Em 1980, um crime chocou os EUA pela violência e pelas pessoas envolvidas. Cidadã modelo, ativa na igreja, casada e mãe de duas crianças, Candy Montgomery teria matado sua colega, a professora Betty Gore, com 41 machadadas. Candy disse ter agido em legítima defesa, mas tinha um caso com o marido da amiga e teria cometido o crime ao ser confrontada sobre o fato. Livros, documentários e programas de TV sensacionalistas já contaram a história de Candy Montgomery e agora, com a nova onda de conteúdos sobre crimes reais, os famosos ‘true crimes’, a história volta a ser contada em “Amor e Morte”, minissérie da HBO, além de ter sido dramatizada também em “Candy”, com Jessica Biel, disponibilizada ano passado pelo Star+.
O parágrafo acima é praticamente idêntico ao de abertura do texto sobre “Candy”, publicado em julho do ano passado, e o motivo é claro: a história é a mesma. A ideia deste texto é analisar “Amor e Morte” (“Love & Death”) como obra única, sem muitas comparações com a minissérie protagonizada por Jessica Biel, sobre a qual pode-se ler mais clicando aqui.
Minissérie em sete episódios de cerca de 55 minutos, “Amor e Morte” tem apenas flashes do crime em seu primeiro episódio. O texto se preocupa muito com a construção do universo e dos personagens. Assim, conhecemos Candy (Elizabeth Olsen), e seu marido, Pat (Patrick Fugit), como membros ativos da comunidade da igreja. É em um evento da igreja, inclusive, que Candy pela primeira vez sente algo por Allan (Jesse Plemons), marido de sua amiga Betty (Lily Rabe), e pensa "e se?".
A série não tem pressa em introduzir a relação dos dois, desenvolvendo-a com calma para, assim, trabalhar nuances de Candy, uma mulher exemplar na comunidade, mas também impulsiva, frustrada com alguns aspectos do casamento, decidida e disposta a quebrar algumas regras para conseguir o que quer. Essa construção é essencial para que o grande evento da série, o assassinato de Betty, ganhe peso.
Ter a gênese da relação extraconjugal sendo trabalhada funciona também para o desenvolvimento de Allan. O personagem de Jesse Plemons é o ponto de equilíbrio da série - ele cede à tentação de um relacionamento carnal com Candy, mas é quase sempre consumido pela culpa, principalmente quando Betty se mostra deprimida.
“Amor e Morte” utiliza a maior parte dos episódios para construir a tensão do assassinato, desenvolvendo Candy e Allan, mas se praticamente se esquecendo de Betty. Quando o momento chega, a série se transforma e o suspense passa a ser como e quando, afinal, Candy será presa. Dedicados aos momentos mais impactantes do julgamento e à construção da narrativa de legítima defesa, os episódios finais trazem uma mudança de ritmo que funciona quando o arco inicial já vem perdendo força.
Quem não conhece a história tem na minissérie uma ótima forma de ser apresentado a ela. Aqueles que assistiram a “Candy”, no entanto, devem se perguntar o motivo dela e “Amor e Morte” serem lançadas em um espaço tão curto de tempo. As duas minisséries trabalham o caso de maneira parecida, com problemas parecidos - a péssima construção de Pat, marido de Candy, e de Betty, morta junto com a sua versão da história.
“Amor e Morte” não traz respostas ou ousadias narrativas, mas ainda assim funciona principalmente pela atuação de Elizabeth Olsen, que cria Candy como uma mulher artificial, daquelas pessoas que chegam a irritar pela perfeição e pela felicidade. A obsessão por manter as aparências, principalmente durante o julgamento e os momentos que o antecedem, é o que quebra a narrativa até então positiva à mulher que matou a amiga.
Funcionando como um conto sinistro de um pacífico subúrbio americano, uma cidade que ficou 25 anos sem um assassinato, ou como a história de uma pessoa normal, “a pessoa mais normal do mundo”, como define um personagem, levada a uma situação limítrofe, “Amor e Morte” é ótima. O único real problema da série é ela ter sido lançada após “Candy”, possivelmente diminuindo o interesse de parte do público pouco interessada em ver a mesma história contada de maneira muito parecida. À HBO Max resta confiar na popularidade da plataforma e na fidelidade de seu público - “Candy”, afinal, está disponível no Star+, plataforma ainda não tão popular no Brasil.
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