É médico, psiquiatra, psicanalista, escritor, jornalista e professor da Universidade Federal do Espírito Santo. E derradeiro torcedor do América do Rio. Escreve às terças

As gloriosas e tradicionais turmas capixabas de bar

Não haveria tempo no mundo para trazer o significado desses ícones boêmios de Vitória. Se eu esqueci de algum, meu paciente leitor, acrescente

Publicado em 11/06/2024 às 01h40

Capixaba na língua tupi-guarani significa roça, roçado, terra para plantação de qualquer coisa, além de milho e mandioca.

A primeira providência de um forasteiro que chega à Ilha Delícia é poder escolher um local aprazível para habitar. Antigamente não era fácil.

No caso de nossa família, apareceu, assim que chegamos, uma pensão onde moramos eu, meu irmão Sergio, meu pai Aderson e minha mãe Mariucha, no Parque Moscoso.

Meus pais, funcionários públicos federais, quando chegamos, não acharam uma única casa para alugar ou adquirir, apesar da procura intensa. A cidade estava completa.

Passados uns meses, viemos a morar em Jucutuquara, Praia do Suá e Bairro de Lourdes (que tinha o discreto cine De Lurdes). Nesse último, conhecemos vizinhos mais maravilhosos, os Simonottis: seu Hilton, que tinha um Jeep, dona Ema, Marcinha, Marlene e o elegante Marquinhos, com quem batia bola no Ouriço Clube.

No Praia Tênis também batíamos uma bola legal no futebol de salão, com uma certa elegância. Conheci ali o líder Marcos Murad, que se dedicava de corpo e alma ao clube e ao time.

Nesta época, passei a frequentar alguns bares como todo mundo.

Para começar, a turma do Britz, na família Paru. Era a concentração da alegria em cima e embaixo. De jornalistas a grandes empresários, era lá que a gente se concentrava nas Copas do Mundo.

Britz Bar, no Centro de Vitória
Britz Bar, no Centro de Vitória . Crédito: Arquivo AG

A turma do Centro era maioria. Tomar chope e jogar o anteparo de papelão para pregar no teto era uma das atividades esportivas. Quando íamos ao Britz, já não havia o prédio da prefeitura que deu lugar ao sagrado campo de treino do Fluminensinho e seu craques.

Quem poderá esquecer também o Clube da Meia-Noite, bem no centro da Praça Costa Pereira, reservado para os mais velhos. O Bar Santos enchia a Vila Rubim. Havia um garçom que assustava os neófitos girando a bandeja carregada de cerveja fingindo derramar e logo com maestria dava meia volta.

O Bar Sem Porta ficava sem porta mesmo em São Torquato. Vândalos a derrubaram em uma das madrugadas e assim ficou sem a porta funcionado durante 24 horas, até acabar o bar. Já no Bar Central, próximo à escadaria do Palácio Anchieta, continha uma banca de jornal e as pessoas podiam beber e ler ao mesmo tempo.

Em um bar a gente ia sabendo da história dos outros. Havia o Bar Estraga Lar, o Café Globo, o Dominó, o Café Avenida, o Miramar, de frente para o mar, que dominava a Praia do Canto, e o Escandinava, onde as generosas senhoritas recepcionavam os marinheiros atracados no cais de todas as nacionalidades do mundo.

O Bar Marrocos, na Duque de Caxias, atrás da Praça Oito, reunia a esquerda intelectual festiva ou não. Não posso deixar, como legítimo torcedor do América carioca, citar o garçom “Cariacica”, fã do clube e que sabia servir como ninguém o tradicional filé Marrocos. Para fazer o reforço alimentar e encerrar a madrugada, iam todos ao Mar e Terra, que não fechava as portas nem por decreto.

Caros leitores, esses bares não significavam bebedeiras, mas tradição.

Não haveria tempo no mundo para trazer o significado desses ícones capixabas da Ilha Delícia. Se eu esqueci de algum, meu paciente leitor, acrescente.

Dorian Gray, meu cão vira-lata, adora farejar garrafas.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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