Só quem é reconhecido como o melhor amigo do homem pode ir muito além de um animal de companhia. É impressionante como os cães nos surpreendem com sua inteligência, com sua cumplicidade e ainda com sua capacidade de serem os responsáveis pelos passos seguros das pessoas com deficiência visual em sua caminhada. Chamados de cão-guia, a história deles é boa de se contar. Faz um café e vem comigo.
Parceria de séculos
As escolas para cães-guias de cegos tiveram seu desenvolvimento durante a primeira Grande Guerra. Muitas pessoas perderam a visão em decorrência dos vazamentos de gases, estilhaços, explosões e até mesmo doenças acarretadas durante o período bélico. O uso do cão como guia para as pessoas com deficiência visual tem início, portanto, nesta época. Os primeiros centros de adestramento apareceram na Alemanha, em 1915 e a seguir na França, orientados por oficiais do exército. Com o fim da guerra, vários outros centros foram criados na Europa e nos Estados Unidos.
Os verdadeiros olhos da pessoa guiada
Um cão-guia para cegos tem a principal função conduzir uma pessoa cega em segurança através dos espaços onde ela precisa circular. É uma tecnologia assistiva. Evita todos os obstáculos com que o dono possa colidir desde os que se encontram à altura do solo, como carros nas calçadas, postes, pessoas, até aqueles que os que ameaçam a cabeça, como galhos de árvores, e orelhões (ainda bem que tem menos hoje em dia). Os buracos são cuidadosamente evitados por ele, que escolhe o piso menos acidentado, evita que a pessoa cega pise nas poças de água, e acreditem: até coco de outros animais de donos descuidados. Outras funções como procurar um lugar vago no ônibus ou num café, guiar até o balcão de atendimento nos estabelecimentos comerciais, e também impedir que o seu dono atravesse a rua quando os sinais estão abertos, é pra deixar todo mundo de queixo caído e morrer de vontade de apertar esse cão, não é mesmo?
Muita cumplicidade e confiança
Tão inesquecível quanto o atentado do dia 11 de setembro de 2011 do World Trade Center em Nova York, foi a linda história do americano Michael Hingson e sua labradora, Rochelle. Ela, Rochelle, morria de medo do barulho dos trovões e ficava aflita sempre que chegavam as tempestades. Mas, no dia 11 de setembro, logo ela que morria de medo dos barulhos do céu, conseguiu manter a calma, e num dos maiores episódios de terror e tensão, guiou com segurança o seu dono pelas escadas dos 78 andares. Foram 1.463 degraus do seu escritório até a rua. Essa cumplicidade virou um livro, onde o próprio Michael conta todos os detalhes vividos na fuga do prédio em chamas e prestes a cair.
Bengala ou cão-guia?
Cão-guia é uma alternativa ao uso da bengala e apresenta uma série de vantagens em relação a esse instrumento, a segurança e independência são algumas delas. Mas o que reparo entre os meus amigos que usam cão guia, é a postura física. Ombros abertos, cabeça erguida, me parecem ainda mais seguros e assertivos enquanto caminham. Existem pessoas que não se adaptam ao uso do cão-guia e isso é também uma realidade importante e que merece respeito.
Não importam as raças, e sim, o cão
Atualmente as raças utilizadas no mundo inteiro são: retriever do labrador, golden retriever, collie, boxer, bouvier des flandres e pastor alemão. Essas raças possuem temperamento, tamanho e características adequadas para a função. A seleção é feita de forma muito criteriosa e de uma ninhada grande, às vezes nenhum cão é escolhido.
A socialização
Que ele garante maior velocidade, melhor postura e desenvoltura na locomoção, já que é capaz de se antecipar aos obstáculos, já sabemos. Mas para além disso, existe também o aspecto psicológico muito positivo que resulta dessa união. Quem tem um animal de estimação sabe bem. O cachorro é estímulo, amor, carinho, inspira confiança e vontade de viver. E para a pessoa com deficiência visual, o cão-guia se torna um grande agente socializador, fazendo com que a inclusão na sociedade se dê de maneira leve. Um aviso: controlem o fofurômetro.
A lei nº 11.126/05
No dia da assinatura da Lei, eu estava em Brasília juntamente com outros gestores e representantes do movimento das pessoas com deficiência do Brasil. E para comemorar essa conquista, depois de um dia de trabalho, saímos para comemorar, e claro, não faltaram cães-guia na turma. Chegando ao restaurante fomos recebidos na porta pelo funcionário que de imediato disse: cachorro não pode. Antes que os meus amigos e donos dos cães ficassem nervosos, fui logo dizendo: eles são cães-guia. O recepcionista respirou tranquilo e respondeu: ah, cão-guia pooode. Desde esse dia entendi que cão guia não é só um cachorro.
A lei assegura à pessoa com deficiência visual o direito de ingressar e permanecer com o animal nos veículos e nos estabelecimentos públicos e privados de uso coletivo. O cão-guia pode e deve ir a todos os lugares.
Ter um cão-guia não é nada fácil no Brasil. O custo é alto e a vida útil de trabalho do animal gira em torno de oito anos. Diante de todos os desafios, o que poderia substituir o trabalho de um cão-guia? Se você respondeu um cão-guia robô, acertou. E é sobre ele que irei falar na próxima semana
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