Crítico de cinema e colunista de cultura de A Gazeta

"A Família Mitchell e a Revolta das Máquinas" é um espetáculo

Produzido por Phil Lord e Chris Miller, de "Homem-Aranha no Aranhaverso", "A Família Mitchell e a Revolta das Máquinas" chega como um dos melhores filmes da Netflix

Vitória
Publicado em 29/04/2021 às 01h39
Filme “A Famíla Mitchell e a Revolta das Máquinas”, da Netflix
Filme “A Famíla Mitchell e a Revolta das Máquinas”, da Netflix. Crédito: Sony Animation/Divulgação

“Quem diria que uma empresa de tecnologia não quer o nosso bem?”, questiona uma personagem de “A Família Mitchell e a Revolta das Máquinas” logo depois de a família entender o que está acontecendo. A animação lançada pela Netflix nesta sexta (30) traz praticamente uma adaptação do fim do mundo de “Exterminador do Futuro” - sai a Skynet e entra a Pal (cuja tradução literal seria algo do tipo “parceiro”), uma inteligência artificial presente em praticamente todos os dispositivos eletrônicos. É como se a tão falada era da “internet das coisas” tivesse finalmente se tornado realidade e com uma assistente virtual única.

Quando o filme tem início, já estamos no apocalipse robô e os Mitchell, a bordo de um carro velho, parecem ser a única salvação da humanidade. Logo somos levados de volta para entender quem são aquelas pessoas e o que levou o mundo até aquele ponto. Codirigido e coescrito por Mike Rianda e Jeff Rowe, dupla responsável pela ótima série “Gravity Falls”, a animação é um dos melhores e mais divertidos filmes que você vai ver em 2021.

“A Família Mitchell e a Revolta das Máquinas” é, em sua essência, uma história tipicamente americana. O início da tomada dos robôs acontece justamente quando Katie (Abbi Jacobson), a filha mais velha, está a caminho da universidade. Uma “outsider” desde a infância, Katie mergulhou na produção de vídeos independentes para o YouTube e foi aprovada para estudar cinema na Califórnia, do outro lado do país.

A quebra desse vínculo, um tema tão discutido pelas produções americanas, ganha novas camadas no texto de Rianda e Rowe. O roteiro do “Família Mitchell” é ágil e esperto o suficiente para nunca ficar parado, sempre introduzindo elementos para manter o frescor, mas também criando uma linha condutora, a relação entre Katie e seu pai, Rick (Danny McBride). O resto da família é composto por Linda (Maya Rudolph) e o pequeno Aaron (Mike Rianda). O elenco de vozes ainda conta com a sempre excelente e oscarizada Olivia Colman (“Meu Pai”), que dá voz à assistente virtual Pal, Eric André (“Bad Trip”) e Fred Armisen (“Saturday Night Live”).

Filme “A Famíla Mitchell e a Revolta das Máquinas”, da Netflix
Filme “A Famíla Mitchell e a Revolta das Máquinas”, da Netflix. Crédito: Sony Animation/Divulgação

O filme traz diversas referências aos gigantes do Vale do Sílcio. A Pal poderia perfeitamente ser um produto Google, Apple, Microsoft, Facebook ou qualquer outra empresa de tecnologia. Da mesma forma, o gênio por trás de sua criação, Mark Bowman (Eric André), é o retrato de todo jovem ambicioso empresário gênio desse universo, reunindo características principalmente do finado Steve Jobs e de Mark Zuckerberg.

“A Famíla Mitchell e a Revolta das Máquinas”, vale ressaltar, é uma grande aventura, mas também um road movie cheio de coração. O roteiro emociona à medida que nos mostra a construção da relação de pai e filha, e sua subsequente dissolução. O que aconteceu para as coisas chegarem àquele ponto? Ao mesmo tempo em que coloca um olhar aprofundado sobre Katie e Rick, o texto do filme oferece vários momentos legais também para o resto dos Mitchell. Assim, Aaron e Linda têm momentos de brilho solo.

O roteiro é muito eficiente em tratar o conflito geracional e em mostrar que pais e filhos normalmente não são tão diferentes assim. O conflito é apenas fruto de épocas diferentes, de um Rick que se orgulha de ter construído uma casa com as próprias mãos, mas não entende nada da tecnologia na qual a filha (e o resto da família) se vê imersa. É interessante como Rianda e Rowe misturam o humor e o drama em doses perfeitas, sem que o filme assuma o formato de esquetes, de forma que o espectador nem sempre perceba essa mudança de tom imediatamente.

Filme “A Famíla Mitchell e a Revolta das Máquinas”, da Netflix
Filme “A Famíla Mitchell e a Revolta das Máquinas”, da Netflix. Crédito: Sony Animation/Divulgação

A linguagem de animação possibilita que a aventura ganhe ares absurdos, o que é ótimo para a grandiosidade do filme. Para não chocar de início com o absurdo, as sequências de ação crescem de maneira gradual. A escolha oferece uma sensação de que o filme está sempre indo além do que foi anteriormente visto e, por isso, quando a absurda e grandiosa sequência final ganha as telas, ela não choca o espectador, já que aquele momento foi sendo construído, e muito menos oferece a ele, o espectador, uma repetição de algo previamente visto. É nos detalhes narrativos que os grandes filmes se destacam, e “A Famíla Mitchell e a Revolta das Máquinas” é um grande filme.

Além da assinatura de Rianda e Rowe, “A Famíla Mitchell e a Revolta das Máquinas” leva a assinatura de Chris Miller e Phil Lord, dupla que assina a produção do espetacular “Homem-Aranha no Aranhaverso”. Tal qual o filme do herói da Marvel, o novo lançamento da Netflix é um impecável tecnicamente, com mistura de diferentes técnicas de animação para reforçar aspectos de diferentes personagens.

Filme “A Famíla Mitchell e a Revolta das Máquinas”, da Netflix
Filme “A Famíla Mitchell e a Revolta das Máquinas”, da Netflix. Crédito: Sony Animation/Divulgação

Com “Aranhaverso”, o filme divide também o supervisor de efeitos gráficos, Michael Lasker. A aventura dos Mitchell é cheia de nuances estéticas que conferem um ar único a ele de forma orgânica. O filme é todo realizado com computação gráfica, mas há bastante uso de pintura manual em cabelos, roupas e elementos de fundo. O filme ainda aproveita bem a linguagem utilizada por Katie em seus filmes para expressar os sentimentos da jovem, recurso que aproxima a obra da linguagem de histórias em quadrinhos.

“A Famíla Mitchell e a Revolta das Máquinas” é caótico, com coisas acontecendo o tempo todo, mas nunca perde o rumo. A animação lançada pela Netflix (originalmente planejada para os cinemas pela Sony) pega fórmulas conhecidas e acrescenta a elas uma certa dose de esquisitice - um mix certeiro de conforto e frescor. O filme consegue a proeza de reunir o ritmo de aventura e a qualidade de “Homem-Aranha no Aranhaverso” à carga dramática das melhores animações da Pixar, e isso não é pouca coisa.

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