A campanha eleitoral de 2022 chega ao fim – a votação, no primeiro turno, é neste domingo (2) – e, no Espírito Santo, foi marcada por alguns pontos. Discussão a respeito de quanto dinheiro há no caixa do governo do estado, se está sobrando ou não; o aumento da miséria e da fome entre a população e, lateralmente, a prestação de serviços nas áreas de segurança, saúde e educação.
Uma questão, entretanto, permeou tudo isso: um duelo, às vezes evidente, às vezes subliminar, de ideologias. Claro que, até certo ponto, isso é normal. Etimologicamente, ideologia significa "ciência das ideias".
"Ideologia é um conjunto lógico, sistemático e coerente de representações (idéias e valores) e de normas ou regras (de conduta) que indicam e prescrevem aos membros da sociedade o que devem pensar e como devem pensar, o que devem valorizar e como devem valorizar, o que devem sentir e como devem sentir", registra um artigo do Brasil Escola, que ajuda a traduzir as coisas para uma linguagem compreensível.
Assim, basicamente tudo está impregnado de ideologia. Mas falo aqui de estereótipos ideológicos.
Isso aconteceu, principalmente, quando a eleição local foi "nacionalizada", trazendo questões da disputa pela Presidência da República e da briga entre Jair Bolsonaro (PL) e Lula (PT) para o plano estadual.
Isso não impregnou todo o pleito, de forma que aqui vai uma aposta desta colunista: vai ter muito voto BolsoGrande, gente que vai optar por Bolsonaro e, ao mesmo tempo, pelo governador Renato Casagrande (PSB), apoiador de Lula.
E não seria novidade. Certamente isso ocorreu em 2018.
Nos discursos de alguns candidatos, entretanto, parece que é tudo "preto ou branco", sem um tom de cinza.
Bolsonaro e Lula lideram as intenções de voto, mas também a rejeição dos eleitores. Sabendo disso, Casagrande não nacionalizou ou "ideologizou" a coisa toda.
O apoio dele a Lula foi bem discreto. Nos debates realizados pela Rede Gazeta, por exemplo, Manato (PL) e Guerino Zanon (PSD) pediram voto para Bolsonaro. O socialista nem lembrou do petista.
Aliás, quem falou de Lula foram os adversários. Usaram isso como crítica ao governador e associaram os governos do PT à corrupção, não sem razão, frise-se. O governador, por sua vez, não contra-atacou apontando suspeitas de corrupção na gestão Bolsonaro. E teria vários exemplos a citar.
O socialista formou uma ampla aliança, unindo no mesmo palanque o PT, o PDT de Ciro Gomes, o MDB de Simone Tebet e até o PP, que está com Bolsonaro.
Usou isso como escudo para não se imiscuir no debate nacional e tentar evitar a associação ao petismo.
Manato, por sua vez, atrelou a própria imagem à de Bolsonaro, mas tentou falar para fora da bolha, apontando propostas nas áreas da saúde e de combate à miséria e à pobreza.
Guerino, que sempre foi conservador, bolsonarizou. Até passou a bradar "nossa bandeira jamais será vermelha".
Nas inserções na TV, Manato juntou as figuras de Casagrande a Lula, Dilma Rousseff e até ao ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci.
Aridelmo Teixeira (Novo) usou uma frase típica do presidente da República para atacar o socialista, dizendo que o governador adotou a estratégia, na pandemia de Covid-19, do "fica em casa e a economia a gente vê depois".
Foi chamado, em conjunto com os demais, de "negacionista" por parte de Casagrande.
Até a formação do secretário estadual de Saúde, Nésio Fernandes, entrou na dança. "Formado em Cuba", "comunista", ressaltaram Manato e Guerino.
Audifax Barcelos (Rede) disse, mais de uma vez, que não iria nacionalizar a eleição no Espírito Santo e, assim, não revelou até hoje em quem pretende votar para presidente da República.
Convidou para vice, no entanto, uma militar do Corpo de Bombeiros, a Tenente Andresa, que já manifestou simpatia por Bolsonaro. Para o Senado, ele declarou apoio a Nelson Junior (Avante), outro bolsonarista.
Uma cena que chamou a atenção de um leitor da coluna foi que, na reta final da campanha, Audifax passou pela rua Carlos Martins, uma das principais vias de Jardim Camburi, em Vitória. Enquanto o candidato ao Palácio Anchieta falava ao microfone, em um trio elétrico, um eleitor gritou, da calçada, o nome de Lula.
Audifax parou o trio e entregou ao homem uma "colinha" com os números dos candidatos em que o próprio Audifax pretende votar e avisou: "Você vai gostar do meu voto para presidente".
O fato é que o pleito para a presidência da República, dada a divisão entre dois grupos que se formou há tempos, mobilizou mais a torcida.
A corrida estadual ficou em segundo plano. A disputa pelo Senado, então, é sempre relegada.
Nesse plano, Magno Malta (PL) apostou todas as fichas em Bolsonaro.
Rose de Freitas (MDB), contando com o apoio do PT, manteve-se, "por enquanto", como apoiadora da correligionária Tebet, mas sem reforçar isso durante a campanha; Erick Musso (Republicanos) decidiu não pedir voto para candidato ao Palácio do Planalto, apesar de o partido dele estar na base de Bolsonaro.
Um apoiador dele que estava ao microfone de um trio elétrico da campanha de Erick que circulou por Vitória esses dias entoou o lema de Bolsonaro: "Brasil acima de tudo, Deus acima de todos".
"ACIMA DE TUDO"
O que deve estar "acima de tudo" para o eleitor na hora de votar é, primeiramente, entender as funções dos cargos em disputa; observar os grupos políticos aos quais o candidato está ligado e não somente a figura ou a postura pessoal dele e não se atentar apenas para os cargos majoritários (presidente, senador e governador).
Quem não gostou de ver o autointitulado padre Kelmon nos debates tem que saber que ele só apareceu porque é filiado ao PTB, que tem cinco representantes no Congresso Nacional (três deputados federais e dois senadores).
É o número mínimo para que as emissoras sejam obrigadas a convidar o candidato para os debates.
O voto para deputado, portanto, tem consequências que o eleitor talvez não imagine na hora de apertar "confirma".
É o Congresso que define coisas que afetam o dia a dia dos eleitores e, muitas vezes, tem o poder de ditar as regras para quem está na Presidência da República. Não é à toa que o Centrão ascendeu e está dando as cartas. E este não tem ideologia alguma.
Isso é possível não apenas devido à fraqueza do Executivo, mas, principalmente, porque eleitores escolheram colocar na Câmara e no Senado integrantes de partidos do Centrão.
Ao escolher deputados estaduais, vale a mesma lógica.
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