Não é raro me pegar pensando na raiz das palavras. No átomo do pensamento que primeiro cravou no ar o som de um sentimento.
Há dias ando revendo as possibilidades da invenção da palavra saudade.
Foi durante uma conversa em que compareceu o sal como elemento... Sal da vida, sal da terra, sal nosso de cada dia – de repente, tive um acesso de certeza íntima: saudade vem de sal.
Não sei se foi cunhada para dizer da falta, ou da marca deixada por ele –– marca de um momento em que o sabor da vida compareceu. Ficou nítido, palatável.
Saudade... No nascimento, raiz de um instante em que o gosto da vida se apresenta; ou o oposto, tônica de um tempo em que este mesmo sal faz falta.
De um modo ou de outro, a possibilidade de cifrar a alma humana com palavras é das nossas maiores ambições. Representa a romântica tentativa de desvendar enigmas – da ordem do indizível, em sua maioria.
Por isso a poesia, essa lavoura da palavra, talvez seja o único cultivo que se aproxime desse desvelamento. Porque só a poética interfere sem ferir, penetra sem ter ponta e lavra a letra, escavando o real com a inchada do simbólico. E tanto roça que alcança o osso das relações... Esburaca, mostra.
Mas tem também outra palavra que já nasce gigante, monumental como um totem, e é, ao mesmo tempo, molecular, ínfima como pó brilhante. Pai é o radical do vivo que alcançou o útero e germinou no ninho.
"No início era o verbo e dele se fez carne."
Pensa comigo, pai é palavra que se materializa, vira emoção, vira sal da terra, sal da vida.
E tanto marca, quanto inaugura a falta.
Mas e se considerarmos que esse sal já nos foi dado?
Que o Pai nosso, tanto o imenso, que nos fez da poeira de estrelas, pura magia; quanto o radical do vivo, que viajou pelas trompas e nos fez carne e osso, gente viva; em ambos os sentidos nos ofereceram tanto o dom de criar o sabor da vida, quanto de perceber a falta e inventar a poesia.
E se tomando essa consciência pudéssemos recriar o milagre do início agora mesmo?
Se usando os poderes concedidos, também nos tornássemos criadores, bem como Ele propôs?
E assim fosse, o que você faria?
Nota: um homem bom chamado Márcio Libar, que se veste de palhaço, mas fala da expansão, me ensinou um exercício que transforma pensamento em destino. E é mais ou menos assim:
Fecha os olhos. Agora pensa no que você quer pra você. Pensa, pensa até virar uma imagem. Entra nessa imagem, analisa, sente essa imagem até ela virar uma emoção. Agora deixa essa emoção tomar seu peito, tomar seus ombros, seu rosto inteiro... Deixa ela virar riso frouxo, gargalhada; ou virar choro, água salgada. Deixa essa emoção tomar conta até virar magia... Porque é assim que se faz: vida.
Isso que você é capaz de sentir intensamente agora, já está acontecendo no futuro.
E se isso existe no futuro é porque está sendo criado agora.
Criação é imaginação com tomada de decisão, ele disse. É poeira de estrelas com potencial de materialização!
Diz que é assim que se fazem os filhos, toda forma de criação e todo sentido.
Poeira de estrelas, ou sal da terra, como queira, salpicada no solo fértil da mãe natureza.
Este vídeo pode te interessar
Veja também
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.