Estamos na última semana do mês, portanto, mais um ciclo se encerra. Infelizmente, chegamos à triste marca de duzentas e cinquenta e cinco mortes por covid-19 de pessoas com deficiência aqui no Espírito Santo. E também por esse motivo, trago novamente para a coluna de hoje o amigo e pesquisador doutor Douglas Christian Ferrari, que nos ajuda a entender uma questão fundamental: por que as pessoas com deficiência não contam? Que o novo ciclo que chega traga também respostas.
No último sábado 20, perdemos o presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência de Vitória. João Salles era cego e foi vítima da covid-19. O vírus não se cansa e, vez ou outra, acha um jeito de deixar sua perversidade mais pertinho da gente.
E quando as mãos são os olhos?
A urgência da pandemia nos exige ações inovadoras e tentativas incansáveis de zerar a contaminação. Se por um lado estamos avançados na identificação das formas de contágio, por outro estamos em déficit no que diz respeito às orientações que atendam às especificidades das pessoas com deficiência e seus familiares. Por exemplo, quais são as estratégias para a prevenção entre as pessoas com deficiência visual ou cegas, uma vez que percebem o mundo pelo tato e pelo som?
Vamos lembrar que graças ao esforço da professora Ethel Maciel e do professor Douglas, o Espírito Santo foi o primeiro, se não o único no Brasil, a incluir os dados da pessoa com deficiência no quadro COVID-19. E até agora o desafio de sairmos dessa estatística, para ações efetivas de gestão da saúde, não foi encarado. A tomada de decisões dos governos nas estratégias de cuidados e a falta de informações são os pontos nevrálgicos da pandemia para o público com deficiência.
Um viva aos pesquisadores
O trabalho publicado na Scientific Electronic Library Online nos mostra outros dados importantes quanto à vulnerabilidade das pessoas com deficiência e as mortes – mais estigmatizadas, contexto social muito diferente e baixa escolarização.
A pesquisa nos aponta o caminho para amenizar o crescimento de óbitos, que por sinal continua mais alto que na população sem deficiência: 4,6% de letalidade contra 2,0%. Pasmem. Se ela nos aponta soluções, por que não são aplicadas?
É bom lembrar que a convenção internacional sobre os direitos da pessoa com deficiência e a Lei Brasileira de Inclusão reforçam a importância das ações intersetoriais e reconhecem a vulnerabilidade desse público. Então, não dá para ficar dando tiros no pé por falta de legislação, incompetência ou inércia.
Mais eficiência, por favor, senhores da política
Está na hora de usar a lupa e reconsiderar a vida. As estratégias existem e estão nas legislações porém não são efetivadas, e isso nos faz compreender que continuamos às margens e o quanto o Brasil está em dívida quando o assunto é a igualdade de condições de prevenção e assistência.
A invisibilidade com que estamos atravessando essa pandemia reforça o risco de sofrermos com o vírus, e com as sequelas dele. Que rede de assistência teremos para retomar nossas necessidades de vida diária?
Não nos foi dada a chance de negociar com o vírus. Aliás, acho que ninguém tem essa opção, não é mesmo? O que temos são situações urgentes, que envolvem pessoas com deficiência pipocando e sem nenhum enfrentamento. Se o ano começa agora ainda é tempo de arregaçarmos as mangas e rompermos com a velha prática ineficiente na política.
"As pessoas com deficiência não podem continuar esquecidas e invisíveis social e politicamente. A situação exige garantia de direitos."
Trecho extraído do trabalho publicado na SciELO - Pessoas Com Deficiência e COVID-19 no estado do Espírito Santo: Entre a invisibilidade e a falta de Políticas Públicas. Ethel Maciel, Douglas Melo, Jéssica Delcarro, Igor Robaina, Pablo Jabor, Etereldes Gonçalves Junior, Eliana Zandonade.
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