A nossa cultura tradicional de educação nos ensina que a criança precisa ser controlada. Aliás, controlada não, DOMADA! A criança é vista, muitas vezes, como um ser maldoso e articulado, que se não for dominada irá dominar. Que se não forem dados os limites, vai tomar conta da casa, bater nos adultos e destruir tudo e todos à sua volta. É visto como um ser que, se não for podado, vai crescer demais. Uma pessoa que, se não apanhar de você, vai bater em você. E por aí vai...
Essa mesma cultura ensina que a criança é um ser em branco que depende do adulto para aprender qualquer coisa. Que enxerga o adulto como o ser que sabe tudo e deve passar todo esse conhecimento para a ela. Dessa forma, responsabilizando esse adulto pelo que a criança sabe e não sabe, colocamos nele a tarefa de domar, informar, fazer aprender marcos de desenvolvimento e forçar a criança a crescer. Como se crescer fosse uma coisa ensinada, guiada, treinada e aprendida ao invés de algo que é vivido e construído dia após dia.
Nanda Perim
psicóloga
"Essa visão acaba fazendo enorme pressão nas conquistas diárias da criança, como se determinasse a qualidade dos cuidados desse adulto. Quem aí já se sentiu pressionado a fazer a criança crescer? Quem já se sentiu cobrado porque a criança ainda não sentava, ainda não andava, ainda não falava, ainda usava fralda ou ainda não escrevia e lia? Aliás, pressionado com qualquer coisa da infância dela?"
Essa pressão faz adultos tomarem medidas desesperadas para as etapas que, ACREDITA, que já deveriam ter sido processadas. Esse adulto se preocupa com o que pensam dele, se preocupa com o que pensam da criança, se preocupa com o pai ou a mãe que está sendo, e nesse ínterim acabam acelerando processos da infância - que demandam TEMPO!
Assim, temos um adulto pressionado, querendo controlar e forçar os PROCESSOS DA CRIANÇA que pedem tempo e autonomia. Frustrados, estressados e com pressa, esses adultos se dão ao enorme trabalho de passar por difíceis e sofridos processos para que a criança aprenda. Já ouvi as mais diversas histórias. De pais que passaram os primeiros anos fazendo de tudo para a criança dormir à noite toda, para depois começar a acordar a noite inteira para ensinar a criança a fazer xixi no banheiro e não usar fralda.
Olha, vejam só, como pode algo ser tão controverso? Já vi pais que deixavam o bebê chorar para ‘não acostumar mal’ à noite. Imagina que maldade: um bebê que não sabe sobreviver sem você achando que vai morrer porque você SUMIU. Acontece que o conhecimento, o aprendizado e o crescimento dependem 100% da criança e suas experiências! O controle do próprio corpo, tentativas imensas com erros e acertos que a levam para a construção de informações. A gente aprende muito mais na prática do que na teoria, por que com a criança seria diferente?
Insisto muito, minha gente, que precisamos permitir que a criança seja protagonista de sua própria infância!
É importante saber o que você espera de sua crianças, e o que quer para a vida dela quando crescer. O que o mundo pede de um adulto hoje? Ser criativo, pró-ativo, autônomo e autodidata. Ser cooperativo, saber trabalhar em equipe, saber focar em soluções e resolver problemas. Certo? Como teremos crianças criativas e pró-ativas quando exigimos obediência delas? Como ter crianças criativas e resolutivas quando só sabemos punir erros e construir o conceito de que errar é um problema? Como queremos que saibam criar quando só aprenderam a fazer o que mandamos?
Nanda Perim
Psicóloga
" Precisamos entender que a criança precisa, desde muito pequena, aprender a aprender! Aprender a descobrir, a testar, aprender que não tem problema errar. Aprender a encontrar soluções, a cooperar com a família ao invés de obedecer, a fazer parte de uma equipe que precisa funcionar bem! Através do controle nós podamos e atrapalhamos esses processos."
Então aqui vai uma dica para você que quer dar tempo e espaço para sua criança se desenvolver: abra mão do controle. Foque no relacionamento e em promover autonomia, autoconfiança e autoestima.
Eu sei que quebrar os ciclos que trazemos de nossas infâncias é muito difícil. Também sei que vamos ouvir dos mais velhos que isso é um absurdo e que temos que fazer como sempre foi feito. Mas o que eu te sugiro é fazer uma experiência, e observar sua criança simplesmente desabrochar na sua frente, cheia segurança e certeza de sua total capacidade e potência! Observar no seu filho habilidades que até hoje você luta para ter, como autorregulação alimentar ou emocional. É uma experiência excepcional!
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