A coluna de hoje traz a participação do meu grande amigo e doutor em Educação pela Universidade Federal do ES, Douglas Christian Ferrari. Militante e com baixa visão, ele é incansável quando o assunto é política pública para a pessoa com deficiência.
Há tempos as pessoas com deficiência são consideradas “descartáveis”. Lilia Lobo, doutora em psicologia e autora da obra "Os Infames da História: Pobres, Escravos e Deficientes no Brasil", nos conta um pouco sobre a trajetória das pessoas consideradas dispensáveis e invisíveis na primeira metade do século XX. Desde aquela época os “corpos desviantes”, aqueles que não serviam, eram deixados à margem. No Império, surgiram as primeiras instituições especializadas, para cuidar dos que eram considerados fardo social. A partir da Revolução Industrial, foi preciso começar a considerar a produtividade dos que representavam a menos valia, e diferenciar os treináveis dos não treináveis. Em todos os casos, esses corpos eram apagados e silenciados.
A partir do início do processo de inclusão social, houve tentativas de trazer as pessoas com deficiência ao protagonismo. Não eram mais as pessoas com deficiência que tinham que adaptar-se à sociedade e à escola, mas o contrário – chegamos a era da integração social. Entretanto, estudos mostram que essa realidade tem avançado pouco ou muito lentamente. As pessoas com deficiência continuam sendo vistas como incapazes pela grande maioria da população. Uma nação de 46 milhões de pessoas no Brasil (quase) invisíveis.
Realidade que o novo coronavírus apenas agravou. Escancarou vulnerabilidades sociais como a desigualdade econômica. Outro desses sinais é a falta de inclusão, nos dados oficiais, de informações relativas a pessoas com deficiência mortas ou infectadas pela covid-19. A ausência desses dados é comum em todos os níveis governamentais no país.
Vale ressaltar que nos painéis-covid dos estados e do Ministério da Saúde é possível encontrar informações estratificadas por sexo, raça, tipo de comorbidade, bairro de residência (análise socioeconômica), se é profissional de saúde, entre outras. No entanto, mesmo que se saiba, informalmente, de pessoas com deficiência que estão infectadas ou que faleceram devido ao vírus, elas seguem oficialmente invisíveis.
O estado do Espírito Santo se destaca com a recente lei 11.130/2020, sancionada pelo Governo do Estado e que inclui os capixabas com deficiência no grupo de risco. Essa ausência de informações e diagnósticos específicos, já alertada pela ONU e pela OMS no início da pandemia, dificulta consideravelmente a realização de pesquisas e análise de dados, além da elaboração de políticas públicas direcionadas. Enquanto não conseguimos elaborar nada oficialmente direcionado a esse público, para durante a pandemia ou depois dela, ouvimos relatos de pessoas cegas que não recebem ajuda devido à necessidade de contato e de pessoas surdas que não conseguem fazer leitura labial por causa da necessidade do uso de máscaras.
Muitas perguntas seguem sem resposta:
Como estão as pessoas com deficiência no retorno ao trabalho, após a flexibilização das atividades não essenciais?
Como será o retorno ao cotidiano escolar para esse público?
A quem interessa que as pessoas com deficiência continuem a não contar?
Por que não há dados em um momento tão crucial para todos?
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Se a necropolítica e o capacitismo não param, até quando continuaremos inertes?
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