Mariana Reis é administradora de empresas e educadora física. É pós-graduada em Gestão Estratégica com Pessoas e em Prescrição do Exercício Físico para Saúde. Atua como consultora em acessibilidade e gestora na construção e efetivação das políticas públicas para a pessoa com deficiência em Vitória

Covid-19: A onda invisível das pessoas com deficiência

Se por um lado o pico de contágio na população em geral está em declínio, existe uma nação de pessoas com deficiência, que parecem ofuscadas por uma cortina, que atinge o seu pico agora

Publicado em 15/09/2020 às 15h31
Curado covid-19
Felizmente, muitas pessoas conseguiram passar pela doença, mas a pandemia escancarou a desigualdade e a falta de prioridade em relação às políticas públicas voltadas para as pessoas com deficiência no Estado. Crédito: Pixabay

Hoje trago um dado que pode não ser surpresa, mas é, no mínimo, assustador. O número de pessoas com deficiência infectadas pela covid-19 é de três mil, seiscentos e sessenta e cinco. Desses, cento e setenta e cinco vieram a óbito. O que representa 4,8% da letalidade em relação à população geral, que é de 5,3%.

Se por um lado o pico de contágio na população em geral está em declínio, existe uma nação de pessoas com deficiência, que parecem ofuscadas por uma cortina, que atinge o seu pico agora. Com a inclusão recente dos dados no quadro da covid-19, é possível perceber o quanto a pandemia escancarou a desigualdade e a falta de prioridade em relação às políticas públicas voltadas para nós. Enquanto estivermos invisíveis no que diz respeito a informações e ações, darei continuidade aqui na coluna sobre a série "Coronavírus e pessoas com deficiência no ES".

Acompanhar de perto é urgente

Desde que passei a acompanhar junto ao responsável pela pesquisa e amigo, professor Douglas Ferrari, tem sido difícil encarar com naturalidade os dia e noites. O número é muito alto de morte para deixar a inércia à deriva. Imaginem que estamos todos debaixo de uma forte tempestade, onde uns têm capas, outros, grandes guarda-chuvas, enquanto alguns se alagam sem nenhuma chance de salvamento. Nós, pessoas com deficiência, nos vemos nesse último grupo.

O panorama é duro e complexo e exige um olhar bem mais humano do que achávamos que teríamos lá no começo da pandemia. Estamos longe de ter profissionais da área da saúde que saibam sobre as peculiaridades das deficiências quando elas batem à porta da UTI de um hospital por contaminação.

Falta preparo e atenção

Nos cento e setenta e cinco mortos no estado do Espírito Santo, há relatos de famílias que foram ao hospital, fizeram teste para covid-19, deu positivo, mas voltaram pra casa sem outros exames. O quadro se agravou e a morte chegou. Muitas deficiências acarretam o comprometimento dos pulmões, com o contágio pela covid-19 esse comprometimento se agrava. Logo, se espera que além do teste, exames de imagens sejam feitos antes da possível volta pra casa.

Mariana Reis

colunista

"Outro fato que chama nossa atenção é a falta de acompanhante na UTI. Pessoas surdas internadas sem acompanhante e sem intérprete estão morrendo. Tetraplégicos sem seus cuidadores internados na UTI estão morrendo. Pessoas com síndrome de Down sem acompanhante internados na UTI estão morrendo. Essa discrepância no tratamento entre as pessoas só piora e desumaniza. Você não acha?"

Precisamos entrar na pauta

Enquanto não se pensar numa pauta social urgente para dar voz e visibilidade ao grupo que está se afogando nesta pandemia, esse número vai aumentar ainda mais na próxima semana quando avaliarmos os dados. Estamos privados de informações e exigimos ser consultados sobre nossas necessidades. Uma dica para os gestores é abrir a Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência - CDPD. Ali estão garantidos o direito à informação, saúde, educação é padrão básico de vida. E, com certeza, ao abrir esse documento contribuirão para equilibrar os danos sofridos pela tempestade brutal.

Se o Espírito Santo demorou seis meses para incluir as pessoas com deficiência no quadro de dados do Coronavírus, não dá para esperar mais seis meses para que a catástrofe aumente e mais vidas sejam perdidas. Precisamos de atenção agora.

Vou ali respirar.

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