua apostando na terceira via, que patina nas intenções de voto, mas agora chama o campo de "centro expandido".
Também foi questionado sobre o risco à democracia no país.
Quanto a esse tópico, os entrevistadores lembraram da politização das Forças Armadas e das polícias e da fatídica greve da PM no Espírito Santo, em 2017, quando Hartung comandava o Executivo estadual.
Queriam saber se há risco, diante da bolsonarização das tropas, de participação de militares estaduais em tentativas de solapar a democracia, após incitação por parte do presidente da República, Jair Bolsonaro (PL).
O presidente aponta, infundadamente, fraude nas urnas antecipando o não reconhecimento do resultado das eleições deste ano, no caso de ser derrotado. Bolsonaro está atrás nas pesquisas de intenção de voto.
Para Hartung, as polícias podem ser controladas pelos governadores, o que retira o poder de barganha de Bolsonaro, mas alertou para o "flerte com a indisciplina" e criticou, como já fez em outras ocasiões, a anistia concedida pela Assembleia Legislativa e pelo governador Renato Casagrande (PSB) aos acusados de participação no movimento de 2017.
"É possível os governadores liderarem as suas polícias militares, até porque eles são os comandantes das polícias militares. Tem lei, tem regulamento, tem como fazer", afirmou.
"Agora, se flertar com a indisciplina, depois perde o controle da tropa. Se flertar por interesses políticos, eleitorais ... você está entendendo o que eu estou falando", complementou.
"Quando as Assembleias Legislativas legislam criando proteção a atos absolutamente ilegais (...) Crie corvos e eles furarão seus olhos", disparou.
"Controlamos, punimos. Importante dizer isso aqui, punimos. O meu sucessor depois anistiou, erradamente. É tiro no próprio pé", cravou o ex-governador.
A greve se deu em meio a reivindicações de reajuste salarial. "Precisa envolver a valorização dos policiais dentro de uma política pública", admitiu Hartung. "Agora, valorizar os profissionais da Segurança Pública não é tolerar, ser conivente com ilegalidade", ressaltou.
Quem concedeu reajuste aos policiais foi Casagrande, em mais um movimento político para se aproximar da tropa, após a anistia. Muitos militares, mesmo assim, no entanto, apoiam candidatos bolsonaristas no pleito e fazem coro a críticas ao governador.
Hartung ainda disse, no Roda Viva, que colheu resultados positivos com a queda no número de homicídios registrada em 2018. "Um ano depois do motim, foi a maior queda no número de homicídios da história do Espírito Santo", divulgou.
Ocorre que, em 2017, em meio à greve, houve uma explosão de assassinatos. Logo, em 2018, a queda foi expressiva, mas essa não é a melhor comparação. A taxa de homicídios de 2018 ficou bem próxima à registrada em 2016, por exemplo.
A greve da PM foi o momento mais grave do último mandato de Hartung e um dos mais sinistros de sua trajetória política.
Ainda sobre o possível não reconhecimento do resultado das eleições por parte de Bolsonaro, o ex-governador disse que a sociedade é que deve garantir que o pleito transcorra de maneira democrática.
"O que garante resultado de eleição é uma sociedade civil ativa. A 62 dias da eleição, estamos vendo a sociedade pedir passagem, colocar a cara na reta, gente que tem muito a perder assumindo posições está assumindo posições, isso é importante", respondeu.
"A sociedade mobilizada, as instituições dando conta do recado ... esse é o roteiro que eu vejo", avaliou. Hartung é um dos signatários da carta em defesa da democracia encampada pela USP.
LULA E TEBET
Quanto à corrida pela Presidência da República, ele criticou posicionamentos do ex-presidente Lula e considera que o nome mais próximo de fazer o que aponta como o necessário para o país é o de Tebet.
"Lula assumiu um caminho muito distante daquilo que eu vejo como necessário.
Respeito as posições, sou um democrata, mas divirjo. O país precisa de reformas. O setor público brasileiro ficou parado no tempo. Você não tem instrumento para valorizar um funcionário, promoção é todo mundo no mesmo dia, tenha você trabalhado duro ou mantido simplesmente a rotina de ir para o trabalho. Não precisa mexer na estabilidade, mas regulamentar o que está na Constituição, ter avaliação de desempenho", exemplificou.
"Precisamos fazer reforma tributária, precisamos trazer o capital privado com força para investimento em infraestrutura. Precisamos que as agências reguladoras sejam agências reguladoras e não cabide de emprego para quem perdeu a eleição. Esse programa não está sendo colocado", pontuou.
"O que está sendo discutido é pegar um retrovisor e olhar pra trás. As condições lá de trás (do primeiro governo Lula), uma herança bendita de Fernando Henrique Cardoso, as condições internacionais maravilhosas ... não é o que a gente está vendo hoje. Tem um contencioso empurrado para 2023 e o mundo está andando de lado", avaliou.
"Hoje quem esta mais próximo (de fazer o que o país precisa) é a Simone Tebet", disse Hartung, para em seguida fazer uma ponderação:
"Fiquei chateado dias atrás em ver a oposição votando na PEC Kamilaze (que permite a Bolsonaro burlar a lei eleitoral e conceder benesses na reta final do mandato) e a Simone votando também, achei um erro".
ELEIÇÕES NO ES
Há tempos Hartung fecha-se em copas quando o assunto é a disputa eleitoral no Espírito Santo. O nome dele chegou a ser especulado como possível candidato ao Senado este ano, pelo PSD, o que não se confirmou.
O ex-governador não declarou, até agora, apoio a nenhum dos postulantes ao Palácio Anchieta, apesar de aliados estarem na corrida: o ex-prefeito de Linhares Guerino Zanon (PSD), o ex-secretário da Fazenda de Vitória Aridelmo Teixeira (Novo) e o ex-prefeito da Serra Audifax Barcelos (Rede).
Hartung, em artigos publicados e entrevistas concedidas, tem se colocado como um conselheiro na política nacional.
E virou até uma espécie de guru de figuras públicas, como o apresentador de TV Luciano Huck, que ele segue avaliando como um bom nome para entrar na disputa por mandatos eletivos, ao qual falta apenas "o momento certo".
FIM DE UM CICLO, OU NÃO
Hartung chegou a ser sondado como possível candidato a presidente da República, também pelo PSD.
Ele agradeceu, na entrevista, a Gilberto Kassab, presidente nacional do partido, que o elogiou publicamente e o considerou um bom nome para concorrer ao Palácio do Planalto, mas afirmou que chegou ao fim de um ciclo.
"Eu achei que esse ciclo tinha chegado ao final em 2010. Eu era o governador mais bem avaliado do país e não disputei a eleição em 2010, tinha todo um empurrão para eu disputar o Senado, eu não fui. Não anunciei que estava saindo, fui para a iniciativa privada, fui ser conselheiro de empresas", rememorou.
Em 2010, estava tudo certo para Hartung concorrer ao Senado, deixando o vice, Ricardo Ferraço (PSDB), no comando do Executivo e apoiando-o para o governo.
Após uma reviravolta devido a costuras nacionais com o PSB, no entanto, Hartung rifou Ferraço e apoiou o socialista Renato Casagrande para o Palácio Anchieta. Coube a Ricardo disputar o Senado.
"Ainda bem que não anunciei (que deixaria de disputar mandatos eletivos), porque em 2014 tive uma recaída, acabei disputando o governo e foi ótima essa experiência de administrar debaixo de uma recessão econômica", complementou.
"Estou satisfeito com minha conclusão de ciclo de mandatos eletivos, não de participação política. Você vai me ver velhinho militando para melhorar o país.
Mandatos eletivos eu já exerci muitos (oito), acho que esse ciclo está bem vencido", avisou.
"A não ser que tenha outra recaída...", observou a âncora do programa, a jornalista Vera Magalhães.
Hartung riu.
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