Com a primeira temporada já disponível na Netflix, a série japonesa “Alice in Borderland” é uma interessante mistura de influências. Levando para as telas o mangá de mesmo nome, a série traz influências de literatura jovem ocidental, mas não renega suas raízes nipônicas. O resultado é interessante o suficiente para deixar o espectador preso durante os oito episódios da primeira leva.
Como o nome sugere, a série é uma versão livremente adaptada de “Alice no País das Maravilhas”, obra clássica de Lewis Carroll. Na trama, três jovens entediados, cada um com seus problemas, tiram a tarde para aproveitar o tempo. O problema é que, após alguns acontecimentos, Arisu (Kento Yamazaki), Chota (Yûki Morinaga) e Karube (Keita Machida) acabam em uma Tóquio paralela, completamente vazia.
Logo a série já nos apresenta a seu foco: os jogos. Cada episódio traz um desafio mortal para os protagonistas. Eles precisam decifrar os códigos, entender as pistas e sobreviver a cada etapa - cada jogo vencido garante a eles mais tempo de vida naquele mundo. Caso não consigam mais créditos, são sumariamente executados, ou seja, é impossível não jogar.
Logo, também, entendemos que tudo pode acontecer, ou seja, não devemos nos apegar a personagem algum. Essa característica é um dos aspectos mais legais de “Alice in Borderland”, pois faz com que o espectador sinta a tensão de cada desafio. Os jogos, vale ressaltar, são bem elaborados e criativos, mas também um tanto sádicos.
O roteiro faz um trabalho interessante de ampliar aquele universo à medida que os personagens vão se aventurando por ele. Os mistérios também vão se elencando e sendo (a maioria deles) resolvidos por outros jogadores que vão ganhando destaque com o tempo. A narrativa usa breves flashbacks para apresentar essas caras novas ao público; algumas são mais importantes, enquanto outras morrerão em seguida. Nunca se sabe.
Com direção de Shinsuke Sato (“Kingdom”), “Alice in Borderland” se destaca pelas escolhas corajosas do seu texto. Ao eliminar alguns personagens, ele corre o risco de perder também parte do público. A série também aposta numa violência bem gráfica, com cabeças explodindo, membros decepados e muito sangue - tudo no melhor estilo anime.
Também dos animes o texto busca os combates. As coreografias são ótimas e as lutas servem para desenvolver cada um dos personagens - como em desenhos japoneses, os envolvidos conversam durante as brigas e vão apresentando suas cartas um para o outro.
Apesar da estética totalmente americanizada, “Alice in Borderland” ainda carrega bastante de cultura japonesa em relação aos costumes. Em determinado momento da temporada, os personagens vão a uma comunidade onde todas as pessoas têm que andar de roupas de praia, o que significa mulheres o tempo todo de biquíni, o que causa estranheza e desconforto em alguns homens.
Essa fetichização é potencializada quando os jogos acontecem, pois o que se vê em tela é um festival de jovens de biquíni carregando armas, atirando e brigando. Curiosamente, a série registra tudo com um certo voyeurismo, à distância, nunca se aproximando daqueles corpos.
O grande mérito de “Alice in Borderland” é que apesar de usar a violência como força motriz da narrativa, ela nunca é gratuita e trabalha em função da história. É a violência que leva Arisu e seus amigos para outros caminhos, é ela quem move a trama e os faz querer encontrar uma saída daquele lugar.
As referências à obra clássica de Lewis Carroll estão em todos os lugares, do nome do protagonista (Arisu) às cartas, passando pelo coelho branco e por cabeças “cortadas”. A temporada chega ao fim com uma boa conclusão que oferece diversas possibilidades de expansão daquele universo. Ao fim, “Alice in Borderland” é uma ótima surpresa.
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