O que é “The Midnight Gospel”? A série de animação da Netflix é um dos produtos mais ímpares do catálogo da plataforma. Vendida como um “Hora da Aventura” para adultos ou como algo na linha “Rick & Morty”, a série não é nenhum dos dois. Criada em parceria por Pendelton Ward (“Hora da Aventura”) e pelo podcaster Duncan Trussell, “The Midnight Gospel” é uma experiência única.
Todos os episódios têm uma estrutura parecida: Clancy (Duncan Trussell) escolhe um planeta em seu simulador de universos para visitar e encontrar alguma história para seu spacecast - é um podcast, mas de alcance "espacial". As entrevistas, em teoria, são aleatórias, com pessoas ou seres que ele encontra por lá e logo inicia uma conversa. Cada pessoa, um universo particular, uma história a ser contada.
Quase todas as conversas foram retiradas do podcast de Duncan, ou seja, elas realmente ocorreram, não é um roteiro. O que “The Midnight Gospel” faz é colocar imagens para acompanhá-las, e é justamente isso que torna a série tão estranha. As animações parecem aleatórias, mas contam uma história que não necessariamente tem a ver com a entrevista - é tudo explosivo, violento e gore, mas também bonito e significativo. A mistura torna a série, em grande parte do tempo, uma viagem psicodélica sobre drogas, mortes, ressignificações, espiritualidade, magia, etc.
Cada universo tem suas peculiaridades que não influem na conversa, mas enriquecem a experiência. Todos eles, inclusive o local onde Clancy mora, são coloridos, psicodélicos e tortos. Saber quem são os entrevistados ajuda na compreensão da escolha das imagens, mas também diminui o encantamento do lado psicodélico aleatório da coisa toda. Em um episódio, por exemplo, Clancy (Duncan?) entrevista Damien Echols, um homem preso injustamente no caso que ficou conhecido como “West Memphis Threes”. Echols vive um humanoide com um aquário na cabeça e comandante de uma embarcação cheia de gatos. Em outro episódio, a entrevista é com o médico Drew Pinsky falando sobre drogas enquanto, em tela, Clancy visita o presidente dos EUA poucos minutos antes do fim do mundo causado por um ataque zumbi. Deu pra entender?
É interessante como Duncan ainda consegue dar um fio narrativo ficcional, mesmo que tênue, à coisa toda. Não há explicações sobre o que é real na série ou sobre o que é aquele simulador, mas entendemos do que se trata e como ele funciona. Entendemos também algumas questões pessoais do protagonista, que preparam o terreno para o impecável e lindíssimo último episódio da temporada - com o passar dos episódios, criatura e criador, Clancy e Duncan, vão se tornando um só.
Essa decisão narrativa tira o espectador do lugar em que acredita estar seguro, ao primeiro sinal de compreensão de tudo o que está acontecendo, tudo muda novamente. Os três episódios finais garantem profundidade além das entrevistas ou das animações, é quando se percebe que mesmo alguns recortes das entrevistas dos primeiros episódios já davam dicas da reta final da temporada e de como seria a fascinante jornada de Clancy até sua conclusão.
A animação, em toda sua complexidade, é uma experiência interessante de ser uma série que exige sua atenção ao obrigar o espectador a evitar atividades paralelas durante seu consumo. “The Midnight Gospel” é uma viagem alucinógena da qual cada um vai extrair significados e explicações de acordo com sua própria história, sua compreensão de mundo e sua carga cultural. De qualquer forma, acompanhar Clancy é uma bonita e perturbadora experiência de auto-descobrimento.
Este vídeo pode te interessar
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.