Crítico de cinema e apaixonado por cultura pop, Rafael Braz é Jornalista de A Gazeta desde 2008. Além disso é colunista de cultura, comentarista da Rádio CBN Vitória e comanda semanalmente o quadro Em Cartaz

"365 Dias: Hoje": novo filme erótico da Netflix é constrangedor

Continuação do sucesso polonês "365 Dias", "365 Dias: Hoje" continua a história de Massimo e Laura com cenas bonitas e texto horroroso

Vitória
Publicado em 27/04/2022 às 16h59
Filme
Filme "365 Dias: Hoje", da Netflix. Crédito: Netflix/Karolina Grabowska

Logo nos primeiros instantes de “365 Dias: Hoje”, é possível afirmar, sem dúvida nenhuma, que os diretores Barbara Bialowas e Tomasz Mandes seriam ótimos no comando de alguns clipes dos anos 2000. A dupla, também responsável pelo horroroso primeiro filme, entende de enquadramento, iluminação, aproveita os belos locais de filmagens, abusa de câmeras lentas e cortes rápidos para que o espectador mantenha sua atenção na tela, mas sem necessariamente entender o que vê, até porque as montagens do filme muitas vezes não seguem uma continuidade lógica. Isso é o máximo de elogios que “365 Dias: Hoje”, merece.

Sequência de "365 Dias", sucesso polonês lançado em junho de 2020 na Netflix, “365 Dias: Hoje” continua a problemática história do casal Massimo (Michele Morrone) e Laura (Anna Maria Sieklucka). Para quem não acompanhou o primeiro filme, Massimo é um mafioso siciliano que se apaixona à primeira vista por Laura e a sequestra, mantendo-a em cárcere privado por um ano e prometendo deixá-la ir se ela não se apaixonar por ele nesse período. A relação nasce à base de falas autoritárias e até violências que o filme romantiza.

Neste segundo filme, Massimo e Laura estão casados e em lua de mel. É óbvio, assim, que o início é cheio de cenas de sexo que parecem ter sido filmadas por Michael Bay, com imagens aéreas, enquadramentos de baixo para cima para deixar todos mais imponentes, muito flare e contraluz - esteticamente, “365 Dias: Hoje” é um filme bonito. Nos primeiros 25 minutos, Massimo e Laura já transaram seis vezes, todas em montagens romantizadas e que pretendem ser muito mais ousadas do que realmente são.

“365 Dias: Hoje” adapta para as telas o livro “Este Dia”, de Blanka Lipinska, também autora do livro que deu origem à franquia. É curioso como a história, a princípio, tenta dar poder a Laura, colocando-a no comando da ação sexual, mas o roteiro parece não entender como fazê-lo. Todas as escolhas da protagonista são realizações de fetiches masculinos e Laura continua sendo um objeto para Massimo em uma relação tóxica nada saudável.

Filme
Filme "365 Dias: Hoje", da Netflix. Crédito: Netflix/Karolina Grabowska

O roteiro é preguiçoso e nunca se preocupa em desenvolver nenhum arco. No instante em que volta da maravilhosa lua de mel, Laura já se diz incomodada e se mostra um alvo fácil para o jardineiro Nacho (Simone Susinna), um bonitão que é praticamente uma versão surfista de Massimo. Nacho surge do nada e sempre nos momentos propícios, o que coloca Laura em parafuso, pois tem dois bonitões milionários interessados nela - sim, o jardineiro é milionário.

Sem entrar em spoiler nenhum, o conflito de “365 Dias: Hoje” é dos mais risíveis e constrangedores já colocados em prática. Pouca coisa faz sentido no filme e a reação inicial é de não acreditar que o roteiro esteja realmente planejando aquela virada, um conflito que seria facilmente resolvido com uma conversa de 30 segundos.

Filme
Filme "365 Dias: Hoje", da Netflix. Crédito: Netflix/Karolina Grabowska

A influência novelesca é óbvia, mas os 110 minutos do filme não são o suficiente para que compremos aqueles absurdos apesar de já conhecermos os personagens. Massimo e Laura não são pessoas gostáveis e a química entre Michele Morrone e Anna Maria Sieklucka continua inexistente, tornando toda a tensão sexual, o grande pilar do filme, artificial.

Com a já citada linguagem de vídeo clipe, “365 Dias: Hoje” é um filme que independe de diálogos e dá pouca importância a eles - na verdade, eles servem apenas como interlúdios entre as montagens “estilosas” e as cenas de sexo. O texto é expositivo e muitas vezes apenas explica o que as cenas acabaram de mostrar, um incômodo que é reforçado pelas atuações com um ar falso. O filme polonês traz atores italianos e poloneses encontrando entendimento na língua inglesa - mesmo que os atores dominem o idioma, é claro que eles não o têm como primeira língua.

Filme
Filme "365 Dias: Hoje", da Netflix. Crédito: Netflix/Karolina Grabowska

“365 Dias: Hoje” é um trabalho curioso. Com recursos, a produção mistura uma qualidade boa técnica a um texto literalmente quase amador. O roteiro é preguiçoso e trata os personagens como bonecos bonitos sempre prontos para o sexo. Com uma trama pífia, sem as montagens sensuais o filme não teria 20 minutos de duração

Além disso, tal qual “365 Dias”, “365 Dias: Hoje” retrata as relações de forma nada saudável, glamorizando a toxicidade, a fetichização e o autoritarismo, um discurso perigoso resumido a um texto constrangedor que nem sequer funciona como thriller erótico que promete ser.

A Gazeta integra o

Saiba mais
Netflix Rafael Braz Streaming

Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.

Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.

A Gazeta deseja enviar alertas sobre as principais notícias do Espirito Santo.