Um dos pontos que marca a educação tradicional da nossa cultura é algo que pensamos ser natural nas relações: a disputa por poder. Ela que aparece sempre que você sente que alguém está te peitando, testando, ameaçando. Ela que está presente toda vez que você sente que precisa dizer para uma criança que você é mais forte que ela. Ela que aparece em nos altos cargos públicos, na polícia, no abuso de autoridade, na brutalidade, no machismo.
Essa disputa por poder nos é ensinada desde que éramos muito pequenos. Passamos a entender o mundo enquanto ganha o mais forte, perde o mais fraco. Passamos a querer ser o forte, e querer dominar os fracos. A luta por poder vira, então, competição constante na infância e adolescência, que leva a disputas, bullying e até humilhações por parte dos professores.
Depois que você abre os olhos para o quão imatura é a disputa por poder, começa a perceber crianças feridas em todas elas. Começa a perceber como as pessoas, muitas vezes, lutam por poder para se proteger de suas próprias inseguranças. Mas tem um problema bem grande nisso: elas não têm a oportunidade de entrar em contato com essas inseguranças, nem de trabalhar cada um dos pontos e experiências que a deixam insegura. E essas disputas por poder nos mostram que, quando somos inseguros, não importa a conquista que temos na vida, ela nunca será maior que nossas incertezas, medos e inseguranças. Porque a disputa por poder acontece para que a pessoa se sinta poderosa e mostre isso. Mas esse sentimento passa em um segundo quando as inseguranças internas não permitem que se sustentem. E essas inseguranças, em geral, vêm daqueles que eram poderosos em nossa infância e juventude. Suas vozes ainda ecoam em nossa cabeça, acreditamos em cada palavra que foi dita, quando aqueles mesmos adultos estavam apenas lutando contra seus próprios medos e inseguranças, lutando por poder.
Mas, então, como quebrar esse ciclo? Compartilhando poder. Exercitando a democracia interpessoal, entendendo que precisamos ser democráticos em todas as nossas relações. É ensinar para as crianças, ao invés de disputar poder e focar em punições, compartilhá-lo e ter o foco nas soluções.
Outro ponto importante é a educação emocional, a relação íntima consigo mesmo e a possibilidade de construir autoestima baseada em sua própria percepção sobre si. Precisamos ensinar nossas crianças a acreditarem em si mesmas, em reconhecer e trabalhar as próprias inseguranças e não depender tanto da opinião alheia para estar bem.
Assim, ao invés ter explosões emocionais ou disputar poder em todas as relações quando adulta, ela terá condição de se perguntar “por que me sinto ameaçado por essa adolescente, se ela não me quer mal?” e ter a oportunidade de aprender sobre si mesmo, se desenvolver e melhorar enquanto pessoa.
Educar nossas crianças para compartilhar poder ao invés de disputar por ele a todo custo é um movimento lindo, quebra ciclos, mas não é fácil. Como diria Paulo Freie, “o sonho do oprimido é se tornar o opressor”, e fomos oprimidos nossa vida inteira, perdendo essa disputa. Então, quando finalmente chega a nossa vez de mandar, para muitos de nós, é uma dor egoica muito grande não poder desfrutar desse poder que finalmente “conquistamos”. Mas ao entrar em contato com essa nossa sede de poder oprimir, mandar e ser obedecido, mergulhamos em autoconhecimento, descobrimos nossas inseguras e temos a possibilidade de nos desenvolver a partir disso. E na minha opinião, esse é o maior poder que qualquer um de nós pode querer ter: o poder de melhorar a si mesmo!
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