Refúgio. Palavra bonita que nos leva para um lugar sossegado, um lugar de proteção. Abrigo. Sentimos o calor vital só de pensar no significado de tais definições. Agora pense nas pessoas que buscam desesperadamente por este lugar, por este acolhimento.
Refugiados. Pense neles e o cenário mudará bruscamente.
Visito minhas memórias e lá estão os lugares que frequentei na infância. Onde, se quiser, posso voltar. Onde estão preservadas minhas histórias. Espaços que são pontos da minha vivência. Que serviram para legitimar sonhos.
Já um refugiado, quando fecha os olhos e visualiza suas memórias, suas experiências, pode voltar ao lugar onde nasceu e construiu sua identidade? Não. Assim é a realidade de milhares de refugiados. São abstraídos de seu passado. Um lugar que não lhes pertence mais. De onde foram expulsos. Seja pela guerra, seja pela perseguição política, religiosa, fome, miséria, por grandes tragédias ambientais, naturais. Não importam os motivos, o retorno não é mais possível. E o que é mais triste é que, em grande parte dos fluxos de migração forçada, o indivíduo foi desumanizado na sua origem e será desumanizado em seu destino.
Existem muros no meio do caminho, uma barreira que determina claramente: você não é bem-vindo. Voltar não é mais possível, então a única opção é pular o muro. Pular para um lugar no qual não se é bem-vindo e abandonar sua história, muitas vezes traumática. Se por um lado estamos aprendendo com a pandemia a viver o momento presente, o que resta para um refugiado e sua família é a angústia do agora. Não ser acolhido e não ter nenhuma qualidade de vida. Sem documentos, sem lugar para morar, sem comida, tampouco paz de espírito. Perseguições também são parte do sofrimento.
Na geografia, o lugar é um ponto no espaço onde estão suas raízes, suas emoções e sua identidade. O lugar é o ponto no espaço que pertence a você e no qual você pertence. O refúgio é não pertencer a lugar algum. Nem de origem e nem de destino.
A situação de refúgio, palavra aqui ressignificada, não te permite chorar o passado, ou enterrar os mortos, pois você é obrigado a fugir. Vimos isso recentemente no Afeganistão. A esperança se agarrava nas asas do avião para tentar pousar em algum lugar onde a sua dignidade não fosse anulada. Manter a vida era a palavra de ordem, embora se percebesse nos olhos daquelas crianças a vontade de se movimentar e construir um futuro.
As raízes trazidas do passado sufocam o presente. Porque você não pode voltar ao seu lugar de origem, sua identidade foi quebrada. O refúgio agora é a desesperança, é a não existência. E isso dói tanto como a fome, tanto quanto a violência que se sente no corpo.
De acordo com o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) - ou Agência da ONU para Refugiados -, estima-se que quase 80 milhões de pessoas foram forçadas a abandonar suas casas devido a conflitos armados e violação de direitos humanos.
Para falar sobre este tema existem dois tratados que são: a convenção sobre o estatuto dos apátridas de 1954. A Convenção de 1954 tem por base o princípio simples de que um apátrida deve receber tratamento ao menos tão favorável como aquele dispensado a um estrangeiro possuidor de (alguma) nacionalidade. Já a Convenção de 1961 visa à diminuição da incidência de apatridia.
Você já se deparou com algum migrante aqui no Estado? Talvez a resposta seja sim, exatamente devido ao número mostrado pelo Acnur. E o acolhimento a eles infelizmente confronta com a crise econômica mundial e no enorme temor de que roubem os empregos, que atualmente estão em déficit.
As pessoas quando se deslocam levam com elas uma série de demandas. Ali tem também refugiados com alguma deficiência. E essas demandas que vão muito além de acolher, devem ser atendidas, embora, o Brasil seja signatário da Convenção, ainda se exime de assumir suas responsabilidades.
Quando somos rejeitados e não encontramos um lugar, está instaurado o problema. Parece paradoxal imaginar um mundo tão grande, e com tantos espaços, ter realidades tão diferentes. É a exposição de um sistema frágil e antidemocrático e sem oportunidades. Vejo que buscar por um refúgio tem a ver com buscar ser e não apenas estar.
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É fato que o tema ganha cada vez mais atenção do mundo e que muitas imagens de refugiados nos causam tristeza e torpor, mas é extremamente necessário se pensar na reconstrução de vínculos, da história, e das soluções rápidas que exigem um esforço coletivo da sociedade e autoridades. Que os olhares sejam sensíveis e empáticos e que os voos sejam para resgatar a esperança. Precisamos falar sobre isso.
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