A região francesa do Jura permaneceu escondida e meio esquecida pelos apreciadores de vinho durante muito tempo. Situada abaixo das montanhas alpinas que separam a França da Suíça, cerca de 100 quilômetros ao leste da Borgonha, o Jura (em francês pronuncia-se "jurrá") só era lembrado por seu vin jaune, um vinho “amarelo” de caráter oxidativo cujo grande destaque é o Château-Chalon.
De alguns anos para cá, provavelmente na esteira do movimento em torno dos vinhos naturais, de caráter mais leve e autêntico, sem uso de defensivos agrícolas, a idílica região do Jura voltou à cena, destacando-se por seus vinhos tranquilos, especialmente de variedades locais como as uvas Savagnin, Trousseau e Poulsard.
Os vinhos brancos do Jura são elaborados com a Chardonnay, famosa na vizinha Borgonha, e com a uva autóctone Savagnin, também usada na produção do vin jaune. Já os tintos utilizam as castas Pinot Noir, Trousseau e Poulsard (ou Ploussard), em versões monovarietais, ou conforme a área, em mesclas.
A tinta Poulsard pode ser considerada, ao lado da branca Savagnin, um símbolo vínico do Jura. Essa casta praticamente não existe fora da região, contando com alguns poucos vinhedos na Borgonha e na Suíça. Por associação, ela tem o mesmo significado e a mesma relevância para o Jura que a Nebbiolo tem para a região italiana do Piemonte.
O nome Poulsard deriva de uma frutinha silvestre local conhecida como Pelousse. Não por acaso, a uva também recebe nomes regionais como Peloussard e Pleusard. A associação com essa fruta parece fazer todo o sentido, afinal os vinhos feitos com a Poulsard lembram mesmo o sabor agridoce, picante e levemente herbáceo dessas frutas silvestres.
A tonalidade vermelha clara de um Poulsard remete à cor de um suco de morangos, traduzida no paladar como um vinho leve e muito suculento, repleto de taninos suaves e elegantes, capazes de saciar nossa sede quase instantaneamente. Não por acaso, os franceses apelidaram esse tipo de vinho como vin de soif, literalmente o "vinho da sede".
Esses vinhos deliciosos, particularmente adequados ao nosso clima tropical, infelizmente tem uma oferta bastante limitada no Brasil. Mesmo em sua origem, devido ao pequeno tamanho da área cultivada, às condições climáticas frequentemente adversas e aos métodos de cultivo orgânicos, a produção já é relativamente escassa.
O fato desse estilo de vinho também estar na moda em todo o mundo não ajuda em nada aqueles que desejam conseguir algumas garrafas para provar. Os vinhos de alguns produtores, ainda que não sejam muito caros, chegam a ser considerados “unicórnios”, ou seja, praticamente impossíveis de encontrar no mercado regular. Achar uma garrafa de Poulsard de Pierre Overnoy exposta para a venda é tirar a sorte grande. Quando elas existem, costumam ficar escondidas e são vendidas apenas para alguns felizardos apreciadores.
Felizmente, alguns desses vinhos não são tão raros (nem caros) e costumam aparecer por aqui. Pelo menos três produtores têm distribuição regular no Brasil, ainda que as garrafas se esgotem rapidamente. A importadora Delacroix traz os vinhos do Domaine Tissot, a Cave Léman os vinhos do Domaine des Bodines, e a Vinho Mix importa os rótulos do Domaine de la Pinte.
Se você tiver a oportunidade de viajar ao exterior e encontrar algum dos vinhos elaborados com a Poulsard por Jean-François Ganevat, Adeline Houillon, Philippe Bornard, Domaine Labet, Domaine Puffeney e outros mais, não deixe passar a chance e aprecie uma dessas delícias do mundo do vinho. Santé!
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