“Capacitar e incluir um profissional com deficiência em um ambiente corporativo é bem mais do que cumprir cotas, é quebrar paradigmas e ampliar o desenvolvimento”.
É triste, mas a lei de cotas 8.213/91, às vésperas de completar trinta anos de aprovação, parece não ser suficiente para eliminar o processo de exclusão, historicamente imposto às pessoas com deficiência.
A pandemia escancarou nossas vulnerabilidades e revelou uma dura realidade das empresas que deixaram de escanteio a inclusão dos profissionais com deficiência e, além disso, os cargos que eram ocupados por pessoas com deficiência foram eliminados. Se por um lado, o campo de trabalho na atualidade diminui para todos. No que tange à lei de cotas, as empresas não poderão continuar a fazer vistas grossas.
PODERIA SER MUITO MAIS
Parece desafiador, mas deveria ser natural que as contratações fossem movidas pela ética, capacitação técnica, pelo recrutamento do profissional e não pela deficiência, pela inclusão social e a eliminação do preconceito.
Das quarenta e seis milhões de pessoas com deficiência no Brasil, quatrocentas e oitenta e seis mil têm vínculo empregatício formal, de acordo com a Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), do Ministério do Trabalho. Trezentos e onze mil são homens e somente cento e setenta e cinco mil são mulheres. As discrepâncias são evidentes em muitos aspectos e grande parte das empresas são completamente carentes de informações e ainda não fazem muito para mudar o cenário.
COMPETÊNCIA TÉCNICA NOSSA X IGNORÂNCIA DAS EMPRESAS
Ainda que a Lei de Cotas encontre muitos obstáculos para sua efetivação. Na prática, ela avança lentamente dentro das empresas com mais de cem profissionais. Por essa razão, precisamos de uma fiscalização bem de perto - aliás, esse tem sido o sucesso para o cumprimento da lei.
Gastei muita roda para disputar uma vaga de trabalho nas empresas. E sobre os olhares despreparados dos gestores, posso falar de “cadeira”, não é? Dentre tantas desculpas e justificativas "surreais", a falta de qualificação profissional não pode mais ser usada pelas empresas como esquiva para nos manter fora do mercado de trabalho. Ora, a maioria das pessoas com deficiência ainda é pouco qualificada, mas essa baixa qualificação também ocorre na população geral. O que não significa que não existam pessoas com deficiência qualificadas com doutorado e pós-doutorado, por exemplo, ocupando funções pouco atrativas.
Em pleno 2021, os profissionais com deficiência qualificados – principalmente cadeirantes e cegos – têm maior dificuldade de conquistar uma vaga no mercado formal. Eu mesma ouvi muito a frase: "você está muito além do que a vaga oferece. Mas vamos ficar com o seu contato e blá blá blá". E continuava sem trabalho, mas não sem esperança de continuar a busca.
SERIA JUSTO SE NÃO FOSSE TRÁGICO
Muitas empresas ainda incluem profissionais com deficiência em seu quadro pela obrigatoriedade da lei. E é indiscutível a sua importância já que grande parte desse público que está no mercado formal, só está em função da lei de cotas que garante um percentual em empresas com cem ou mais funcionários.
São quarenta e seis milhões de pessoas quase invisíveis que precisam diariamente romper uma barreira muito concreta: a cultural. A atitude e o comportamento continuam sendo os maiores obstáculos a serem superados para a inclusão de profissionais com deficiência no mercado. As relações, a convivência, o olhar ainda estão presos aos estereótipos e preconceitos.
PARA AVANÇAR, É NECESSÁRIO AMPLIAR O OLHAR
Justificar a ausência de profissionais no quadro da sua empresa por falta de acessibilidade (arquitetônica e de informação) reforça - e muito - a falta de cultura inclusiva dentro da companhia. Porém, aquelas que já exercem a função de fortalecimento da diversidade, não se opõem à lei de cotas. Pelo contrário, as empresas entendem e já são capazes de enxergar para além da obrigatoriedade, os benefícios e valores que podem incluir em suas marcas e conteúdos.
Para que esse cenário siga nos trilhos certos, líderes e profissionais da área de gestão com pessoas devem ser sistematicamente treinados, capacitados, para selecionar e recrutar os profissionais com deficiência e, além disso, entender que engajamento e responsabilidades têm que ser compartilhados. E claro, é obrigatório ampliar a visão para os cargos mais estratégicos.
ENRIQUEÇA A VIDA EM SUA EMPRESA
Incorporar o conceito de acessibilidade em nosso cotidiano e trazer as diferenças para dentro da instituição é uma atitude ética e enriquecedora que só agrega valor no mundo do trabalho e nos negócios.
Fazer inclusão às avessas da exclusão pode ser perigoso (a lei pela lei). E a empresa que não entender as novas tendências de se fazer negócios, certamente não resistirá. A inclusão de profissionais com deficiência no mercado formal de trabalho é um tema que não pode sair das pautas do mundo corporativo. Inovar é uma das maiores lições da pandemia para os empreendedores.
SEM CAPACITISMO, MAS COM RECONHECIMENTO
Você já parou para pensar que pessoas que encaram desafios diários por falta de acessibilidade em todas as áreas e que driblam olhares tortos de uma sociedade que discrimina, podem ser grandes e fortes profissionais em sua empresa? Que não se apertam com pressões e não se intimidam nas tomadas de decisões, e que sabem sair com maestria dos diferentes desafios e ainda melhorar o clima organizacional? Pois é, caro gestor, olha só o que você está perdendo.
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