Setembro começa nos fazendo um convite mais que necessário: falar sobre o suicídio. A campanha Setembro Amarelo, de prevenção ao suicídio, iniciada em 2015, é uma iniciativa do Centro de Valorização da Vida (CVV), do Conselho Federal de Medicina (CFM) e da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP).
Este é um assunto que ninguém quer tratar ou falar. Um tabu, seja por questões religiosas, seja pelo medo de, ao falar, incitar pessoas que sofrem a pensar no assunto. É sobre essa dor afetiva, psíquica que deveríamos lidar com todo cuidado.
Precisamos buscar um caminho para entender que dor tamanha é essa, e para se pensar nos muitos a nossa volta que estão imersos em angústias avassaladoras. Compreender a batalha entre continuar ou não vivendo, descobrir os sinais de que alguém está em sofrimento, são pancadas na alma e um grande desafio para diversas áreas do conhecimento humano.
Para Émile Durkheim (1857-1917), o suicídio é um fenômeno social. Em sua obra “O suicídio”, afirma que o ato extrapola a conotação moral, inaugurando aí uma nova visão sobre essa atitude tão radical. Em resumo, a solidariedade social, que se dá entre forças de integração (laços) e força de regulação (poder coercitivo das leis) é o centro da reflexão de sua obra. E daí resultaram em quatro tipos sociais de suicídio: egoísta, altruísta, anômico e fatalista.
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Faço essa introdução com Durkheim, sem me aprofundar, mas já deixo a sugestão de leitura, para que possamos compreender como o tema faz parte de toda história humana. E que essa ruptura, seja social, ou tentativa final desesperada em conseguir algo ou se sentir incluído, é universal, embora muito individual.
As pesquisas mostram que falar sobre os sinais de alerta e sobre onde buscar ajuda é essencial para diminuir o grande número de mortes. O medo e o estigma de que o suicídio é um pecado ou até mesmo um ato covarde, afasta quem está pensando nessa possibilidade de se abrir e receber ajuda.
Quando falei para um amigo que escreveria sobre o assunto na coluna da semana, ele me apresentou uma poeta e ensaísta, a carioca Ana Cristina Cesar (1952 -1983). Disse para que eu lesse o poema “palavras”, mas fui além. Li outros poemas tão lindos e doces quanto igualmente ferozes na dor existencial. Sem me contar nada mais sobre ela, fui também procurar sobre sua vida e surpreendentemente li que sua morte decorreu de um suicídio. “Emparedada” era como se sentia diante de suas dores e sofrimentos. Num de seus poemas ela diz: “Angústia é fala estúpida”. E eu acredito que, tudo que não falamos vira gesto, ou doença.
Vivemos em uma era em que não podemos ficar tristes porque isso significa que estamos doentes e se essa tristeza vier com um sentimento de introspecção, aí estamos fritos e viramos alvo de preocupação e pena. Se não for por um acontecimento trágico a tristeza não é permitida.
Finalizo este texto lembrando que quando alguém tenta um ato tão radical como o suícidio, existe ali uma angústia, uma dor e uma palavra que precisam ser descritas, ditas e nomeadas. E que deixar de sofrer é o seu desejo maior e isso não significa que queira acabar por tirar sua vida. A fala estúpida está em não olhar atentamente para uma sociedade consumista, exigente e estigmatizante, que não tem percepções afetivas para esses que nos cercam.
Coragem para perguntar como somos afetados pelo medo da pandemia, por exemplo. Com os sentimentos no nosso trabalho, são ações que precisamos ter para minimizar as deficiências emocionais. Todos somos parte da solução e podemos fazer alguma coisa para impedir que alguém solucione suas dores com essa prática. Despertar a esperança no outro e prevenir essa atitude suicida é responsabilidade de todos nós.
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